— ...então, ele se atirou contra o George. – Thomas narrava a história para as pessoas sentadas à mesa da cafeteria. – Eu ouvi o disparo, mas, até então, eu não havia percebido que ele tinha sido acertado. Quando eu percebi que George estava mesmo disposto a matá-lo, me atirei para a frente, peguei a espingarda e acertei ele na perna, de raspão.
O Senhor Ricardo cerrava os punhos com força sobre o tampo da mesa. Seu olhar transparecia fúria genuína, como se a qualquer momento pudesse se levantar e ir até a cadeia, atrás do tal George.
— Eu me atirei contra ele, para que Jonathan tivesse tempo de se levantar, mas, como já estava cansado, acabei sendo subjugado. Eu achei que minha cabeça seria esmagada. Já tinha desistido de lutar. Então eu ouvi um estouro e George caiu no chão. Erica havia alcançado seu revolver e atirado contra o próprio pai.
Helena apoiou a testa no ombro de Ricardo. Eva esfregava as mãos por baixo da mesa, tentando esconder a aflição que sentia.
— E foi aí que o resgate chegou. Eu cheguei a pensar que ele... – Thomas contorceu o rosto, como se revivesse os momentos. — ...cheguei a pensar que ele ia morrer.
Lincoln Gama, que havia pedido um café do qual não havia tomado um gole sequer, bateu com os nós dos dedos na mesa, a tento de chamar a atenção do senhor Ricardo.
— A questão aqui, Ricardo... – Sua voz era rouca, como se a garganta estivesse constantemente arranhada por cacos de vidro. — ... é que seu filho poderia ter fugido e deixado o meu filho para morrer, sem se envolver em tal desgraça. – Ele meneou a cabeça, como se espantasse a ideia de uma possibilidade ainda pior. – Ou, sabe-se lá que outras atrocidades pretendiam fazer com ele.
— Meu filho não foi educado para isso. – Ricardo o encarou de maneira ríspida.
— Eu percebo que não. E sou grato por isso. — Ele levou a mão até a de Ricardo e deu-lhe dois soquinhos amigáveis. – Aqui está o ponto ao qual eu quero chegar. Eu devo ao seu filho a vida de meu filho. Minha proposta tem as mais puras intenções. Permita-me pagar o custeio da internação de Jonathan no melhor hospital da região. Equipamentos de alta qualidade, os melhores médicos que o dinheiro pode pagar, um leito inteirinho apenas para ele, onde vocês poderão acompanhá-lo vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana.
Ricardo franziu a boca, sem jeito.
— Eu não sei. Transferi-lo tão cedo a um outro lugar me parece muito arriscado, além do mais, a própria cirurgiã que realizou a cirurgia trabalha aqui. – Tanto Helena quanto Eva o encararam, tentando esconder a incredulidade no olhar. — Além do que, tenho certeza de que meu filho não ajudou o seu esperando por uma recompensa.
— Tenho certeza de que não, senhor Valente. – Thomas justificou no lugar do pai. – Mas nós também não esperamos outra recompensa além da recuperação de meu amigo.
Ricardo olhou do filho para o pai, claramente analisando tanto um quanto o outro, parecendo, por algum motivo, mais receptivo a Thomas.
— Meu amor, podemos conversar ali fora, um pouco? – Helena apertou a mão do marido entre os dedos.
Ricardo a encarou por algum tempo, tentando ler suas intenções. Vencido, então, se levantou e a acompanhou para o lado de fora da cafeteria.
— Bom, vocês terão que me dar licença para atender uma ligação. – Lincoln se levantou, seguindo em direção ao banheiro.
Thomas e Eva permaneceram sentados. Os irmãos de Jonathan, por falta de espaço, haviam se sentado a uma outra mesa, o que significava que estavam ali apenas os dois.
— Sabe... – Thomas tomou um gole do refrigerante, empurrando para dentro um comprimido de analgésico. – Ele chamou por você quando pensou que ia morrer.
Eva baixou a cabeça, como se aquilo fosse uma acusação.
— Ele segurava isso... – O dedo indicador apontou para o cordão enrolado no pulso de Eva. – ...Com toda a força que lhe restava. – Ele suspirou antes de continuar. – Me parece que vocês se gostam muito. Ao menos, essa foi a impressão que eu tive quando te vi à espera da ambulância.
— Eu não sei o que ele contou para você, Thomas, mas não acho que esse seja um bom momento para conversarmos sobre isso. – Eva permanecia na defensiva. Não sabia o quanto, sobre os dois, Thomas tinha de conhecimento.
— Ele ainda está pensando que estragou tudo com você. – Aquelas palavras pareceram estilhaçar as defesas de Eva, fazendo-a sentir seus olhos se umedecerem instantaneamente. – Eu espero que você esteja lá para tranquilizá-lo quanto a isso quando ele acordar.
Eva sabia que aquilo era verdade. Era o que mais desejava. Desejava corrigir tudo o que havia de desentendimentos entre os dois.
— Eu quero ficar ao lado dele até o momento em que abrir os olhos. — Admitiu, baixinho. — Não quero deixar o seu lado nunca mais.
— Então torça para o senhor Valente aceitar a proposta de transferi-lo para um outro hospital, pois no Santa Maria, vocês só poderão vê-lo durante os horários de visita.
Os olhos azuis fitaram Thomas como se ponderassem sobre a veracidade daquela informação, depois se retorceram em evidente dúvida.
— Não sabia? – Thomas olhou para a porta, de onde o senhor Ricardo e a senhora Helena vinham vindo e, então, depositou um cartão de visitas sobre a mesa. – Olha, aqui está o meu número. Caso consiga convencer o pai do Jonathan, pode me ligar a qualquer hora.
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