O pecado original romance Capítulo 84

Melissa havia adormecido com a cabeça encostada no ombro de Eva e Eric andava de um lado para o outro, ansioso. Algumas horas já se haviam passado.

Eva continuava a verter lágrimas, entregando-se, algumas outras vezes, a um soluço copioso. Seu rosto estava inchado e vermelho. O nariz se encontrava irritado de tanto ser esfregado, assim como os olhos. As pontas de seus dedos já sangravam e doíam, mas ela se recusava a parar de roê-los. O pingente já estava brilhando de tanto ser esfregado e os pés ainda batucavam sobre o piso branco.

Eric parou de andar em círculos, olhando em direção ao fim do corredor, de onde um grupo de pessoas vinha vindo.

Ele caminhou até eles sob o olhar analítico e ansioso de Eva.

Haviam, ao todo, cinco pessoas. Quem liderava o grupo era uma mulher na sua meia idade de cabelos claros. Seus olhos verdes, assim como os de Eva, indicavam uma tarde em prantos. Dois rapazes altos, de seus quinze ou dezesseis anos, quase cópias perfeitas um do outro, vinham atrás, vestindo cores semelhantes e praticamente mimetizando movimentos como se um fosse o espelho do outro. Finalizando a fila, um homem de maxilar travado e tenso se erguia acima de todo o grupo, carregando uma menininha que não devia ter mais do que cinco anos de idade.

O coração de Eva disparou quando o olhou. O homem era a imagem perfeita de Jonathan quando se tornasse mais velho e sua maneira de se mover, firme e orgulhosa, a fez lembrar do rapaz. A lembrança trouxe mais lágrimas aos seus olhos, mas ela tentou disfarçar, se levantando e indo em sua direção.

— Tia. — Eric abraçou a mulher, não dizendo mais nada enquanto os soluços da mãe de Jonathan se intensificavam.

A única que parecia estar alheia ao fatídico acontecimento era a criança, que olhava de um lado para o outro, escondendo o rosto no pescoço do pai quando seus olhos encontravam os olhos de outra pessoa.

Eva limpou o rosto com as mãos, se aproximando. Ela esticou a mão para o pai de Jonathan. O aperto firme, porém, cuidadoso do homem e os calos em suas mãos trouxeram à memória, lembranças das do amante.

— Senhor Valente. – Eva cumprimentou, usando o sobrenome.

O homem fez um breve aceno com a cabeça e não disse mais nada, erguendo a mão para cumprimentar o sobrinho.

— Tio. – Eric o cumprimentou, de maneira serena.

Eva foi até a mãe de Jonathan, que a encarou profundamente. Ela se sentiu despida ante seu olhar, que se havia moldado em um semblante repleto de empatia.

— Senhora Valente. – Eva estendeu a mão.

A mulher levou as mãos às maçãs do rosto de Eva, enxugando-lhe as lágrimas, como se compreendesse e se sentisse agradecida pela angústia da qual compartilhava de maneira tão óbvia no olhar.

— Eva. – Ela a puxou para um abraço mais caloroso do que Eva fora capaz de esperar. – Pode me chamar de Helena, querida.

Eva se sentiu aquecida por aquele ato, não entendendo exatamente o porquê de todo aquele carinho. Então, suspirou, levemente aliviada.

O pai e a mãe de Jonathan se afastaram com o sobrinho até um canto do corredor, provavelmente, a tento de receber a informação precisa sobre o que havia posto seu filho na mesa de cirurgia sem que os outros filhos soubessem dos pormenores. Os outros permaneceram aonde estavam, juntos de Eva e Melissa.

— Gabriel. – Disse um dos gêmeos, estendendo a mão para Eva.

— Miguel. – Disse o outro, logo em seguida.

Eva sorriu, divertindo-se com as semelhanças que a família inteira carregava.

— Eu sou Eva. – Ela se apresentou, estendendo a mão para eles.

Eva olhou para o rostinho miúdo da pequena que a encarava de maneira tímida. Os cabelinhos lhe caíam lisos até os ombros e ainda possuíam uma coloração dourada. Os olhos, eram enormes, curiosos e desconfiados e perscrutavam Eva e Melissa de trás da perna de um dos irmãos.

— E você, gracinha? Como se chama? – Ao ser encarada por Eva, a menina escondeu os olhos no tecido da calça de Miguel.

— Diz o seu nome para ela. — O irmão a incentivou, tentando sair de sua frente e sendo peremptoriamente seguido. — Diz o seu nome para a tia Eva.

