Camille Dubois
Arrumei o cabelo pela terceira vez naquela tarde. Cada fio no lugar. O batom bordô, recém-aplicado, ainda marcava a taça de vinho que eu segurava com firmeza — mas que aparentava leveza. A trilha instrumental tocava baixo, como um sussurro no fundo da minha cabeça. Chopim. Sempre funcionava com ele. Sofisticado. Melancólico.
A luz estava perfeita — nem muito quente, nem muito fria. O abajur lançado contra as cortinas brancas dava ao apartamento aquele ar de casa que Lorenzo insistia em querer, mesmo nunca sabendo o que isso significava. Eu sabia. Sempre soube.
Passei o dedo ao redor da borda da taça, enquanto olhava o relógio.
Qualquer minuto agora.
Ele viria. Não por mim — ainda não. Mas pelas roupas, pelos livros, pelo orgulho amassado numa mala. Eu sabia que ele voltaria, e mesmo que fosse para partir de novo, essa seria a minha chance.
Desde a Toscana, eu repasso cada palavra daquela discussão. As mãos dele trêmulas, o olhar distante, como se não me enxergasse mais. Como se ela — Aurora — tivesse roubado algo que era meu por direito.
Mas Lorenzo sempre foi assim. Fácil de encantar, difícil de manter. Eu aprendi a domá-lo com beleza, com estratégia, com paciência. E agora, precisaria de tudo isso, e mais.
Me levantei do sofá. Fui até a adega e peguei a garrafa que guardei desde a nossa última noite juntos. Um vinho francês caríssimo, que ele dizia guardar para um momento especial. Pois que seja esse, então. O último. Nossa despedida…
Coloquei a garrafa sobre o balcão. Do armário da cozinha, peguei o frasco minúsculo. Discreto, de vidro âmbar. O conteúdo — um líquido espesso, incolor — era o presente de uma amiga da faculdade de Farmácia. Nada que cause dano, apenas… desacelera. Relaxa o corpo, apaga a mente. Tempo o suficiente para que ele fique. Para me ouvir. Para que não corra.
Misturei no vinho com cuidado, medindo a dose certa. Não sou uma criminosa — apenas uma mulher apaixonada demais para aceitar o fim. Não depois de tudo o que construí. Das campanhas, dos jantares, dos olhares invejosos nas festas de gala. Lorenzo e eu éramos um símbolo. Um império. O casal invejado, e se depender de mim vamos continuar a ser.
“E você não abandona um império por uma garota de verão.”
Coloquei as taças sobre a mesa de centro e voltei ao sofá. Respirei fundo. O som da chave girando na porta me atingiu como um golpe seco no peito.
Era agora.
Recobrei a postura, ergui a taça, e sorri.
Jogo começou.
Ele girou a taça nas mãos como fazia com tudo na vida — com hesitação, como se não quisesse se sujar com o que não pudesse controlar. Bebeu devagar, desconfiado. Ainda assim, bebeu.
Sentei-me ao seu lado, mantendo a distância calculada. Não queria assustá-lo. Queria que pensasse que estava no controle. Ele sempre foi um homem movido por ilusões — de liberdade, de paixão, de redenção. Aurora só foi a última a se aproveitar disso.
Mas eu o conheço. Conheço cada dobra da alma dele, cada reação antes mesmo de acontecer. E vi o momento exato em que seus olhos perderam o foco.
O silêncio se estendeu entre nós. Fingi não notar. Dei mais um gole no meu vinho, agora puro, e esperei.
— Camille… — ele murmurou, a voz embargada. — O que você…?
Sorri. Um sorriso de mulher que já foi vencida, mas se recusa a sair do jogo.
— Shhh… Você precisa descansar. Só isso.
Ele tentou levantar. Tão previsível. Mas os joelhos vacilaram. Estiquei os braços e o guiei até o sofá, como quem cuida de um doente. E de certa forma, era isso que ele era agora. Um doente pela própria ideia de amor puro. Pela fantasia de algo mais simples, mais autêntico. Como se isso existisse.
Sentei-me ao seu lado, quando seu corpo finalmente cedeu. Passei os dedos pelos cabelos dele, ainda macios, ainda meus.
— Porque eu ainda te amo, Lorenzo. E essa… é minha última noite com você. Uma despedida real. Mesmo que você não queira.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Proibida para Mim: Apaixonado pela filha do meu amigo