— Você devia deitar um pouco — Lyra sugeriu, aparecendo ao lado dele já no fim do dia, quando o sol batia de lado no pátio e alongava sombras.
— Se eu deitar, não levanto.
— Eu te levanto — ela retrucou, simples, e sorriu de canto. — A gente teve uma filha juntos, lembra? Já te levantei de coisa pior.
Ele riu sem som, deixou a cabeça cair um instante no ombro dela, só pra sentir o cheiro.
— Eu matei o mensageiro — confessou, como se ela não soubesse. — E isso foi certo e errado ao mesmo tempo.
— Foi você — Lyra disse. — E você é isso: amor violento e justiça imediata. Se Atlas ficar mais furioso por causa disso, problema dele, a gente fica mais atento.
Ele assentiu, agradecido por aquela tradução de quem ele era, e por um segundo quis contar que pressentia algo fora do plano, uma maré atravessando as defesas, não de Atlas, mas de casa. Engoliu. Não era hora de dividir mais um peso.
— Quando der nove, fecho os portões pequenos — ele avisou. — Só fica a passagem do leste com sentinela dupla. E, Lyra… — olhou sério — sem heroísmos.
— Eu? — Ela ergueu uma sobrancelha, teatral. — Nunca.
Ele sorriu daquele jeito que dizia “eu te amo” e foi.
Lyra ficou um instante parada, depois girou nos calcanhares e sumiu pelo corredor que levava à cozinha. A essa altura o sol começava a se por e o céu começou a perder azul e ganhar roxo.
No quarto de Lua, o trio já estava pronto, jaquetas escuras por cima das roupas, para confundir com sombra; botas amarradas; pacotes divididos entre as mochilas. Lua prendeu o cabelo branco num nó baixo e cobriu com um capuz. A cada minuto que passava, o chamado que sentia por dentro crescia. Era quase físico, uma espécie de saudade de algo que ela não teve.
Estavam prestes a falar alguma coisa quando a porta rangeu baixinho e as três cabeças giraram na mesma hora. Só que era Lyra, que entrou com uma desculpa na ponta da lingua, fingindo que nã sabia o que eles estavam fazendo.
— Eu vim conferir se vocês já jantaram — disse, o olhar passeando pelo quarto e parando por um segundo a mais no canto da cama, sob o qual a mochila com as ervas e panos estava escondida. — Não quero ninguém passando mal na noite mais longa do mês.
— Eu como qualquer coisa — Tailon respondeu, educadíssimo, como se não estivesse prestes a acobertar e cometer uma grande atrocidade aos olhos do alfa e do beta seu pai.
Lyra deixou sobre a mesa uma sacola com pães, queijo e três maçãs. Beijou a testa de Lua, o topo da cabeça de Amber e de Tailon também, como se todos ainda fossem crianças, e não jovens adultos.
— Tranque a janela quando escurecer. O vento fica forte na lua cheia.
Lua sentiu o coração pular um passo. Ficou olhando a porta fechada por longos segundos.
— Ela sabe — Amber murmurou.
— Também acho… — Lua respondeu, meio rindo, meio querendo chorar. — Mas, se sabe, porque não disse nada?
River parou no meio do passo, o corpo todo em alerta. A cara endureceu, os olhos ficaram rubros na hora.
— Atlas — disse, rosnando baixo e voltando os olhos para Solomon.
No túnel, o som chegou abafado, mas chegou. Lua estremeceu de cima a baixo, Amber apertou a mão dela sem perceber e Tailon virou o rosto, os ouvidos apurados.
— Ele tá perto — Amber sussurrou, o rosto pálido. — Lua, a gente…
— Não dá mais pra voltar — Lua cortou, a decisão já pronta, não por coragem, mas por inevitável. — A gente já tá aqui, talvez, se formos, conseguimos encontrar ele antes que Caleb se enfie no meio dessa briga também.
Os três se encararam naquele clarão de medo que, às vezes, parece coragem pura. Tailon assentiu.
— Mais rápido então — disse, e puxou as duas.
Acima, no corredor de serviço, Lyra fechou os olhos por um segundo e, sem som, fez sua própria prece:
“Deusa, proteja minhas crianças e meu povo!”

Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Rejeitada: A Luna do Alfa supremo
Excelente pena que nao tem o livro impresso....
Muito bom! Livro excelente! História bem amarrada! Estou quase no final! Recomendo!...