Dobby me faz uma falta sem igual. Ainda não consegui juntar dinheiro o suficiente para oferecer para o comprador de forma a compra-lo de volta. Ainda assim, meu coração dói enquanto penso em como ele poderia estar aqui comigo.
Eu já sabia o caminho para o restaurante de cor. E estava usando o meu dia de descanso para fazer o que Mara tinha dito. Não que eu quisesse, mas tinha medo do que veria e como conseguiria encarar tudo, no fim das contas. Eu só queria que o pior que se passava na minha cabeça não fosse verdade. Do contrário, me doeria o coração.
Adentrei o restaurante observando como os funcionários me olhavam como se vissem um monstro. Começaram a cochichar e eu me encolhi em um certo momento, pois sabia que era óbvio que estavam falando de mim. Em algum momento ouvi alguém que não consegui identificar falando:
– Foi ela a responsável pelo devaneio do chefe. – E isso só me fez ficar ainda mais alarmada, pois eu só conseguia pensar que loucura era aquela da qual elas falavam e o que diabos estava acontecendo para estar tudo um silencio mórbido como eu conseguia facilmente observar agora.
Não demorei para perceber do que todos falavam.
Mal adentrei a cozinha e quase vomitei com o cheiro que estava nela. A bile pareceu subir pela minha garganta e alcançar quase a minha boca enquanto eu tentava respirar agora pela boca averiguando de onde vinha aquele cheiro terrível de estrago. Não era difícil de saber de onde vinha e quem tinha feito isso. Afinal, somente Ale estava na cozinha e de uma maneira acabada, o que me fez dar um passo para trás, assustada, sem acreditar que aquele era realmente o Ale que um dia eu conheci.
Ele estava uns cinco quilos mais magros, o que era terrível de se olhar! Também estava com uma barba gigantesca marcando o rosto, o que era outra coisa horrível de se olhar, desgrenhada pelo rosto e se misturando com o cabelo gigantesco que havia para todas as direções. Na verdade, eu não conseguia mais saber o que dali era cabelo e o que dali era ele de fato. Os olhos dele, de um verde brilhante, pareciam quase apagados no rosto desgrenhado e cheio de sulcos e olheiras, possivelmente de noites diversas em claro. Não, aquele não podia ser o Ale, o mesmo Ale que eu conhecera.
Para piorar todo o figurino alarmante do mocetão ainda havia a roupa. Que eu sequer acho que poderia ser chamado de roupa. Ele usava uma blusa que um dia provavelmente foi branca, mas que naquele momento era uma mistura de massa, ovo, farinha, chocolate, e leite, tudo com cheiro de estragado que quase me fazia vomitar mais uma vez somente de olhar. A calça jeans já estava surrada e ele um tênis largado no pé, enquanto parecia frenético numa tarefa angustiante de cozinhar, cozinhar, cozinhar, sem parar um momento sequer de o fazer. Era terrível de ver. Mas, por pior que tudo isso parecesse, o pesadelo não era somente esse. Para todo o meu desespero.
Havia nas bancadas, nas mesas, em cima das geladeiras, enfim! Em todos os lugares possíveis, havia alguma comida! No entanto, o pior de tudo é que nenhuma delas tinha sido jogada fora! Aparentemente, Ale não tinha deixado ninguém tocar em nenhuma delas e algumas estavam mais do que em estado de podridão, já estavam em estado de decomposição, com fungos e tudo mais! Aquela cozinha ia precisar de uma limpeza, dedetização, enfim, tudo, urgentemente! E o cheiro de comida estragada era tão enjoativo que eu tive que me controlar mais um bando de incontáveis vezes para não querer vomitar de novo. Aquilo tudo era horrível!
– Sara! – Ouço Ale dizer e percebo que seus olhos brilham ao me ver. Ele parece momentaneamente feliz, o que me faz arquear uma sobrancelha e pensar onde estava a sanidade desse homem, ou se ele nunca teve e eu nunca percebi, pois eu não conseguia reconhece-lo. Embora ele me reconhecesse de longe. Ale abriu um sorriso para mim e logo falou: – Olha! Eu cozinhei tudo isso para você! Venha, venha, vamos comer! – Ele disse animado enquanto parecia pensar no que me servir primeiro. Eu estava mais do que pasma, estava com medo.
O que havia acontecido com Ale? Eu era culpa disso? Se era, porque diabos ninguém tinha me chamado antes para tentar resolver isso rapidamente?
Por que diabos deixaram Ale chegar a esse ponto antes de me chamarem? E, mais uma vez, o que havia acontecido a ele?
Engoli em seco balançando a cabeça negativamente. Primeiro, porque eu não iria a me atrever a comer uma garfada que fosse de qualquer coisa que estivesse ali. Não mesmo.
– Algumas coisas acho que estragou. Mas não se preocupe! Vou achar alguma coisa para você comer. – Disse Ale e eu só conseguia pensar que esse homem precisava de um banho urgente, além de sanidade, porque ele não estava nem um pouco normal.
– Não. Onde está sua chave do carro, Ale? – Perguntei pensando que talvez ali eu ganhasse um pouco de atenção de Deus, porque estava prestes a cometer uma loucura, ou melhor, uma caridade, enquanto aguentaria o cheiro insuportável e fedido que Ale exalava.
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