A Babá Perfeita romance Capítulo 27

Voltar a trabalhar na mansão Lancaster ocorre, ao mesmo tempo, de forma natural e inusitada.

Natural porque as meninas me recebem de braços abertos, assim como Abigail, Javier e Judith, que não se cansam de dizer o quanto sentiram minha falta e como a casa ficou vazia durante essas semanas.

Inusitado porque, com o decorrer dos dias, eu percebo que Max Lancaster se tornou uma presença muito mais frequente. E, com isso, eu preciso lidar com os seus olhares fortuitos e os seus cumprimentos formais e desajeitados pelas escadas e corredores quando nos esbarramos.

Essa parte é novidade para mim. 

Para a minha surpresa, creio que, nem se eu estivesse pegando fogo, ele me tocaria outra vez. E isso é péssimo para os meus planos, mesmo que seja um pouquinho engraçado.

Meu pai, obviamente, não se opõe ao meu retorno. Especialmente quando eu prometo começar as sessões de fisioterapia na semana seguinte. Isso pode ser um problema, porque eu odeio médicos e hospitais, e um tratamento assim significa aturar ambos por um longo tempo.

- Não seja boba. Javier pode acompanhar você - Judith balança a cabeça, achando o meu desespero absurdo. - É só fisioterapia, Chloezita. Ninguém vai amarrar você em uma camisa de força... ainda.

Eu tento sorrir, mas uma lembrança me impede, ao mesmo tempo em que envia um calafrio que pelo meu corpo. Minha mãe passou anos da sua vida entre clínicas, laboratórios e hospitais. Na minha adolescência, médicos eram recorrentes, sempre tentando fazer o melhor para amenizar o seu sofrimento, muitas vezes sem sucesso. 

Se nunca mais eu precisasse ver um médico na minha frente, ainda assim seria pouco.

- Não se preocupe, eu posso pegar um táxi - sorrio, tranquilizando ela. Estamos as duas no meu quarto, organizando de volta as minhas coisas no guarda roupas. Com ajuda, não é um processo assim tão demorado e já estamos quase terminando. - O Sr Lancaster me pagou pelo mês inteiro, então não será um problema.

Na verdade, ele me pagou o salário e mais uma boa quantia extra. Mas não digo isso a Judith. Os segredinhos sujos entre o Sr Lancaster e eu estão guardados em uma caixinha trancada com chave.

- Se ele te descontasse, eu mesma faria questão de enfiar uma faca naquela garganta - ela cerra os olhos, irritada. Pobre Jud. Se soubesse tudo o que o patrão me revelou, com riqueza de detalhes, a essa altura estaria presa por homicídio. - Ele pelo menos pediu desculpas a você, mi amor?

- Não se preocupe, Jud. Ele já se desculpou e tudo foi esclarecido - eu suspiro, colocando um ponto final no assunto. - Como estão as aulas de violino de Evie?

Sua resposta vem junto com um olhar desolado.

- Ela abandonou. Como tudo o que já começou antes, aliás. Piano, teatro, jazz - enumera, a voz claramente decepcionada. Judith ama Evie e se preocupa demais com ela, mais de uma vez eu percebi isso. - Disse que não tinha interesse. Não sei mais o que fazer com esta garota, Chloezita!

- Não fique assim, Jud - eu sorrio, dando um beijo em sua testa. - Vou conversar com a Evie mais tarde, depois do jantar. Aliás - acrescento, lembrando de uma coisa importante - não se esqueça de preparar um prato de comida para ela. Acabou essa história de biscoitos e cereais em todas as refeições, isso já foi longe demais.

- Entendido, capitã - ela ergue as sobrancelhas, com um sorriso astuto. - Você leva jeito com as crianças. Já pensou em ter alguma formação voltada para elas?

- Pedagogia - eu confirmo, revirando os olhos. - Mas já estou começando a me questionar sobre isso.

Nós duas caímos na gargalhada. As meninas não são fáceis, mesmo sendo uns amores. Principalmente Evie, a Chefinha. Às vezes é tão ranzinza quanto uma senhora de oitenta anos. Mesmo assim, pouco a pouco, acabei conquistando o seu coração e hoje posso dizer que somos boas amigas.

Faço planos com Judith para a o ano novo. Decidi passar o reveillòn na mansão, especialmente depois do fiasco do Natal, com tia Rose tentando me pegar pelo estômago com uma dúzia de pratos diferentes, como se, logo depois de provar o peru, eu fosse revirar os olhos e correr para abraçá-la com lágrimas nos olhos.

A presença dela me irrita cada vez mais, mas não quero brigar com meu pai outra vez. Além disso, começo a pensar que, estar perto da tia Rose, por algum motivo, faz ele se lembrar de outra época, tempos melhores. Talvez quando a mamãe estava por perto para despertar nele o sorriso leve que, hoje, eu só vejo nas fotografias.

Além disso, tenho meus próprios planos para os próximos dias. Planos que envolvem Max Lancaster se arrastando de quatro pela casa como um cachorrinho domado. E eu devo confessar, nenhum desafio nunca me pareceu tão difícil antes.

Talvez por isso mesmo seja tão excitante.

Para uma virgem viciada em apostas e cartas, isso faz a adrenalina correr nas minhas veias perigosamente. Com um sorriso nos lábios, admito para mim mesma que precisarei me superar em todos os aspectos se quiser vencer esse jogo. E o primeiro passo é conseguir uma forma de me aproximar do babaca. O que não vai ser fácil já que ele está realmente empenhado em me afastar. 

O jantar é servido no mesmo horário de sempre e, depois de tomar um banho, eu desço até a cozinha. No caminho, passo pela sala de jantar, ricamente decorada e mobiliada, e penso qual o motivo de ter um cômodo tão incrível quanto aquele, tão suntuoso, se você vai terminar reunido a mesa da cozinha.

Na minha casa também fazemos desta forma, mas pelo menos ninguém se deu ao trabalho de comprar uma mesa para dezesseis pessoas, só pelo prazer de ignorá-la completamente. Nem pôr um lustre de cristal, que deve ter custado milhares de dólares, sobre ela.

- Chloe vai sentar ao meu lado - Evie determina com um sorriso largo, enquanto Maisy, a sua esquerda, pisca os olhinhos graciosamente para mim. 

Quando ela sorri, noto uma janelinha se formar e abro a boca, espantada e, ao mesmo tempo, maravilhada.

- Você recebeu a visita da Fada do Dente! - berro, correndo para ela e enchendo seu rostinho sapeca de beijos. 

Ela se contorce toda, enquanto sente cócegas e procura escapar, mas eu não deixo.

Evie revira os olhos, impaciente.

- A Fada do Dente não existe.

Eu olho para ela com os olhos cerrados.

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