O entardecer tingia a mansão Vellardi de dourado, derramando luz morna sobre os corredores silenciosos. As janelas refletiam tons de cobre, e as sombras dançavam pelas paredes como sussurros esquecidos.
Isabella fechou a porta do quarto de Aurora com cuidado, sentindo o coração leve ao olhar uma última vez para a menina adormecida. Ela dormia agarrada à nova boneca, Lila e à inseparável Cacau. A história da noite, lida com voz baixa e ritmo cadenciado, tinha cumprido seu papel como um feitiço suave.
Com os braços cruzados, Isabella começou a caminhar pelo corredor. Seus pés descalços tocavam o chão de madeira com leveza, e o silêncio ao redor parecia confortá-la.
Até que ouviu passos. Firmes, decididos e precisos.
Seu corpo enrijeceu. Ela conhecia aquele som. O compasso exato, o peso em cada passada.
Lorenzo.
O ar pareceu ficar mais denso, como se cada partícula carregasse eletricidade. Ela apertou o ritmo, mas não o suficiente para parecer que fugia. Não queria que ele tivesse esse poder sobre ela. Mas por dentro… o coração já batia rápido demais.
Ele não precisou correr. Bastaram poucos passos largos para alcançá-la.
— Parabéns — disse ele, com um tom carregado de ironia. — Conseguiu. A Aurora não desgruda mais de você.
Isabella parou.
Virou-se devagar, sustentando o olhar dele com firmeza. O rosto dela estava sereno, mas os olhos… os olhos verdes brilhavam com algo mais.
— Isso soa como um problema para você? — devolveu, com voz doce e afiada como navalha.
— Soa como um aviso. — Lorenzo deu um passo adiante. — Você está indo longe demais.
— Estou fazendo meu trabalho. — Ela manteve o tom calmo. — E cuidando da sua filha como ninguém nesta casa fez nos últimos três anos.
Ele semicerrou os olhos.
— Você não tem ideia do que fala.
— Tenho mais ideia do que gostaria — respondeu ela, firme. — Vejo isso todos os dias estampado no rosto dela. A solidão, a saudade da mãe, a ausência do pai.
Algo no olhar dele tremeu. Um músculo da sua mandíbula se contraiu.
— Cuidado, Isabella — advertiu ele, com a voz baixa, carregada de veneno. — Você está ultrapassando limites.
— E você acha que pode cuspir acusações e depois vir ditar regras?
— Eu sou o dono desta casa!
— E eu sou a mulher que sua filha ama — rebateu, sem desviar os olhos. — E isso te assusta, não é?
Um silêncio repentino caiu entre eles. Mas não era um silêncio qualquer. Era carregado, denso, perigoso.
Lorenzo a encarava como se a visse pela primeira vez. Os olhos azuis mergulhavam nos dela com intensidade sufocante. Era como se, naquele instante, a armadura dele tivesse rachado. E por trás dela… havia desejo.
O sol invadia o corredor por trás de Isabella, iluminando seus cabelos soltos com um brilho dourado. A respiração dela estava acelerada. O peito subia e descia devagar, mas com força. O rosto estava corado, pela raiva, sim, mas havia algo mais. Algo que queimava por baixo.
— Melhor não repetir o que fez, mocinha… — ele sussurrou, ainda mais próximo. — Ou vai se arrepender.
— Está me ameaçando…? — a voz dela saiu baixa, trêmula de tensão. — Ou… se ameaçando?
Ele parou.
Aquela resposta, aquela voz…
Fechou os olhos por um segundo, como se tivesse sido atingido. A respiração dele estava pesada, o cheiro da pele dela invadindo tudo. Por um segundo, ele se inclinou mais e ela acreditou que ele fosse beijá-la.
Mas ele se conteve e acabou recuando. Tirou as mãos da parede e deu dois passos para trás. O olhar ainda escuro, a respiração ainda irregular.
Ela ficou ali, colada à parede, com o peito arfando, e as mãos tremendo.
Lorenzo a encarou por mais um segundo. E sem dizer mais nada… virou-se e foi embora.
O som dos passos dele ecoaram pelo corredor como um fantasma. Isabella ainda sentia o toque dele na pele. A palma quente no braço, o corpo grande colado ao dela.
Levantou a mão devagar e a pousou sobre onde ele a havia tocado. Estava tremendo. Seu coração batia como se tentasse escapar pelas costelas. Aquilo… aquilo era mais do que provocação. Era algo que estava nascendo.
Algo perigoso. Algo que ela não sabia se poderia, ou queria, controlar.
E no fundo… tinha certeza de uma coisa: Ele também sentiu.

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