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A Babá Virgem e o Viúvo que Não Sabia Amar romance Capítulo 124

O almoço na varanda da fazenda era um quadro vivo de paz, calor e sabor. A mesa de madeira rústica estava coberta por uma toalha bordada à mão, herança de família que Flora fazia questão de usar em ocasiões especiais. O aroma de comida caseira, frango caipira dourado na panela de ferro, arroz soltinho com ervas do quintal, legumes assados e farofa crocante, invadia o ar, misturando-se ao perfume das flores do campo espalhadas em pequenos jarros de vidro. Havia também limonada fresca em uma suqueira antiga e uma torta de maçã fumegante que anunciava, desde já, o prazer da sobremesa.

Aurora, sentada entre Isabella e Lorenzo, era pura luz. Vestia um vestido florido, salpicado de margaridas miúdas, que balançava levemente com o vento. Sua voz era uma melodia infantil que enchia o ambiente de alegria. Contava animadamente sobre sua manhã tentando colher ovos e correr atrás das “galinhas super-rápidas que, segundo ela, usavam patins invisíveis”. Flora ria alto, com a cabeça inclinada para trás, enquanto Isabella sorria com os olhos e o coração.

Mas Lorenzo… Lorenzo estava calado.

Sentado à cabeceira, ele observava Isabella em silêncio. Cada pequeno gesto dela parecia gravado em sua retina, o modo como cortava o pão para Aurora com delicadeza, como se certificava de que a menina tinha tudo ao alcance das mãos, o jeito como ajeitava uma mecha de cabelo atrás da orelha sem perceber. Havia uma leveza em cada movimento, uma ternura que o desconcertava.

O problema era que agora, ele enxergava. E tudo o que via… doía.

Isabella sentiu o peso daquele olhar. Tentou manter os olhos nos talheres, no prato, nas flores, mas era impossível. Sempre que levantava o rosto, o encontrava ali. Lorenzo, com seus olhos azuis escuros como mar de inverno, olhando para ela como se estivesse diante de algo que perdeu e não sabia como recuperar. Não havia mais frieza, não havia mais distância. O que queimava nos olhos dele era arrependido, ao mesmo tempo desejo.

Flora, percebendo o clima carregado, decidiu intervir com um de seus comentários espirituosos:

— Aurora, minha flor, você já virou celebridade no galinheiro. A Gilda cacarejou até agora, ainda indignada porque você tentou montar nela como um pônei.

Aurora gargalhou alto. Isabella também riu, aliviada pela quebra da tensão. Mas Lorenzo… permaneceu sério, observando o riso de Isabella como se fosse, ao mesmo tempo, punhal e remédio.

Logo depois do almoço, James apareceu montado num pônei castanho de olhar doce, crina macia e passos suaves. Aurora gritou de alegria e correu na direção dele:

— Papai! Olha! Esse é o Pingo! E ele é meu amigo!

Lorenzo se forçou a sorrir, apesar do nó no peito. Lembrava perfeitamente da frase que a filha dissera pela manhã enquanto brincava com Isabella:

“O tio James também gosta da tia Isa, papai…”

James o encarou com um olhar firme, sem disfarces. E Lorenzo, mesmo sem querer, também o avaliava sentindo o sangue ferver. A ideia de outro homem desejando Isabella mexia com ele de um jeito que o deixava quase irracional.

— Vai lá, minha princesa — disse Lorenzo, com a voz contida. — O papai está aqui para ver.

Isabella ajudou Aurora a colocar o capacete com gestos suaves. Quando James a ergueu com cuidado e a colocou no dorso do pônei, Lorenzo permaneceu imóvel, de braços cruzados, observando tudo. Mas por dentro, o chão já começava a se desfazer.

Ver Isabella ao lado da filha, orientando, sorrindo, protegendo… doía. Porque ela já fazia parte daquilo. Da vida deles. Do que poderia ter sido, do que talvez ainda pudesse ser, se ele tivesse coragem.

Mais tarde, com o sol começando a se curvar no céu, os três seguiram com uma cesta até o riacho da fazenda. Flora preparou frutas frescas, pães amanteigados e suco de goiaba gelado. O lugar era um pedaço de paraíso. Água cristalina correndo entre pedras lisas, libélulas cortando o ar em ziguezague e sombras frescas formadas por árvores altas e silenciosas.

Aurora tirou as botinhas e correu até a margem. Quando escorregou de leve, Lorenzo correu e a levantou no colo, rindo. Ela agarrou o pescoço dele e o beijou na bochecha.

— Tô voando, papai!

Isabella estendeu uma toalha xadrez sobre a grama e começou a organizar o lanche. A cena era tão perfeita que doía nos olhos. Aurora fazia perguntas sem parar:

— Papai, você já pescou peixe com a mão? E você, tia Isa… já nadou pelada no rio?

Isabella se engasgou com a maçã. Lorenzo gargalhou alto, encostando as mãos nos joelhos, rindo de um jeito que há muito não ria. E naquele instante, tudo pareceu certo.

Depois do lanche, Aurora colheu flores, rodopiou, riu, cantou… até que, cansada, caiu no colo de Isabella adormecendo ali, abraçada à cintura da babá, com os cabelos dourados esparramados. Lorenzo ficou olhando para as duas em silêncio, sem máscaras.

Naquela imagem… havia tudo. Tudo que ele temia ao mesmo tempo, tudo que desejava.

Ao cair da noite, Flora se recolheu.

Lorenzo ajudou Isabella a levar Aurora para o quarto. Ela murmurou um “papai” sonolento enquanto Lorenzo a deitava. Ele parou engolindo seco e sentindo o coração pesando. Sentiu que, se não falasse agora, perderia mais do que já tinha perdido.

Os dois já estavam no corredor, quando ele parou diante de Isabella.

— Podemos conversar?

Ela hesitou, mas assentiu.

— Vamos.

Saíram pela porta lateral e caminharam lentamente pelo campo. A noite estava silenciosa, com o céu vestido de estrelas e a lua cheia brilhando como um farol sobre o mundo. O cheiro de terra molhada, o sussurro do vento, o som distante da água no riacho. Tudo conspirava para um momento que não podia mais ser adiado.

Lorenzo caminhava com as mãos nos bolsos, tenso. Ele agora usava uma camisa branca de linho, com as mangas dobradas até os cotovelos, revelando os antebraços fortes. A calça jeans escura estava levemente empoeirada, sinal de que havia passado o dia na estrada e pela fazenda. Tudo nele parecia decomposto, menos os olhos, aqueles olhos profundos, que nunca haviam perdido a capacidade de atravessar Isabella por dentro.

Isabella caminhava em silêncio, com os braços cruzados sobre o corpo como se quisesse se proteger dele e de si mesma. A lua refletia em seus cabelos, criando um brilho dourado, e cada passo leve fazia a bainha do vestido de algodão branco roçar suas pernas.

Quando chegaram perto do riacho, Lorenzo parou. Por um instante, apenas ficou olhando a água correr, como se procurasse ali uma resposta para tudo o que estava engasgado em sua garganta.

— Isabella… — sua voz quebrou o silêncio, rouca e densa.

— O que foi, Lorenzo?

Ele respirou fundo, com os olhos fixos nela, como se estivesse pronto para atravessar uma muralha.

— Eu… não sou bom com palavras. Mas preciso dizer isso antes que você me odeie de vez.

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