O pecado original romance Capítulo 36

Eva não sabia exatamente o que estava fazendo nem mesmo sabia o porquê de estar fazendo, mas seu corpo ordenava e sua mente obedecia sem pestanejar. Algo havia se quebrado dentro dela e disso ela sabia. Onde antes havia controle, agora só havia desejo.

Ela amava se sentir desejada. Bastava se sentir assim para que uma outra entidade assumisse seu corpo. E ela sabia quão desejada era naquele momento. Walter não tirava os olhos dela, mas, diferentemente de Jonathan, que era um diamante bruto, ele era um perfeito cavalheiro, dono de olhos experientes que sabiam como guia-la e envolve-la. Era diferente, também, de Marcos, que agia de maneira abrupta e imponente, Walter era sutil em seus flertes, derretendo suas defesas e conquistando, passo após passo, o seu território. Eva sabia que, ao contrário do que acontecera até então, com Jonathan, com Walter ela não precisaria avançar um passo se quer em busca do que desejava. Jonathan possuía os músculos, mas Walter era sagaz. Envolvia-a com estratégia, a analisava constantemente, medindo sua temperatura a cada elogio ou gracejo e então fazia seu movimento, sempre cauteloso. Toda vez que ele tentava um movimento audaz demais, Eva recuava e erguia novamente suas defesas. No entanto, quando ela deu por si, eles acariciavam a perna um do outro com os pés, por baixo da mesa na sacada.

— Sinto muito por sua esposa. – Comentou Eva. – Você devia ser muito carinhoso com ela.

Ele tomou o último gole da taça, empurrando para dentro um cubo de queijo que havia mastigado momentos antes.

— Na verdade, eu percebi tarde demais que eu devia ter dado mais atenção a ela. – Ele parecia sincero naquele comentário.

— E por que diz isso? – Eva levou uma mão acalentadora até a dele.

— Eu passava muito tempo trabalhando, sabe? Ela sentia minha falta e eu percebia isso. – Ele fez uma pausa. – Mas um homem tem que trabalhar.

Eva sabia exatamente do que ele estava falando. Walter suspirou tristonhamente enquanto enchia a própria taça novamente. Um longo silencio se abateu sobre os dois enquanto Eva o observava, com dó do pobre viúvo.

— Quando descobrimos o câncer... – Ele interrompeu o silêncio. — ... Já era tarde demais para compensar, por mais que eu tenha tentado. Todo o dinheiro que eu havia conseguido trabalhando, não foi suficiente para mantê-la viva.

Eva se ergueu e, percebendo a tristeza em seu semblante, segurou em seu rosto e depositou um beijo em sua bochecha. Ela se sobressaltou quando ouviu um “clac” vindo da porta.

*

Sentia uma dor pungente na bochecha esquerda e também sobre os olhos. Sabia que o supercílio havia sido cortado e o lábio superior devia estar inchado como uma berinjela.

Tudo havia acontecido muito rapidamente.

Estava quase na sua vez de correr e ele e os outros rapazes riam à toa em uma mesa, comendo uma porção de batatas. Estavam em número suficiente para fechar uma pista e não precisariam correr contra estranhos.

Thomas desviava constantemente o olhar para a mesa ao lado, onde Erica estava sentada junto de algumas amigas e, sempre que o olhar dos dois se encontravam, ela sorria timidamente.

Quando Thomas se levantou para ir ao banheiro, Jonathan aproveitou para ir até o balcão buscar mais um refrigerante. A atendente era uma jovem de cabelos muito negros que puxara assunto com o rapaz, que, com um punhado de respostas monossilábicas, deixara o assunto morrer. Ele escutou repentinos e acalorados gritos e xingamentos e, quando se virou para voltar à mesa, Thomas já havia se engalfinhado com um dos caminhoneiros e ambos se empurravam por cima de mesas, cadeiras e outros clientes. Erica havia caído com o traseiro no chão e observava a luta, boquiaberta. Jonathan pensou por um momento, ponderando se valia ou não à pena intervir e, quando deu por si, já corria em direção à briga.

O caminhoneiro era um homem massivo, dono de uma pança redonda e proeminente, ele era ainda mais alto do que Jonathan, possuía uma cabecinha pequena demais para o corpo, de onde despontava um nariz adunco e alongado. Seu queixo era quadrado e seu olhinhos porcinos miravam Thomas com uma raiva visível e genuína. Ele segurava o rapaz pelo colarinho e ameaçava acertá-lo com um murro, mas, antes que desferisse o golpe, Jonathan saltou e segurou seu punho, que parecia ter o tamanho de um tijolo. Ele enlaçou seus braços no do homem, calçando seus pés no chão e afastando-o do amigo. Thomas aproveitou sua breve distração e ergueu o joelho, atingindo-o entre as pernas com tanta força que Jonathan sentiu seu braço amolecer e ceder. O caminhoneiro soltou o rapaz e dobrou-se, tentando segurar os testículos. Em um momento de compaixão, Jonathan o soltou, permitindo-o segurar o local atingido e gemer de dor.

Thomas correu até Erica e a ajudou a se pôr de pé. Quando Jonathan ia virando para deixar o lugar e evitar mais confusão, viu o mundo ficar escuro e, repentinamente, caiu de costas no chão, deixando escapar todo o ar dos pulmões. Uma dor pungente explodiu por seu rosto uma, duas, três vezes até que os outros rapazes chegaram para acudi-lo. Sentiu as laterais do olho serem aquecidas por um líquido morno e viscoso e viu o mundo ficar vermelho quando o sangue começou a inundá-lo.

Esfregou o rosto com as costas da mão e, quando a checou, percebeu a mancha avermelhada e grudenta que a cobria. O homem que o havia acertado já era subjugado pelos seus colegas e ele olhou para ver Thomas sendo guiado para fora do local. Um dos rapazes chamou sua atenção para as luzes vermelhas que piscavam do lado de fora do local e eles saíram por uma porta lateral, a tento de evitar qualquer confusão com a polícia.

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