Nuria
A porta se abriu com força.
Eu me levantei num salto, o coração ainda acelerado pela ausência dele, mas a presença dele bastava para me fazer correr.
"Stefanos!"
Atravessando o quarto num segundo, me joguei contra o peito largo e quente que eu tanto conhecia, sentindo o cheiro dele... suor, fumaça... e sangue.
"Você está ferido?" perguntei, ofegante, as mãos tentando abrir o tecido rasgado da camisa, os dedos tremendo de medo.
Mas ele segurou minhas mãos com firmeza.
"Não é meu." A voz saiu grave, mais baixa do que o normal. Ainda carregava a guerra. "É do Rylan."
"Rylan..." sussurrei, sentindo o chão vacilar sob meus pés. "Ele...?"
"Está vivo. Mas levou uma flecha. De prata."
Cobri a boca com a mão. O mundo girou por um segundo.
Stefanos me puxou de volta para o peito dele, os braços envolvendo meu corpo como se quisesse me esconder de tudo que existia do lado de fora.
"Sshh... Respira comigo." Ele encostou a testa na minha, a mão deslizando pela minha nuca com uma delicadeza que me desarmava inteira. "Eu estou aqui. Você está bem. Ele vai ficar bem também. Mas agora eu preciso olhar pra você."
"Stef..." minha voz falhou.
"Preciso ver se você está inteira. De verdade." Ele segurou meu rosto com as duas mãos, os polegares acariciando minhas bochechas. Os olhos dele buscaram os meus com tanta intensidade que eu quase desabei ali mesmo. "Algum arranhão? Se machucou nessa confusão? Teve alguma tontura? Fala pra mim."
"Eu estou bem." Pisquei rápido, tentando afastar as lágrimas. "Só não estava pronta pra isso. Pra mais sangue. Mais guerra."
Ele me puxou para um abraço ainda mais apertado, o queixo dele encostando no topo da minha cabeça.
"Eu te avisei, Ruína. O caos sempre me persegue... mas não vou deixar nada acontecer com você."
A forma como ele disse aquilo... como se dissesse "eu sou seu abrigo", sem precisar usar essas palavras.
Eu me agarrei a ele com força, sentindo o coração dele martelar contra meu rosto, e naquele instante, por mais que o mundo estivesse prestes a ruir lá fora, dentro daquele abraço... eu estava a salvo.
"Obrigada por voltar." sussurrei.
"Eu sempre vou voltar para você," ele respondeu, como se fosse uma promessa antiga e eterna.
Quando me afastei o suficiente pra olhar nos olhos dele, os dedos dele ainda estavam sobre meu queixo, como se ele não conseguisse soltar.
"Mas agora eu preciso ver o Rylan. É importante."
O calor do momento se quebrou, e ele franziu o cenho.
"Por quê?" a voz endureceu de novo.
"Porque... eu posso ajudá-lo."
"Você devia estar mais preocupada comigo." A sombra do ciúme passou pelos olhos dele. "Com a gente."
"Você não está correndo risco de vida."
"Ele também não está."
"Depende." Minha voz saiu mais baixa. "Depende do tipo de prata."
Os olhos dele se estreitaram.
"Solon usa compostos contrabandeados. Se for um deles... Rylan pode não resistir. Não com os métodos comuns."
Stefanos travou o maxilar, inspirou fundo, e assentiu uma única vez.
"Então vamos." Me virei para Jenna que tinha ouvido toda a conversa, e estava em prantos.
"Venha com a gente." a chamei e comecei a correr.
Fomos até o posto médico improvisado atrás da estufa. O cheiro de sangue fresco e verbena nos atingiu antes mesmo de abrirmos a porta.
E então vimos.
Rylan estava colapsando na maca.
O corpo tremia, espasmos violentos o faziam arquear as costas, os olhos virados, espuma no canto da boca. A ferida do ombro jorrava um sangue escuro e espesso. Os médicos estavam paralisados. Nenhuma compressa fazia efeito.
"Segurem ele!" gritei.
Dois curandeiros tentaram contê-lo, mas ele era forte demais.
"Isso é impossível!" um deles exclamou. "Não é uma reação comum à prata!"
"Claro que não é!" rosnei. "É prata alterada! Composto de necroverbena e cinábrio!"
"Você tá dizendo que isso é veneno de nível supremo?" murmurou um dos médicos.
"Não," retruquei, correndo até a bancada. "Tô dizendo que isso mata. Rápido."
"FAÇAM ALGUMA COISA!" Stefanos rugiu, a voz explodindo pela sala. O caos tomou o lugar do raciocínio.
Corri até a prateleira onde vi frascos e folhas secas sendo guardados.
"JENNA!" chamei com urgência. "Aquela raiz azulada! E o frasco âmbar! RÁPIDO!"
Ela correu, olhos arregalados, entregando tudo com as mãos tremendo.
Peguei a faca do canto da bancada e cortei minha própria palma. O sangue azul escorreu direto no frasco. Adicionei as raízes e esmaguei tudo com força, sentindo a vibração do momento pulsar entre os dedos.
Com fascínio silencioso.
Com a fome de alguém que acabou de ver algo que ninguém mais viu.
Ele se aproximou. Passou a mão pela minha que ainda sangrava. Tocou o frasco com o resquício do antídoto e olhou fundo nos meus olhos.
"Você... é mais do que eu imaginava."
"Eu fiz o que precisava ser feito," murmurei, sem forças pra mais nada.
Ele encostou a testa na minha, sussurrando:
"E você salvou meu irmão de vida."
Minhas pernas cederam, mas ele me segurou no colo antes que eu caísse.
Forte. Inabalável. Meu lobo.
"Fiz apenas o que ele faria por mim." murmurei, tentando justificar, mas Stefanos apenas balançou a cabeça, com um pequeno sorriso no canto da boca.
"Temos que conversar sobre essa sua 'pequena habilidade' que você esqueceu de mencionar." A voz dele soou mais baixa, quase divertida, mas o olhar seguia atento a tudo ao redor.
Meus olhos percorreram a sala.
Todos estavam me olhando.
Não com admiração.
Mas com medo.
Curandeiros, soldados, enfermeiros... até os que tinham entrado apenas para ajudar. Silêncio absoluto. Como se o que acabara de acontecer não tivesse nome. Como se eu tivesse me tornado algo... que não deveriam tocar.
"Mas não aqui." respirei fundo e olhei para Jenna. "Fique aqui e vigie a recuperação dele. Se até às cinco da manhã ele não acordar, me chame imediatamente."
Ela assentiu, se aproximando da maca com cuidado, mordendo o lábio inferior, os olhos fixos em Rylan como se não quisesse deixá-lo sozinho nem por um segundo.
Me virei para Stefanos, mais perto do que antes, e murmurei junto ao seu ouvido:
"Me tira daqui... eles estão me olhando como se eu fosse uma aberração."
O rosnado que vibrou no peito dele foi a resposta imediata. Um som baixo, gutural, possessivo.
E bastou isso.
Todos na sala recuaram um passo.
Alguns desviaram os olhos. Outros simplesmente saíram, procurando o que fazer, fingindo que não tinham visto, nem entendido, o que acabara de acontecer.
Ele me apertou com firmeza nos braços, me protegendo do mundo como se nada mais importasse, e me levou dali... como se a única coisa que ainda fizesse sentido fosse me manter longe daquele julgamento silencioso.

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