Deus ouviu minhas preces.
Já faz mais de duas semanas que não encontro o príncipe e isso é um alívio. Ainda mais porque Ag insiste que eu vá em alguns chás beneficentes, encontros com senhoras ricas que discutem onde investir o dinheiro, orfanatos, até mesmo “A Casa”, como é chamado o espaço que Fer cuida com tanto carinho e amor.
Ag coitada, tem uma lista gigantesca de coisas para fazer. Mas continua sendo um amor de pessoa e o amor dela e de Seth são o que me mantém mais fiel em Deus, pois sei que um dia ele também me dará um relacionamento com alguém da minha fé da mesma forma que Seth encontrou em Agnes. Ainda que Agnes não seja muçulmana. Mas ela respeita muito e não deixa de ir na mesquita com Seth conhecendo um pouco mais. Ninguém força ninguém a nada. Um dia Deus tocará o coração de Agnes e ela também professará o islamismo. Eu ao menos oro todo dia a Deus pedindo por isso. Agnes é a minha melhor amiga. Quero somente o melhor para ela.
Agnes me tirou do meu encargo oficial da mansão e me transferiu para outro que ela acredita ser melhor. Diante da quantidade de festas, chás e coisas do tipo que ela vem vindo, Ag achou melhor que eu me dedicasse única e exclusivamente em desenhar e fazer peças para ela para essas ocasiões. Não que eu não tenha amado! Amei! Assim eu posso me dedicar ao que mais gosto de fazer.
Hoje vou levar um vestido azul marinho para Agnes vestir. Ela insiste que eu a acompanhe num chá beneficente que haverá só entre mulheres. Não consigo negar nada para Agnes e aceito. Coloco um hijab básico, preto, porque a verdade é que quero ficar o mais invisível possível. Gosto de acompanhar Agnes, mas, para mim, é ela que deve brilhar em qualquer lugar que estejamos. Ela é especial e tem ideias fortes que tenho certeza de que vão mudar – e estão mudando – a forma de muitas pessoas agirem por aqui.
― Cheguei! ― Disse Fer. Íamos as três. Fer, na verdade, queria convencer as mulheres a ajudarem A Casa e esse era o motivo dela ir também. Mas Fer nunca se sentiu a vontade para se vestir como nós. O máximo que ela fazia era ficar um pouco mais formal, como estava agora, com uma calça social e uma blusa branca regata de botões muito bonita.
Não demoramos para sair. No entanto, eu mentiria se dissesse que o chá beneficente era algo legal e divertido. Na maioria das vezes as mulheres aproveitavam para jogar fofoca para o alto e falar mal de outras mulheres. Somente deram uma pausa quando ouviram Fer falar.
― Gostaria de um minuto da atenção de vocês, por favor. Tenho alguns dados para apresentar que farão vocês pensarem um pouco sobre a importância de ajudar A Casa. ― Disse Fer. Ela era uma ótima oradora, do tipo que um dia eu gostaria de ser. Ela não tinha medo de falar em público, não tinha medo do que pensariam dela. Na verdade, parecia calejada que a julgassem, mas era nítido que isso pouco importava para ela. Seu foco era um só: As crianças da Casa. E ver isso na forma como os olhos dela brilhavam, no semblante sério na hora de falar e apresentar dados era maravilhoso.
― Segundo o Instituto… ― E Fer começou a falar. Disse as taxas alarmantes de meninas que eram obrigadas a se prostituir por não terem família com quem contar, bem como a quantidade de meninos que saiam do país para participar de grupos radicais, já que era a única opção diante da falta de amparo. Os dados eram alarmantes, as idades mais assustadoras e eu não consegui piscar um momento sequer absorvendo todas as informações que Fer trazia. Ela tinha um poder de convencimento que era de outro mundo! E a forma como ela falava era tão segura que eu só conseguia pensar em como as mulheres precisavam ajudar A Casa.
Felizmente, algumas foram convencidas. Outras, disseram que iam pensar no caso. Fer teve que ir embora para não deixar seus filhos muito tempo sozinhos e as mulheres ali mais pareciam preocupadas em ouvir fofocas do que realmente ajudarem alguém. Triste, mas a realidade.
― Estão bem próximos de se casarem mesmo. Mas não vai demorar também não para o mais novo casar. ― Estava tão distraída que nem fazia ideia do que elas falavam, só ouvindo por educação, porque o assunto pouco me interessava.
― Oh, é mesmo? E com quem será? ― Perguntou uma outra mulher mais gordinha de hijab preto como o meu e os olhos bem pintados de negro.
― Obviamente que o príncipe precisará casar com alguém a altura dele, como Omar. Por sorte, a futura rainha Aisha tem uma irmã. ― Segredou a mesma mulher de antes, essa que usava um lenço jogado de forma displicente pelo cabelo. Provavelmente porque ali estávamos só entre mulheres.
― Mas dará certo? ― Instintivamente, ouvir sobre o príncipe me fez prestar atenção em quem estava falando o que naquela conversa. Dessa vez, uma jovem mais ou menos da minha idade fazia a pergunta. Mas era visível no seu tom de voz que ela torcia para que não desse certo, porque ela tinha interesse no príncipe.
Se ela soubesse com quem estava lidando, não quereria nunca mais olhar para a cara daquele cafajeste. Me vi pensando.
― Oras, terá que dar. Por que pergunta isso Ashanti? ― Acho que foi a mãe dela que chamou a atenção da filha, porque a menina voltou seus olhos para o chão parecendo envergonhada.
― Eu imagino que é porque os dois irmãos são muito diferentes. ― Voltou a falar a mulher com lenço jogado na cabeça. ― Omar será um verdadeiro rei. Seu irmão… Os boatos não são muito bons. O melhor é deixar nossas filhas longe dele. Há boatos… ― Ela pausou estalando a língua como se tivesse a maior das fofocas de todas. Havia um pequeno sorriso no canto dos lábios, mas o silêncio dela provocou agitação nas mulheres, ansiosas.
― Oras, mas que boatos? Conte logo Shadia! ― Disse a mãe da menina. Agora eu sabia o nome da mulher com véu jogado displicentemente.
― Conte logo! ― Disse outra e mais outra ao mesmo tempo.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: O Príncipe do Oriente