O Príncipe do Oriente romance Capítulo 43

O medo é uma reação natural diante de novos desafios. Muita das vezes ele paralisa, em outros faz com que tenhamos reações exageradas. E foi diante de uma reação exagerada de medo de tomar o poder em mãos que, como príncipe regente, Karim instaurou três meses de luto em homenagem ao pai.

Isso significava que ninguém poderia ser conclamado Rei até que o luto acabasse e que Karim tivesse tempo o suficiente para que pudesse se preparar para esse novo desafio que lhe impunha. Também dava tempo o suficiente para que ele pudesse sentir toda a dor que aquilo representava para ele. Afinal, isso significava que tudo aquilo que um dia ele poderia chamar de família estava literalmente morto para ele. E isso lhe doía demais.

Karen tentou cuidar do marido nesse meio tempo, auxiliá-lo de forma que passasse da melhor maneira possível pelo luto. Sabia que a dor com o tempo diminuiria, ainda que alguns gatilhos sempre ajudassem que algumas memórias doessem ainda mais. Todavia, ela sabia dos processos de luto, porque havia passado por algo mais ou menos parecido quando tivera a sua mãe morta.

E entendia principalmente a questão de não ter ninguém.

Antes de conhecer Agnes e ter uma amiga, decerto Zilena foi uma figura presente que acalentou o coração da menina órfã sem mãe e sem pai. Mas, como Karim, Karen sabia qual era a sensação de se sentir sem ninguém, um vazio existencial preenchendo o peito ao se dar conta que estava sem família. E talvez por isso compreendesse bem os momentos de depressão que Karim perpassou, escondendo-se no quarto escuro, evitando reuniões como se estivesse fugindo do maligno, dentre outras coisas.

Suspirou enquanto fazia carinho no cabelo de Karim. Ele estava dormindo, para variar. A maneira que ele tinha encontrado de fugir da dor era dormindo e tudo bem, Karen compreendia. Sentia pena do marido em estado tão frágil. Queria poder ajudá-lo de alguma outra forma, fazer o que quer que fosse para que seus olhos voltassem a brilhar novamente, mas não era como se conhecesse um Djinn que pudesse realizar os seus desejos. E isso nem sequer existia.

O que pode fazer, nesse tempo, foi amparar o marido enquanto o tempo passava lentamente. Uma semana, duas semanas, três semanas, um mês. Foi o tempo que os clãs aguentaram vendo o príncipe definhar sem tomar nenhuma providência pelo Reino. No fim, Karen teve que ajudar Karim a se arrumar e quase que o expulsou do quarto para que ele voltasse a se reunir com os clãs. Ele foi a contragosto.

Tinha que fazer alguma coisa, mas o que fazer?

Foi Omar se mexer na barriga que ela compreendeu que poderia fazer algo. Afinal, embora Karim tivesse perdido o pai e isso fosse dolorido, ela bem sabia que era, outra pessoa estava chegando na família. E, afinal, ele, ela e Omar eram uma família. E isso poderia bastar para acalentar o coração deles, não podia?

Pediu para que Gaya fosse buscar alguns tecidos e a máquina dela no ateliê e decidiu que sabia exatamente o que fazer para deixar Karim um pouco melhor.

Quando suas coisas chegaram, passou ainda mais um dia trabalhando em cima de um projeto seu e foi com muito esmero e sorrindo bastante que percebeu que seu trabalho estava concluído.

Quando Karim voltou, cansado como sempre e triste como todos os dias, Karen o puxou para a cama, o que ele nem sequer pestanejou. Ultimamente, só queria ficar o máximo de tempo possível deitado enquanto o tempo passava.

― Tenho algo para te mostrar. ― Karim concordou apaticamente.

― Eu e Omar decidimos que era um bom presente para você lembrar que embora o baba tenha morrido, nós ainda somos uma família. ― Karim franziu o cenho. Tinha entendido a mensagem, mas agora estava curioso sobre o que eles lhe trariam.

Karen então estendeu o fruto do seu trabalho na cama fazendo Karim arregalar os olhos e então um tímido sorriso se formar no canto dos lábios.

― É o que eu estou vendo mesmo? Você fez isso por mim? ― Karen concordou com um sorriso bobo nos lábios.

― Omar aprovou a ideia. Acha que vai ficar muito gato com as cores da bandeira. ― E Karim gargalhou alto diante da fala da esposa a abraçando logo em seguida, repleto de alegria. Não acreditava mesmo que ela tivesse feito isso por ele!

Diante dele havia uma blusinha minúscula e fofa de gola com o desenho da bandeira de omã em miniatura no canto do peito, uma espécie de imitação da blusa da Tommy Hilfiger. Os Shorts eram de um material sintético com as cores vermelha e verde em faixas da bandeira. Tinha ficado estiloso e lindo. De uma maneira que ele não conseguiria nem pensar em fazer.

― Muito obrigado, Karen. ― E dito isso, Karim beijou os lábios da esposa, realmente feliz, melhorando um pouco do humor depressivo que até então ele estava cultivando.

― Omar está chutando, veja. ― E dito isso, Karen pegou a mão de Karim colocando sobre sua barriga. Ele arregalou os olhos ao sentir um chute forte parecendo mais do que maravilhado com aquela surpresa.

― Oh! Ele é forte! Parece um cavalo com raiva. ― Karen revirou os olhos.

― Pare de comparar o nosso filho com um cavalo, Karim.

― Mas eu gosto de cavalos. ― Ele sorriu. Karen acabou fazendo o mesmo instintivamente.

― Eu sei. Mas Omar pode acabar achando que é um cavalo mesmo e chutando ainda mais a minha pobre barriga. ― E Karim sorriu feliz.

Pouco a pouco a sua ficha ia caindo de que alegria maior não havia do que ter a sua esposa e o seu filho a sua frente. Ainda que doesse – e continuaria doendo – a morte do seu pai, a morte do seu irmão, a verdade é que novas gerações estavam vindo, um filho vinha e Karim, por certo sabia que cabia a ele cultivar uma nova família feliz, uma nova alegria, um novo reino repleto de famílias felizes.

Cabia a ele aumentar a sua linhagem e, quem sabe, quando estivesse mais ou menos com a idade do seu pai, sorrir feliz, nitidamente muito feliz, vendo a família grande, os filhos e netos, as alegrias infindáveis e então ter a certeza absoluta de que tinha feito de tudo para ter uma família grande e unida o suficiente para que nenhum tio Aziz tivesse a chance de acabar com ela.

E com esse pensamento, ele sorriu.

Comentários

Os comentários dos leitores sobre o romance: O Príncipe do Oriente