A Lua Sangrenta dormia em silêncio.
Lá fora, o vento passava entre as copas das árvores, trazendo o cheiro da chuva distante e do metal fresco das armas recém-afiadas. A maioria dos lobos já havia se recolhido, preparando-se para a vigília da madrugada e para a guerra que viria, mas Petra ainda estava acordada.
Caminhava rápido pelos corredores de pedra, o rádio preso ao cinto, o casaco jogado sobre os ombros. O som dos próprios passos era a única coisa que quebrava o silêncio do abrigo. Quando passou pela porta da enfermaria, olhou de relance: River dormia, exausto, e dois curandeiros vigiavam o quarto em silêncio.
Ela desviou o olhar e continuou até a saída lateral, onde Renee já a esperava, o capuz cobrindo metade do rosto, o manto preso por uma faixa de couro escuro.
— Por aqui — Petra disse, sem parar de andar.
As duas atravessaram o pátio vazio e seguiram até uma pequena casa um pouco mais distante da mansão, um chalé de madeira cercado por pinheiros, com um jardim bem cuidado, as luzes estavam apagadas. Petra abriu a porta e deixou a raposa entrar primeiro.
— Essa é sua casa? Achei que morasse na mansão principal — Renee perguntou, olhando em volta.
— É sim, aqui podemos escolher uma casa da vila quando nos casamos ou precisamos de mais espaço, não quis ficar na casa central depois que me uni com Solomon — Petra acendeu uma lâmpada na parede. — E é aqui que ninguém vai ouvir a gente.
O interior era simples: uma mesa, duas cadeiras, uma lareira apagada e pilhas de relatórios espalhadas sobre o balcão, flores na janela, um tapete no chão, tudo delicado e bem arrumado. Petra afastou uma pilha de papéis e serviu café em duas canecas.
— Pode falar — Renee disse, sentando-se. — O que está acontecendo?
Petra segurou a caneca com as duas mãos, mas não bebeu. Ficou em silêncio por alguns segundos, até que o olhar firme da raposa a forçou a falar.
— Eu sabia. — Ela soltou, de repente. — Eu sabia que a Lyra estava desaparecida antes do Alfa.
Renee não reagiu de imediato, apenas esperou.
— Quando senti a ligação quebrando, eu soube. — Petra continuou. — Mas ela me mandou focar em cuidar de Lua, disse que iria se virar.
— Ela mandou? — Renee perguntou, arqueando uma sobrancelha. — Mesmo sabendo o risco?
Petra assentiu, os dedos tamborilando na borda da caneca.
— A Lyra sabia que River não aguentaria mais um golpe, o corpo dele ainda tá fraco. Se ele soubesse que ela foi levada, ia sair daqui sozinho, e aí Atlas teria o que quer.
— Então foi ele. — A voz de Renee ficou mais baixa. — Atlas.
— Foi. — Petra respondeu, sem hesitar. — Mas não foi uma emboscada simples, ele usou a filha deles como isca. Chamou o nome da Lyra com a voz de Lua de dentro da floresta, e a Lyra caiu na armadilha achando que era a garota. Quando me avisou, já era tarde demais.
Renee encostou as costas na cadeira, absorvendo as palavras.
— E você acredita mesmo que ela ainda está viva?
Petra levantou o olhar, firme.
— Acredito, minha amiga é forte, a loba mais forte que já conheci, vai se virar.
O silêncio se estendeu entre as duas, lá fora, um trovão distante fez a janela tremer. Renee observou a loba com atenção, havia determinação no olhar dela, mas também cansaço, culpa e algo mais profundo: medo de falhar.
— Então o que você quer de mim, Petra? — perguntou, finalmente. — Por que me trouxe aqui?
Petra respirou fundo e respondeu:
— Porque eu não consigo fazer isso sozinha.
Renee inclinou a cabeça.
— “Isso”?
— Proteger todos, principalmente Lua. — Petra passou as mãos pelos cabelos, nervosa. — O Alfa tá instável, a Lua quer ir pra guerra, e Atlas tá movendo peças demais. Eu... preciso de ajuda.
Renee apoiou os cotovelos na mesa.
— Do que você precisa?
Petra piscou, surpresa.
— Vai me ajudar?
— Vou. — Renee se aproximou de novo, parando diante dela. — Precisamos proteger a menina, se posso fazer algo para evitar que aquele mnstro coloque as mãos nela, então irei me dispor.
Petra estendeu a mão.
— Então estamos combinadas?
Renee segurou.
— Combinadas.
***
Mais tarde, quando Renee saiu da casa, a lua cheia iluminava o pátio e os telhados molhados. Ela parou por um instante, sentindo o vento frio bater no rosto. Sabia que o que estavam prestes a fazer era arriscado, talvez até proibido, mas alguma coisa dentro dela dizia que era o caminho certo.
Do lado de dentro, Petra apagou as luzes e ficou parada no escuro, olhando pela janela. O rádio no balcão chiou, uma voz qualquer pedindo atualizações das rondas, ela ignorou.
Pegou o colar que Lyra havia dado a ela anos atrás, uma pequena lua de prata presa a uma corrente fina, e o apertou entre os dedos.
— Confio em você, Lyra... — sussurrou. — Vamos proteger sua menina.
O vento soprou de novo, e o som lembrou um sussurro feminino vindo da floresta. Por um instante, Petra jurou ouvir a voz da amiga respondendo, lá longe, em algum lugar.
"Obrigada."
Ela fechou os olhos, o coração acelerado.
A guerra ainda não tinha começado, mas o pacto entre loba e raposa já estava selado.

Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Rejeitada: A Luna do Alfa supremo
Excelente pena que nao tem o livro impresso....
Muito bom! Livro excelente! História bem amarrada! Estou quase no final! Recomendo!...