O Príncipe do Oriente romance Capítulo 42

Íamos aproveitar que Amir havia nos chamado e íamos contar o sexo do bebê. Com certeza ele ia ficar muito feliz ao descobrir que teria um neto. Não sabíamos porque ele havia nos chamado, mas assim que entramos no recinto de praxe onde o homem se guardava, percebi que o assunto era sério. Ele estava com a cara fechada.

Também parecia mais velho, mas infelizmente é isso que o câncer acaba causando nas pessoas, infelizmente. O rosto mais pálido, o cabelo escasso, os olhos já não tão brilhantes e com vida. Todos aqueles símbolos eu havia aprendido com minha mãe e doía ver que eles se repetiam com o pai de Karim.

― Nos chamou, pai? ― Ele perguntou suspirando. Amir concordou.

― Sim. Não tenho uma boa notícia para compartilhar com vocês. ― Nos sentamos nas poltronas de frente para o Rei. Ele estava com uma manta sobre as pernas embora não estivesse frio. Me perguntei se ele não estava levemente febril.

― O que é? ― Perguntou Karim.

― Aziz vai casar novamente. ― Até então não sabíamos o que isso queria dizer. Franzimos o cenho esperando que a notícia fosse dada por completo.

― Com Alisha. Ele vai se casar novamente e com sua ex-noiva, Karim. ― De todas as pessoas que ele poderia se juntar, tinha que ser a ex-noiva de Karim a fazer parte da família do Rei? Engoli em seco fechando a mão em punho.

― Ela está fazendo isso para se vingar junto dele. ― Disse Karim. Amir concordou.

― Os clãs apoiam o casamento. Acham que a família ficará mais forte. Contudo, há aqueles que na surdina…

― Apoiam o meu tio. ― Amir concordou com a cabeça.

― E acham que o herdeiro dos Eid secundários, já que somos os principais, seriam mais vantajosos e bem quistos no poder…

― Do que o meu filho. ― Completou Karim.

Eu não tinha palavras para completar.

― E os Al Kaen concordaram com esse casamento mesmo tendo recebido o hotel Jalila? ― Amir concordou parecendo muito cansado daqueles problemas da realeza.

― Eles querem a filha casada, mesmo que seja com um homem que já deu mostras de que baterá na filha deles. ― Eu não conseguia conceber aquilo! Quem em sã consciência dá a filha para um homem ardiloso como Aziz?

― Precisamos pensar num plano para trazer os possíveis rebeldes para o nosso lado, Karim. ― Disse Amir completando nossa linha de pensamento.

― Descubra quem tem apoiado o seu tio na surdina e descubra também os podres deles. Sei que você é capaz disso. Assim, você será capaz de manter todos eles sobre sua rédea. E você é ótimo domando cavalos rebeldes. ― Disse Amir fazendo uma piada e rindo da própria piada, tossindo em seguida.

Felizmente, foi o suficiente para rirmos também, amenizando o clima ruim que havia se instalado.

― Temos uma notícia para dá-lo também, baba. ― Disse Karim.

― O que é?

― Nosso filho… ― Comecei.

― É um menino. ― Terminou Karim sorrindo bastante. ― Vamos o chamar de Omar. ― E melhorando o clima mil e uma vezes, Amir abriu um largo sorriso sem acreditar no que falávamos, os olhos já inundando de lágrimas retidas.

― Vocês… Estão falando sério?

― Seríssimo, baba. ― Karim também sorria muito.

― Não… Não estão falando isso para amenizar o clima ou para me deixar feliz no fim da vida, não? ― Nós dois negamos com a cabeça, os olhos também cheios de lágrimas que não saíam.

Para nossa surpresa, Amir começou a rir e chorar e tossir ao mesmo tempo, exultante de alegria. Estendeu as mãos para os céus e proferiu:

― Por Alá! Posso finalmente descansar em paz, estou feliz! ― E emocionados, nos levantamos para abraçar Amir.

― Você ainda precisa ensinar muita coisa para o Omar, pai. Não pode ir agora. ― Amir concordou, muito embora não parecesse mais presente conosco.

― Eu estou tão feliz! Omar! Meu filho… Uma homenagem para o seu irmão! ― Karim concordou com a cabeça segurando as lágrimas.

Ele ainda não havia contado para o pai como Omar tinha morrido. Temia que um clã importante rompesse laços com a família real se o pai soubesse. Certamente, ele pediria por vingança. Mesmo que o pai dele pudesse desconfiar, Karim nunca confirmou a versão verdadeira da história. No fim, para O Rei, o filho havia morrido num infeliz acidente, batendo a cabeça e durante o mar revolto não conseguindo se salvar. Ainda assim, fosse qual fosse a versão dos fatos, nada conseguia diminuir a dor que ele sentia de ter perdido um filho.

Já doía-lhe a perda da esposa que o fizera não se casar mesmo depois de tantos anos do seu falecimento. Agora, a morte de Omar devia lhe doer ainda mais.

― Omar ficaria muito feliz com essa homenagem.