— Ester. – Ela sussurrou.

— Oi Ester. – Eva se obrigou a sorrir, estendendo a mão, fazendo a menina se afastar para trás da perna e esconder seu rosto. – Eu sou Eva.

Miguel deu de ombros, como se quisesse pedir desculpas pela atitude da irmã e recebeu um sorriso de volta.

Os soluços da mãe de Jonathan soaram pelo corredor, dando a entender que Eric devia ter chegado à parte na história em que o rapaz havia sido baleado. Eva encarou, com pena, a cena de Helena enterrando a face no peito do marido e sendo abraçada por ele.

*

— Eric.

O pai de Jonathan começou, enquanto se sentavam à mesa da cafeteria mais próxima ao hospital.

Eric mirava, de quando em quando, uma Eva aflita, que olhava constantemente em direção ao hospital, como se, a qualquer momento, Jonathan fosse sair andando da UTI, completamente curado.

A cirurgiã que havia vindo até os pais de Jonathan, tinha dado a notícia de que a cirurgia havia chegado ao fim e que o quadro se mantinha, à medida do possível, estável. Tudo dependeria de como o rapaz reagiria às próximas horas e aquilo parecia ter amainado um pouco o clima pesado que se abatia sobre todos ali.

Ao contrário do que achava que deveria ter acontecido, Eric não sentia ciúmes pelo fato de a esposa estar preocupada com o amante. Seu casamento havia chegado a um fim. Aquele, estava ciente, era um fato. Surpreendia-o, no entanto, o fato de aquilo não causar desconfortos entre ele e a futura ex-mulher. Pelo contrário, parecia ter fortalecido a preocupação que sentia por ela e pelo primo.

— Eu pretendo tirar alguns dias de folga, contratando um peão para fazer o que tiver que ser feito por lá pela fazenda e, sua tia pode vir nos dias de folga dela, mas, certamente não poderemos ficar por aqui durante cem por cento do tempo. – O pai de Jonathan falava em uma voz firme e grave. – Ainda que o hospital não permita a permanência de acompanhantes, nós pretendemos estar aqui sempre que possível. Mas gostaríamos de te pedir duas coisas.

Eric anuiu, esperando os tais pedidos.

— Primeiramente, se não for um incômodo, será que você poderia nos deixar pousar em sua casa nos dias em que viermos para cá? – Havia um jeito rústico na maneira como o tio falava. Eric se lembrava, seu tio era um homem direto com as palavras, demonstrando pouco ou nenhum comedimento no que dizia, o que o havia rendido algumas discussões com os cunhados.

Eric anuiu muito com a cabeça.

— Tio, isso é algo que você não precisaria nem me pedir. – Eric olhou para Eva que, absorta, ignorou. – É claro que pode.

— Muito obrigado, mesmo. – O homem olhou para a esposa. – O que nos leva a um segundo pedido que, a meu ver, parece muito mais dispendioso.

A esposa o encarou, como se quisesse pedi-lo para não continuar.

— Acha que pode ficar com Jonathan no hospital, nos dias em que não estivermos por aqui? – O homem se sentia, claramente, incômodo com aquele pedido. – Ao menos permanecer por algumas horas por aqui, atento às noticias.

— Ricardo. – Repreendeu Helena. – Já disse que nós vamos dar um jeito nisso.

Eric torceu a boca, temendo decepcionar o tio.

— Puxa vida, Tio. – Ele temeu parecer indiferente ao caso. – Eu preciso mesmo voltar para São Paulo. Ainda preciso ficar mais duas semanas por lá, resolvendo coisas urgentes.

Ricardo já pretendia pedir desculpas pela inconveniência, quando Eric o interrompeu.

— Mas talvez, a Eva possa ficar. – Eric levou sua mão à de Eva. – Não é mesmo, Eva?

Ela se virou para Eric, pouco entendendo do que estavam falando.

— Ficar com Jonathan no hospital. – Eric precisou repetir. – Você ficaria com Jonathan no hospital?

Os olhos de Eva se arregalaram e ela olhou diretamente para a mãe de Jonathan, que parecia se divertir com sua reação espontânea.

— É claro. Digo... Er... – Ela tentou se acalmar. – Eu posso ficar, sim. Trago meu computador e trabalho daqui mesmo, sem problema algum.

— Não se preocupe, querida. – Helena a tranquilizou. – É somente durante os horários de visita. Como o leito será compartilhado, eles não permitem acompanhantes em tempo integral.

Um sorriso despontou no canto da boca, mas, logo, foi disfarçado.

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