Camila Coelho
" - Quietinha filhinha, não queremos acordar a sua mamãe.
Eu choramingo no colo dele.
Ele cheira a cigarro e a bebida. E toda vez é assim. Ele chega sorrateiro no meu quarto, apaga o meu abajur e me põe em seu colo.
-Está toda molhadinha neném, será que fez xixi na calça, deixa o papai ver..."
Eu acordo gritando e soluçando...
Não... Outro pesadelo não.
Eu tinha conseguido ficar um tempo sem eles, mas Dominique trouxe o inferno para a minha vida novamente.
Tiro a cobertura e me levanto. Meu coração está acelerado e minha camisola grudada em meu corpo. Eu estou toda molhada de suor.
Me levanto com dificuldade e minha vista escurece. Me escorei na parede e espero a passar.
Esses pesadelos mexem com o meu psicológico e com o meu corpo.
Há dias que não durmo direito...
Estou cansada e me sentindo morta por dentro.
Eu preciso jogar.
Eu preciso…
Pensei que fosse jogar mais vezes com o mestre Bernardo, mas desde que jogamos naquele dia, ele não me fez mais nenhuma proposta.
Nos falamos muito pelo whatsapp. Era fácil conversar com ele e sempre tínhamos assunto. Era bom ter um amigo, há tempos que não tinha nenhum. Tinha muitos conhecidos e colegas, mas nenhum amigo íntimo. E ele era muito cativante! Fofoqueiro também... Nesses poucos dias eu já sabia de detalhes sobre a sua vida, sua família e seus irmãos. Só podia ser fofoqueiro, porque uma pessoa como ele se abriria tão facilmente, para uma pessoa estranha.
Já eu... Não consegui contar nada a ele, mesmo ele se esforçando para descobrir.
Eu queria que ele me chamasse para um jogo novamente, pois dentro da etiqueta do BDSM, o convite tinha que vir dele.
A verdade é que eu já estava começando a me desesperar... Se não jogasse ia começar a querer fazer coisas que eu não podia fazer, e eu sei que se eu entrar nessa novamente seria difícil de sair.
Vou para o banheiro, tiro a camisola e entro no chuveiro frio. Preciso sentir, para esquecer a dor dentro de mim…
A água está muito fria, principalmente nesse frio que anda fazendo em São Paulo. Parece que tem pedras de gelo caindo nas minhas costas, mas isso é mais reconfortante do que um banho quente.
Aconchego só me faria descer no abismo..E eu não quero descer no abismo.
Deixou a água escorrer por alguns minutos e depois desligou o chuveiro e começou a me enxugar. Olho para o espelho de corpo inteiro que não tenho banheiro.
Às marcas que Bernardo deixou em minha bunda, já sumiram a bastante tempo. Meu corpo está branco, quase transparente. Sem nenhuma marca. Tenho olheiras profundas, denunciando minhas noites mal dormidas. Meus olhos estão sem vida!
-Eu preciso jogar... Eu preciso jogar...-murmuro olhando para o meu reflexo.
Eu preciso me equilibrar, e só consigo jogar.
- Amanhã será um novo dia! Você consegue! -Murmuro mais uma vez para o meu reflexo.
Vou para o armário pegar uma camisa larga e coloco no meu corpo. Seco bem o cabelo e faço um coque.
Procuro uma ansiedade para minha vivência e deitei novamente na cama..
Amanhã eu preciso ir ao clube. Não vou mais esperar pelo Bernardo... Não dá...
***************
Acordo sobressaltada com meu telefone gritando no criado mudo. Ponho a mão na vista, já que a luz do abajur me incomoda.
Viro em direção ao barulho e tateio o criado mudo procurando o celular
Acho e atendo.
-Alô.
-Oi passarinho...
Aquela voz... Aquele apelido...
Bernardo...Mas o que ele está me ligando? Ele nunca ligou…
-Bom dia mestre!
-Boa tarde Camila, já são 13h. Estava dormindo?
