Ao longo dos meses, Nicole se adaptou à nova rotina e assumiu o desafio de gerenciar o departamento pessoal da empresa junto ao sogro. A grande pasta de couro preta que carregava reforçava a imagem de uma mulher confiante.
Eram quase 10 da manhã de segunda-feira quando Nicole apresentou os dados das equipes ao Dr. Ricardo e sugeriu novas contratações.
― Com licença! ― Danielle, secretária de Ricardo, entrou na sala depois de bater à porta. ― O doutor Albuquerque está aqui, eu posso mandá-lo entrar?
― Claro! ― Ricardo alargou o sorriso para a secretária
― Dr. Ricardo, eu vou voltar pra minha sala, tenho de adiantar as folhas de pagamento.
Nicole organizou alguns dos papéis que estavam sobre a mesa, colocou na pasta de couro e se levantou.
― Se o senhor precisar de qualquer coisa, é só me chamar.
Abriu a porta e parou de frente a Henry. Apesar de parecer mais animado, os cabelos brancos pareciam ter se multiplicado nos últimos meses.
― Nicky, que bom te ver! ― Henry passou a mão na barba grisalha enquanto entrava na sala.
― Bom dia, doutor Albuquerque! É bom revê-lo também. O doutor Ricardo já irá atendê-lo.
― Podemos almoçar hoje?
― Hoje eu não posso, doutor! Eu prometi almoçar com o meu esposo. ― Ela se aproximou da porta. ― Com licença!
Nicole passou pela sala de espera e saiu pelos corredores. Se aprumou no clássico scarpin de couro preto kitten heel e ajeitou o colarinho da camisa branca com pregas nos punhos. Olhou o visual no espelho retangular na parede perto da recepção.
― Nicole, espere um segundo! ― A secretária de Ricardo se aproximou. ― Depois que você saiu, o doutor Alexander ligou. Ele pediu pra você levar as avaliações e as informações dos novos residentes até a sala dele.
― Obrigada!
Ela terminou de arrumar os botões e o colarinho da blusa até que ficasse perfeita, O nariz curto harmonizou com os lábios curvos sorridentes. Seguiu pelo corredor até a sala da diretoria e aguardou até que Annie, secretária de Alexander, terminasse de falar ao telefone.
― Bom dia, Nicole! ― Annie deu um sorriso refreado. ― O doutor Alexander pediu para a senhora aguardar.
― Annie, ele está em reunião? ― Nicole olhou de soslaio para a porta fechada. ― Eu posso voltar mais tarde.
― Não, foi a mãe dele que apareceu de surpresa. ― A secretária ciciou como se contasse um segredo. ― Elas chegaram um pouco antes da senhora aparecer.
― Elas?
― A doutora Dufour acompanhou a madame Louise.
― Entendi!
Nicole olhou para a pasta de couro preta na mão quando a porta se abriu. Louise saiu com nariz empinado na companhia de Isabella.
― Bom dia, Nicole! ― Isabella revelou os dentes brilhantes.
― Bom dia, doutora Dufour! ― Elevou os olhos para Louise que saía da sala da diretoria. ― Bom dia, madame!
― Bom dia! ― respondeu, o tom seco de Louise. ― Vamos Isabella, eu tenho mais o que fazer.
― Isabella, eu espero que você resolva seus problemas nos dias da sua folga. ― Alexander apareceu na porta. ― Na próxima vez, marque os seus compromissos no dia em que você não estiver de plantão.
― É rápido! ― Isabella confrontou Alexander.
― Assim espero! ― Alexander olhou para a secretária que estava atenta aos e-mails na tela do computador: ― Annie, a partir de agora eu só atenderei as pessoas agendadas.
― Desculpe, doutor! A madame Louise passou direto por mim e entrou sem anunciar.
Isabella andou até a porta da recepção, antes de atravessar, olhou de Alexander para Nicole.
― Ah, Nicky! Eu já estava esquecendo ― fitou o olhar frio de Alexander antes de continuar ― Dr. Kim fez algumas perguntas sobre você.
― Vamos Isabella! Estamos atrasadas! ― Louise se apressou.
― Até mais! ― Isabella acenou com a mão.
A testa estava franzida no rosto com o queixo marcado. Alexander não estava satisfeito com a proximidade entre Louise e Isabella.
― Nicole, entre, por favor! ― Ele segurou a porta.
