O carro deslizava pela estrada silenciosa da madrugada, mas dentro dele o barulho era ensurdecedor. Não vinha do motor, nem dos pneus contra o asfalto úmido. Era o barulho dentro da cabeça de Fernando.
As palavras de Bianca martelavam sem parar, afiadas como lâminas:
“Valentina não é sua filha.”
Ele tentou respirar fundo, mas o ar parecia não entrar nos pulmões. O peito doía, como se alguém tivesse cravado uma faca em seu coração e a girasse sem piedade.
Agora tudo fazia sentido. O desespero dela em se recusar ao teste de DNA, o jeito feroz com que sempre desviava o assunto, a raiva que explodia toda vez que ele tocava nesse ponto. Ela não estava apenas se defendendo… estava escondendo a verdade.
— Meu Deus… — murmurou, a voz embargada, os olhos fixos na estrada sem realmente enxergar nada.
Valentina não era dele.
A frase se repetia em sua mente como um eco cruel. A cada repetição, parecia que uma parte dele se desfazia. A lembrança da menininha correndo para seus braços, chamando-o de “pai” com aquele sorriso puro, agora o esmagava com ainda mais força. E se tudo isso fosse uma mentira?
Fernando levou uma das mãos ao rosto, esfregando-o com violência. Queria arrancar aquela dor, queria acordar e descobrir que tudo não passava de um pesadelo. Mas não era. Era real.
As ruas passavam rápidas pelas janelas, mas ele não se sentia em movimento. Sentia-se preso em um túnel escuro, sem saída.
Fernando bateu o punho no volante com força, o impacto seco ecoando dentro do carro.
— Malditos! — rugiu, a voz rouca, quebrada.
Por um instante, teve que reduzir a velocidade, porque as lágrimas turvaram sua visão. Ele odiava chorar, odiava se sentir fraco, mas naquele momento não conseguiu conter. Uma dor tão funda que parecia arrancar sua alma do corpo tomou conta dele.
Recordou-se da primeira vez que pegou Valentina no colo. Tão pequena, tão frágil. O coração dele havia se derretido, e, naquele instante, acreditou que nada jamais poderia abalar aquele vínculo. Mas agora… agora tudo parecia uma farsa.
Eu a amo como filha, mas não é minha. Nunca foi.
O pensamento foi uma punhalada ainda mais cruel.
O telefone sobre o banco ao lado vibrou de repente, quebrando o silêncio. Ele olhou de relance: o nome de Paola iluminava a tela. Não atendeu. Não tinha forças para falar com ninguém.
Seguiu em frente, os olhos vermelhos, a mente em colapso. Dentro dele, algo começava a morrer: a esperança, a fé em Bianca, até mesmo o sentido do que restava do casamento destruído.
Agora, tudo estava claro. Ela nunca quis o teste porque tinha medo da verdade. E ele, idiota, se agarrou à dúvida como se fosse uma tábua de salvação.
Mas não havia mais dúvida.
— Filho, isso não vai resolver nada. Beber só vai te deixar com uma baita ressaca amanhã.
Fernando soltou uma risada amarga, o som de alguém que já não acreditava em consolo.
— Eu sei, mãe… sei muito bem. — levantou o copo e olhou para o líquido âmbar como se fosse a única resposta possível. — Mas depois do que ouvi de Bianca essa noite… é a única coisa que eu quero. Beber, até não sentir mais nada. Até entorpecer essa dor que está me matando por dentro.
Célia caminhou até ele e se sentou ao seu lado, passando a mão carinhosamente em seus cabelos, como fazia quando ele era apenas um menino.
— Você acha mesmo que fugir da dor vai te trazer respostas? — perguntou, suave.
— Será que não é melhor conversar? Encarar de frente?
Fernando virou-se para ela, os olhos vermelhos, úmidos, uma expressão quebrada que raramente deixava alguém ver.
— Conversar? — riu sem humor. — Não há mais nada para conversar. Ela mesma confirmou, mãe. Disse com todas as letras… — a voz falhou, e ele precisou de um gole de coragem no copo antes de continuar.
— Bianca disse que Valentina não é minha filha. É filha de Rodrigo, o que significa que ela realmente tinha um caso com ele.

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