Levanto-me sentando na cama e tomando um gole de água.
-Eu acordei de madrugada com vividos. Tomei o remédio e dormi dormindo demais.
-Está melhor?
-Sim mestre... Sem dor. Acho que o corpo só queria um descanso.
-Que bom! Estou ligando pra te chamar pra jantar em minha casa. Às 20h, se aceitar mandarei um segurança te buscar.
Dou um suspiro no telefone. Graças a Deus, não precisarei ir ao clube.
-Claro que aceitou mestre. O que devo vestir…
-O que quiser... Se quiser vir sem nada, não vou me importar.. - eu sorrio... Garanto que eu também não vou me importar...- Tem algo que você não coma?
-Não Senhor, sou boa de garfo.
-OK! Te espero então às 20h.
Tenha um bom dia passarinho.
-O mestre também.
Desligo o telefone e suspiro, rindo ao mesmo tempo... Estou animado! Só espero que seja tão especial como foi o primeiro jogo.
Me levanto, porque agora me deu até fome!
*****************
Como ele disse, às 20h um Pajero preto buzinou na porta de minha casa. Escolhi para ir ao jantar uma pantalona branca, e uma blusa vermelha de mangas compridas. Faz frio em São Paulo. Pus uma bota de cano curto com um salto bem alto e deixei meu cabelo solto. Fiz uma maquiagem básica.
Agora estou dentro do carro e o Daniel, que é a segurança que me veio buscar, para na frente de uma casa enorme num condomínio luxuoso nos Jardins.
Uma casa muito moderna, dessas que parecem uma caixa com janelões de blindex, com um jardim bonito na frente.
Luxo, requinte e modernidade resumem bem o que vejo. Ele abre a porta do carro para mim e eu saio com sua ajuda. Ele sai andando em direção a porta da frente e pede para eu seguir ele. Essas portas têm mais de três metros de altura. Eu nunca consegui que uma casa combinasse tanto com o seu dono como está. Combina... E muito…
Ele toca uma campainha.
Bernardo abre a porta vestindo apenas uma calça jeans, com os cabelos molhados e despenteados e descalço. Daniel sai da vista e ele me olha.
-Boa noite passarinho... Desculpe os trajes, mas não deu tempo de eu me arrumar antes que você chegasse. Entre…
Ele vira de costas e sai andando na frente. Aquela bunda perfeita que se encaixa tão bem na calça jeans.
Que homem, meus senhores! Que homem!
-Fique à vontade, vou por uma camisa e já volto.
Ele sobe os degraus da escada de dois em dois e eu fico sozinha na sala.
Veja o ambiente. Tudo muito claro. Paredes claras, sofá claro, móveis brancos. É uma sala enorme, cheia de poltronas confortáveis. No canto vejo uma ilha de mármore branco e armários denunciando ser uma cozinha. O cheiro bom vem de lá... Será que é ele que está cozinhando?
A escada que ele subiu está no canto posterior e deve dar para os quartos. A casa é cheia de janelões de blindex que vão quase até o chão. Vejo por uma dessas janelas que na parte de trás há uma piscina e uma outra construção. O lugar é lindo, digno de uma revista de arquitetura. Mas também não vejo nada pessoal. Nada que fale um pouco sobre o dono do lugar. Pelo menos aqui não.
Ele volta com uma camisa de malha azul e ainda descalço, com os cabelos devidamente penteados.
-Espero que você goste de macarrão... -Diz andando para a cozinha. Eu vou atrás dele…
-Adoro. O mestre que fez o jantar?
-Sim, minha especialidade... Macarrão aos quatro queijos.
-Eu amo...
-Que bom!
Ele abre uma adega climatizada e tira uma garrafa de vinho de lá de dentro já aberta, enchendo duas taças.
-Bem vindo a minha casa. -fala estendendo a taça para mim e batendo a sua na minha, fazendo um brinde.
-Sua casa é linda!
-Obrigada, ficou ela do jeito que eu queria…
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