― Com licença!
A sala da diretoria tinha uma atmosfera imponente e elegante. Alexander manteve a decoração que sua avó tanto apreciava. A mobília executiva contava com um design fortemente inspirado nos clássicos móveis vitorianos.
Atrás da mesa havia uma elegante estante em madeira maciça com livros divididos por assuntos e uma pequena réplica da estátua de Moisés, de Michelangelo, em bronze. Dois porta-retratos em moldura acobreada de Sophie com a família e outra de Alexander ao lado da esposa e do filho decoravam a mesa.
― Sente-se, por favor! ― Ele apontou para a cadeira de madeira em estofado capitonê. ― Fiquei sabendo que o Henry aparece desde que você começou a trabalhar aqui.
Alexander trancou a porta e, em seguida, colocou a mão no bolso da calça.
― Ele até pediu uma sala.
― Dr. Albuquerque deve estar entediado. ― Nicole colocou a pasta sobre a mesa e ajeitou a saia transpassada antes de se sentar.
― Acho que a motivação dele é outra! ― A mandíbula estava esticada. ― Você!
― É sério?!
― Claro! Ele cismou que você parecia com alguém que ele conhecia.
― Alexander, ele tem mais de 67 anos.
― Eu não entendo essa proximidade de vocês. Só de lembrar que o filho dele foi o culpado pelo acidente que causou a morte do nosso filho... ― A expressão era de desgosto, pensar sobre aquilo era horrível.
― Por favor, Alexander! ― Nicole fechou os olhos. ― Nós não sabemos se o Marcello fez isso. ― A voz aflita continuou logo após respirar fundo. ― Você prometeu que não falaríamos mais sobre isso.
Não tirou os olhos dela, ficou em silêncio com uma estranha fisionomia no rosto másculo. Levou a mão ao rosto com barba raspada e costeletas bem discretas.
― Me perdoe! É que ver eles rondando você, me deixa aflito.
― Eles? ― Ergueu os olhos. ― Não acredito nisso!
― O David não para de olhar pra você. ― Prosseguiu em um tom brusco. ― Só você não percebe isso!
― É sério?! ― Sacudiu a cabeça em discordância.
Nicole colocou os papéis sobre a mesa sem acreditar no que ouviu e aguardou por uma resposta. O olhar ilegível a encarava através dos óculos, no entanto, ele não respondeu. Ela ficou em pé e andou até a enorme janela de vidro com vista para a paisagem externa. Deixou o olhar vagar pela agitação em volta do lindo jardim que floreava o pátio do prédio e se virou para Alexander.
― Todas as mulheres devoram você com os olhos, a Isabella que usa a sua mãe pra ficar atrás de você. ― O tom alterado o desafiava. ― Aturo tudo isso para manter a ética no trabalho e a paz no nosso casamento.
― Dr. Bittencourt! ― A secretária o chamou depois de bater à porta.
― Acho que é a Annie! ― Nicole cochichou.
― Annie, estou ocupado!
― Desculpe, é que o doutor Albuquerque está na sala de espera e deseja conversar com o senhor.
Nicole e Alexander trocaram olhares, ela gesticulou com as mãos para o ar sem entender.
― Peça para ele aguardar alguns minutos. ― Levou a mão à nuca. ― Qual é o problema dele?
― Não comece com isso! ― Pegou a pasta de couro. ― Eu vou adiantar o meu trabalho.
Nicole seguiu até a porta no momento em que Alexander se sentava na cadeira.
― O Alexander vai recebê-lo. ― anunciou assim que abriu a porta. ― Até mais doutor Albuquerque!
Por mais que Nicole não compreendesse os motivos que causavam ciúmes ao esposo, estranhou o fato de Henry segui-la. Nicole acenou com a cabeça para Annie e atravessou a porta dupla em cedro de arana maciça.
O relógio pendurado na parede, de bronze cinzelado e dourado, tinha um acabamento fosco e brilhante. Os olhos claros observaram os ponteiros que marcavam 11h30 da manhã e examinaram o refinado cinzel de bronze com folhagens e enfeites de volutas. Alexander admirava o copado, um alto-relevo com alguns cães de caça escalando.
― Com licença! ― Henry olhou para o relógio. ― Posso entrar?
― Claro! ― Fez um gesto para a cadeira. ― Sente-se!
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