— Ela comentou algo com a senhora? — perguntou John, tentando conter a ansiedade que escapava na voz.
A mulher à sua frente, uma senhora de expressão terna e olhos entritecidos, suspirou fundo antes de responder.
— Disse apenas que precisava se ausentar para resolver alguns assuntos pessoais… e que não sabia quando voltaria. — Fez uma breve pausa, levando a mão ao peito. — Ah, como nossa querida Elizabeth faz falta…
A partir dali, as palavras escaparam de sua boca como uma enxurrada. A voz era doce, mas o tom carregado de saudade.
— As crianças da aula de música perguntam por ela toda semana. Já não é a mesma coisa sem as canções que ela ensinava. Os velhinhos do asilo... — sorriu melancolicamente — estão inconsoláveis. Um deles me disse ontem que a última vez que sorriu foi quando ela tocou *Clair de Lune* para eles. Sabia que ela doou o próprio piano? Um instrumento belíssimo... E fez isso sem alarde, como sempre. Generosa, silenciosa...
John permanecia em silêncio, ouvindo atentamente. A mulher continuou, agora com brilho nos olhos.
— Quando Elizabeth cantava nas missas, havia quem dissesse que parecia um anjo. E eu concordava. Sua voz preenchia a igreja de uma forma que nos fazia esquecer os problemas. Ela não apenas participava do coral… ela era o coração dele.
Cada palavra era como um golpe surdo. Em poucos minutos, John descobria mais sobre sua esposa do que em três longos anos de casado.
Durante todo aquele tempo, ele havia duvidado da sinceridade dela. Achava que os trabalhos voluntários eram apenas uma fachada, uma encenação para manter a imagem da “esposa perfeita”. Nunca imaginou que aquilo fosse parte de quem ela realmente era. Nunca quis ver.
Pela primeira vez, reconheceu: jamais lhe deu uma chance. Não quis conhecê-la. Preferiu julgá-la, encaixá-la no molde que mais lhe convinha, para ele era mais uma forma de chamar a atenção de uma suposta boa moça.
A senhora ainda falava, emocionada, mas a mente de John já estava em outro lugar.
Soube, então, que Elizabeth havia se despedido de todos duas semanas antes. Do coral. Das crianças. Dos idosos. Para todos, ela dissera apenas que precisava ir por um tempo. Nenhuma explicação além disso. No fundo, ela acreditava que resolveria a situação rapidamente, talvez voltasse em poucos dias. Mas nunca disse nada sobre o casamento.
Após a mulher terminar de falar, ele se despediu e ainda ouviu a mulher pedir:
— Mande um abraço em nome de todos e diga-lhe para voltar logo, pois estamos com saudades.
John apenas assentiu e deixou a igreja com passos lentos, como se carregasse o peso de todas aquelas revelações nos ombros. A conversa com o padre já o havia abalado, mas ouvir aquela mulher do coral, que falava com tanta ternura, era um incômodo.
Elizabeth não era apenas a esposa dedicada que ele mal notava. Ela era a alma de uma comunidade. Uma professora de música dedicada que ensinava crianças carentes de atenção a cantar. Uma mulher generosa que tocava piano para velhinhos esquecidos num asilo.
E ele nem sabia que ela tocava piano!
Riu, incrédulo. Uma risada seca, com amargura. Lembrou da vez em que, irritado, proibiu-a de cantar. A lembrança o atingiu como uma faca. Como pôde ser tão cruel? Parecia que o destino estava cobrando cada uma de suas ações.
Chegando ao carro, encostou-se na lateral e respirou fundo. Tentava compreender se estava mais chocado com tudo que soube ou com o fato de nunca ter se importado em descobrir antes. A verdade era simples e cruel: ao mantê-la à margem de sua vida, perdeu a chance de conhecê-la.
O vento soprou levemente. Ele fechou os olhos por um momento. Ao reabri-los, viu ao longe uma mulher saindo da igreja com uma criança no colo. Ela sorria. Por um instante, pensou ser Elizabeth. Seu coração bateu mais forte… Não era ela. Mas o vazio que sentiu confirmou o quanto queria que fosse.
Entrou no carro, mas não ligou o motor. Ficou ali, com as mãos no volante, encarando o próprio reflexo no espelho retrovisor, tentando se reconhecer.
“Quem é você, John Walker?”, murmurou para si mesmo. “O que você fez com aquela mulher? O que fez com você?”
A ausência de Elizabeth doía mais agora do que a presença silenciosa que antes tanto o incomodava. Naquela época, ao menos sabia que ela estaria lá. Agora o que o aguardava era uma casa mais silenciosa, mais fria e escura. Era um jardim vazio, ela não mais caminharia entre as flores que pareciam sorrir quando ela passava.
Suspirou. Ligou o carro e partiu devagar.
*****
Roger preferiu o silêncio. Conhecia bem o filho. E conhecia ainda melhor sua esposa. Não valia a pena discutir.
Martha tentou ligar mais uma vez, frustrada com a caixa postal. Por fim, deixou-se afundar no sofá, respirando fundo para conter a ansiedade.
Não queria admitir, mas as palavras de Roger ecoavam em sua mente. Parte dela temia que ele estivesse certo — e que John tivesse, de fato, se apegado à esposa.
“Não seria impossível!” concluiu em pensamentos.
*****
John
De volta ao escritório, os ombros estavam tensos e a expressão carregada. Passou pela secretária sem dizer uma palavra. Assim que o viu, ela se levantou, nervosa.
— Senhor Walker…. por favor, espere um momento...
Ele parou, lançando-lhe um olhar impaciente.
— Eu juro que tentei impedi-la, mas... ela entrou dizendo que o senhor não se importaria de encontrá-la em sua sala.
Um lampejo de esperança acendeu nos olhos de John. Seria possível? Elizabeth teria voltado ao saber que ele não tinha aceitado o divórcio?
Com passos largos e apressados, abriu a porta de sua sala. Mas o que encontrou o fez parar, surpreso e irritado.

Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Amargo Contrato de Casamento
Olá, quero deixar aqui meus sinceros parabéns por essa linda história, eu amei. Que Deus abençoe vc e toda a sua família...
História linda e emocionante como a fé e o amor são capazes de transformar vidas....
Maravilho...