― Eu sei. ― Respondeu Karim assentindo.

Ele também tinha um carinho enorme pelo irmão que o havia tornado o que ele era. Acho que Karim não teria mudado tanto se não tivesse passado por coisas tão terríveis. E eu sei, porque estava próxima dele, o quanto isso foi vital para sua mudança. Ter que carregar responsabilidades até então nunca imagináveis.

― Me escute, Karim. ― Disse o pai dele depois de alguns minutos de comemoração. Nos sentamos ao pé do Rei esperando que ele dissesse o que queria.

― Alguns muçulmanos, principalmente os mais velhos, ainda tem muitos problemas com casamentos entre etnias, nacionalidades diferentes. Mesmo se esse casal, como vocês, professa a mesma religião. Eles são arcaicos, esqueceram de matar essas ideias ou, pelo menos, de morrer logo com elas e continuam as propagando pelo mundo afora. ― Começou Amir a discursar.

― Mas há uma coisa que consegue superar qualquer crise, qualquer discurso enfadonho desses velhos e até mesmo os olhares incrédulos de muitos do povo. É uma coisa que sua mãe me ensinou e eu quero passar para você, meu filho. ― Karim concordou. Não tivera a honra de conhecer a sua mãe, mas saber que o pai lhe passaria um ensinamento da mãe lhe fazia redobrar a atenção, ao que eu via e ele ouvia.

Amir demorou alguns segundos antes de falar enfaticamente:

― Amor.

Alguns segundos de silêncio se fizeram presente enquanto Amir deixava uma lágrima boba irromper dos olhos e alcançar as bochechas enquanto se lembrava da antiga Rainha. Meus olhos também encheram de lágrimas enquanto ouvia tudo com o coração constrito de alegria.

― O Amor consegue vencer qualquer barreira, Karim. Mostre o amor que você tem pela sua esposa para o povo e para esses velhos e Alá, que abençoa todos os seus filhos, abrirá até as portas e janelas de bençãos para vocês. E você verá, que poderá vir qualquer tempestade, qualquer problema, qualquer crise que for, mas que você, junto da sua linda esposa, conseguirão passar por qualquer coisa, ultrapassarão todos os limites e serão amados pelo povo na mesma proporção que irradiam amor. Sua mãe foi muito boa nisso. Foi por isso que fui apoiado pelo povo quando não quis me casar novamente. Não havia um que não lembrasse dela com amor e carinho. Lembre-se das palavras do seu pai, Karim. Ou melhor, lembre-se dos ensinamentos que o seu velho pai aprendeu com a sua mãe, e ame. ― E dito isso, Amir apertou um lábio sobre o outro se controlando para não chorar mais.

Karim abraçou o pai quase que imediatamente soltando lágrimas de profunda dor. Era um momento íntimo e lágrimas também queriam escapar dos meus olhos.

― Obrigado pai. Eu as guardarei no meu coração. Pode ter certeza. ― E Karim limpou as lágrimas com uma mão enquanto continuava. ― Obrigado pelas sábias palavras.

Mais alguns minutos de silêncio e dor. Quando Amir voltou a falar, as lágrimas já não eram tantas.

― Eu fico feliz, meu filho.

― Agora descanse, pai. Precisamos continuar com algumas lições a mais amanhã.

Para minha surpresa, Amir balançou a cabeça em negativa.

― Você já está pronto, Karim. Não há mais lições que você precise aprender. Essa foi a sua última lição. ― Karim arregalou os olhos assustado com aquela confissão.

― Última lição?

― E é a mais importante. Lembre-se de amar. ― Disse Amir sorrindo bastante antes de começar a tossir novamente. ― Agora deixe o seu velho descansar. Dê-me um abraço aqui. ― E Karim, ainda surpreso, se aproximou do pai e aceitou o abraço. Vi que os olhos dele ainda estavam esbugalhados, mas me retive em Amir que falava: ― Eu te amo, Karim. Te amo demais. ― E Karim concordou ainda absorto nas ideias.

― Obrigado por existir, Karen. ― Ele disse me dando um abraço desajeitado também. ― Amo você e Omar também. ― E eu concordei deixando que as lágrimas escapassem.

― Amanhã então eu venho te ver. ― Disse Karim ainda sem ação com as últimas palavras do pai.

― Se Deus quiser. ― Foi o que Amir se limitou a responder.

Todavia, aquela noite foi a última noite de Amir na Terra. Talvez ele realmente estivesse febril, talvez fosse o alívio de saber o sexo do neto e o nome dele. Talvez fosse ter passado a última lição e a mais valiosa para Karim. Eu não sabia qual poderia ter sido o motivo, se é que não foi uma mistura dos três, mas a verdade é que Amir não acordou depois daquela noite.

Ele havia sido levado por Deus para o descanso eterno.

Não houve dia, mas houve despedidas, diferente do que Karim teve com o irmão. Ainda assim, não deixou de ser tão doloroso quanto descobrir que, de um dia para o outro, o seu pai havia morrido e você, em pouco tempo, seria proclamado Rei de Omã.

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