Contei a Ben sobre o ocorrido pouco tempo antes de ele chegar. Quando acabei, ele ficou um tempo calado, parecendo processar tudo que tinha ouvido. Quando me fitou, perguntou:
- Passa pela sua cabeça não contar a verdade a Heitor, em função da ameaça dela?
- Não. Embora eu tenha ficado um pouco apreensiva, sei que isso é para o bem de Maria Lua. Não podemos continuar com esta mentira, que a prejudica principalmente pelo fato da certidão de nascimento nos restringir pra caralho.
- “Caralho” não fere os ouvidos dela? – ele me encarou – Literalmente “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”.
- Ah, Ben...
- Quase que eu disse ao Thorzinho: “Tchau, lindo, até segunda-feira, na sua casa.”
- Nem inventa.
- Só pensei, não falei.
- Quando você começa?
- No início do próximo mês.
- Sabe o que me passou pela cabeça, Ben?
- O quê? Sinceramente, eu tenho medo do que se passa na sua cabeça.
- Que a princípio eu achei que Allan me receberia bem se soubesse que sou filha de Beatriz Novaes. Mas depois que Celine saiu, fiquei a imaginar se ele não vai me odiar. Afinal, sou a filha da mulher que talvez ele amou e que o traiu com Francesco.
- Ele traiu a sua mãe primeiro. Para mim ficou claro isso... Ela se vingou.
- Ben, sinceramente, acho que eu preciso dobrar meus remédios. Tenho medo de não dar conta de tudo isso.
- Dobre então, meu bem. Então já estará fazendo efeito quando falarmos com Thorzinho.
- Pare de chamá-lo assim, porra.
- Você nunca se importou, Babi.
- Não... Porque não sabia que Nicolete o chamava assim. Pelo visto, só ela e a loira do pau do meio usam apelidos para ele.
- Você deveria criar um... Bem original... Só seu.
- Gostoso? Amor da minha vida? Razão da minha insanidade? Desclassificado mor?
- Ah, me dá até calor! – ele se abanou.
Deu um tapa nele, que se defendeu com o braço:
- Ai, isso doeu.
- Você se comporte do lado dele, ouviu?
- Vou só cuidá-lo para você, eu juro. Deus me livre perder um pedaço dos meus cabelos, como você fez com a Barbie das trevas.
- Já que você chegou mais cedo hoje... Que acha de mexermos nas coisas de Salma?
- Você está preparada?
- Que tempo vou ter depois? Já estou fazendo contagem regressiva para ficar de lá para cá na casa de Heitor.
Ele suspirou:
- Estou orgulhoso de você, minha amiga do coração.
- Eu sei que vai doer, mas é preciso.
Uma hora depois e conseguimos fazer Maria Lua dormir, colocando-a na minha cama.
Estaríamos envolvidos nas coisas no quarto dela e queríamos que ela tivesse um sono tranquilo.
Assim que abrimos a porta do primeiro armário, o cheiro do perfume de Salma invadiu o quarto de tal forma que chegamos a ficar confusos.
- Eu a sinto aqui. – Ben disse.
- Eu também. – Mostrei meu braço arrepiado para ele.
Ela tinha muitas roupas. Encontramos tantas lingeries não usadas, ainda com etiquetas. Sapatos de todas as cores, tipos de saltos diferentes e acessórios e maquiagens. Salma sempre foi uma mulher muito vaidosa e gostava de vestir-se com cores alegres e de forma sexy.
- De que adianta tanta coisa, não é mesmo? – Ben começou a jogar as roupas com etiquetas numa sacola – Não se leva nada para o outro plano.
- Que não se leva, sabemos. O que ela deveria era ter usado tudo, não ter guardado nada para uma ocasião especial.
- Ocasião especial é o dia que se vive.
Peguei o vestido vermelho que havia pego emprestado para ir à casa de Allan Casanova, chegando coincidentemente na festa de aniversário de Heitor. O vestido ainda estava rasgado. E eu lembrava exatamente da cena de como aquilo havia acontecido. Foi como se minha mente refrescasse a tal ponto que eu conseguia sentir o cheiro dele no elevador, quando ficamos presos. Puxei meus cabelos para frente, como se precisasse deixar o pescoço e parte das costas pra que Heitor pudesse tocar minha tatuagem com sua boca.
- Babi, está me ouvindo? – Ben perguntou.
Balancei a cabeça, voltando ao presente, ao mundo real.
- Não... Eu estava longe. Dentro de um elevador, na verdade – levantei o vestido – Não posso me desfazer deste. Tem muita lembrança guardada neste tecido.
- Lembro desta ocasião. Eu avisei que o vestido não cabia em você. – Ele riu.
- Sabe o que me veio à cabeça agora, além de Heitor?
- Não.
- Como a vida é curta, Ben. Minha mãe estava comigo e um dia simplesmente se foi. Salma engravidou, fez mil planos e de uma hora para outra Deus mudou tudo que ela tinha traçado para o futuro. A porra do amanhã é uma loteria.
- E... A gente deixa tanta coisa passar – ele sentou no chão, abrindo outra porta do armário – Eu preciso rever Tony.
Arqueei a sobrancelha, enquanto o encarava.
- Eu dormi com tantos homens... Eu tentei ser feliz. Mas eu não consigo sem ele. Do nada, à noite, eu penso nele e nas poucas vezes que ficamos juntos. E se eu morrer amanhã e nunca dizer a ele que ainda o amo? Que não posso ser feliz sem ele?
Senti meu coração bater forte:
- Sei exatamente o que você está dizendo, Ben.
Ele abaixou a cabeça, tocando numa blusa de Salma, carinhosamente:
- Fico imaginando se ela conseguiu viver tudo que queria... Se falou tudo que tinha vontade para as pessoas. Ela sofreu no passado. E não tenho certeza se ela era feliz. Parece que sempre tinha uma nuvem sobre ela.
- Eu acho que ela foi feliz sim, da maneira dela. O que nunca vou entender é como ela se envolveu com Heitor. E o que se passou de verdade na cabeça dela quando engravidou. Como eu precisava entender... E isso nunca vai acontecer. Eu amo Heitor. Duvido que possa amar outro homem e sequer me envolver com alguém novamente. Jardel acabou comigo. Heitor foi a minha redenção. E os dois bastaram. Acho que tenho medo de encontrar outra pessoa, entende?
- Se dê uma oportunidade. Você merece ser feliz ao lado de Thorzinho.
- Eu tentei... Ele me mandou embora, esqueceu? Me fez juntar minhas coisas de forma humilhante. Mas sabe que isso não me importou tanto quanto ver a Barbie das trevas entrando na casa dele com tanta intimidade? Me senti tão ridícula, tão menosprezada, tão infeliz. Eu sempre deixei claro que queria que ele terminasse a porra dos relacionamentos dele – eu ri – Ben, eu me envolvi com um homem que tinha duas mulheres ao mesmo tempo e uma sabia da outra. Como eu poderia ser a terceira e aceitar isso? Não... Nunca. E sabe o que mais? Eu acho que pedi tão pouco para ele. E ele não foi capaz de me dar. Ele pôs a loira do pau do meio em vários lugares, menos fora da vida dele.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Como odiar um CEO em 48 horas
Por que pula do 237 para o 241 ?...