YANKA
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A pior coisa que existe em um relacionamento não é a traição, nem a ausência, nem o silêncio.
É a falta de confiança.
Sem ela, tudo desanda, a base racha, o chão desaparece, e a gente passa a caminhar sobre os próprios cacos, como se pisar em dor fizesse parte da rotina.
Como é que eu poderia confiar em alguém que já tinha me ferido de tantas formas?
Alguém que, muito provavelmente, ainda carregava sentimentos mal resolvidos pela ex?
As palavras que o Rodrigo disse pra Melissa ficaram ecoando na minha mente por todo o caminho enquanto eu dirigia.
Aquela entonação na voz dele quando falou do noivado dela com o Diego, aquilo não foi indiferença, aquilo soou como frustração.
Como se a notícia tivesse atingido em cheio o orgulho dele e ele estivesse tentando engolir o grito.
E eu lá.
Com cara de quê? De palhaça, ouvindo tudo.
O que, exatamente, estava acontecendo? Em que merda eu tinha me enfiado?
A frase que ele deixou antes de ir embora me corroía por dentro. "Eu vou tentar."
Tentar o quê, exatamente?
Tentar me enganar mais uma vez? Tentar lidar com o fato de que a ex estava noiva? Ou tentar sustentar a mentira que me contou?
Porque, se fosse pra tentar fazer aquela porra funcionar entre a gente... ele teria começado sendo honesto.
E enquanto eu dirigia com as mãos trêmulas e os olhos molhados, só conseguia pensar que ele sequer teve a decência de me avisar que ia lá.
Se não tivesse nenhuma intenção com ela, se realmente tivesse deixado aquilo no passado, como me jurou, teria dito.
Era simples, era só falar...
“Yanka, preciso ver a Melissa, encerrar esse capítulo.”
Mas não.
Preferiu fazer tudo às escondidas, como quem sabe que está errado.
Como quem ainda guarda um sentimento que não quer que a atual descubra.
E eu? A idiota de sempre. A que ama demais. A que finge que vai embora, mas sempre volta.
Estacionei o carro na orla, eu precisava respirar e sentir a areia nos pés, o vento no rosto.
Deixei que o sal do mar lavasse um pouco da amargura grudada na alma.
Foi quando me lembrei do Matheus...
Daquele discurso estranho que ele fez quando nos conhecemos.
"Tem dias que eu tô assim também. Daí eu afogo minhas tristezas no mar."
"Talvez você precise fazer como eu: afogar as tristezas no mar, e não enterrar na areia."
"Na areia, você sabe onde enterrou e corre o risco de desenterrar tudo. Mas no mar... ou a correnteza leva embora, ou você aprende a surfar no problema."
A teoria dele era boa. Mas a prática?
Matheus: Sim. Eu aproveitei minha condição de solteiro.
— E você ainda ADMITE?
Matheus: Eu jamais mentiria pra você. Tô sendo o mais realista possível.
— Realista? Você quer um prêmio por isso? Um troféu “Pau no Coração”?
Era difícil, Matheus? Era mesmo tão difícil deixar o pau dentro da calça por seis meses? Manter a língua quietinha no caralho da boca e não sair distribuindo beijos por aí?
Matheus: O que eu preciso fazer pra você me dar outra chance?
Eu ia responder, de verdade. A resposta estava quase saindo, cheia de dor e sarcasmo.
Mas congelei.
Porque, naquele momento, meus olhos flagraram uma cena que tirou todo o ar do meu peito.
O carro do Rodrigo estacionou ao lado do meu.
Ele desceu devagar, e eu juro, parecia cena de filme. Tudo em câmera lenta.
O rosto dele sério, os olhos fixos em mim e depois no Matheus. E cada passo que ele dava na nossa direção era uma sentença.
O Matheus percebeu, virou o rosto e cerrou a mandíbula.
E eu?
Eu só conseguia pensar...fodeu.
Porque eu conhecia o histórico dos dois. Sabia das brigas, das mágoas, do ódio recíproco.
E tudo o que eu menos queria era reviver aquela guerra... justo quando eu nem sabia mais de que lado eu estava lutando.

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