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Amargo Contrato de Casamento romance Capítulo 94

John

Um leve toque na porta tirou John de seus pensamentos. Ele levantou os olhos e viu Bruce entrar com o semblante fechado e uma pasta de couro escura em mãos.

— Conseguiu localizá-la? — perguntou John de imediato, sua voz carregada de tensão.

Bruce parou diante da mesa e soltou um suspiro discreto.

— Ainda não — respondeu o assistente, cauteloso, temendo a reação do chefe, conhecido por não tolerar falhas.

John recostou-se na cadeira de forma ríspida, enquanto Bruce dispunha algumas fotos sobre a mesa. Ele não hesitou em pegá-las.

— A senhora Walker saiu de casa exatamente às quatro da manhã — informou, enquanto John examinava as fotos. — Pelas câmeras, identificamos o trajeto do veículo por algumas ruas, até deixá-la em um ponto de ônibus.

John o olhou intrigado.

— Num ponto de ônibus? Ela pegou um ônibus? — John apertava os dedos contra o braço da cadeira, o maxilar travado.

Bruce assentiu e continuou a narrar os fatos.

— Rastreamos esse ônibus por meio das câmeras espalhadas pela cidade. Em algum momento, ela desceu. Só não conseguimos identificar em qual ponto. Há trechos em que não há câmeras disponíveis, este ônibus é intermunicipal e segue para fora da cidade, ela poderia ter descido em qualquer lugar. Usou um percurso quase impossível de monitorar.

John levantou os olhos, fixando Bruce com uma expressão dura.

— Está querendo me dizer que ela simplesmente desapareceu? — perguntou, a voz ríspida.

Bruce engoliu seco, mas manteve-se firme.

— Investigamos todos os registros das câmeras pelas quais o ônibus passou, inclusive com software de reconhecimento facial. Não conseguimos localizá-la em nenhuma delas ou alguém que se parecesse com ela — respondeu Bruce, visivelmente desconfortável. — Ela sabia exatamente por onde andar para não ser detectada.

John estreitou o olhar, exigindo mais explicações.

— Está dizendo que, com tantas câmeras pela cidade, nenhuma foi capaz de detectá-la? Quem o Carlson acionou?

— Todos do setor de inteligência privada do senhor e também os contatos privilegiados no governo que nos deram total acesso a todas informações e videomonitoramento. — respondeu, mantendo a postura firme.

O setor de Inteligência tinha uma parceria com o governo através de uma empresa do grupo do setor de IA e era usado para investigar seus concorrentes e também para obter informações antes de fechar qualquer negócio. John mandava vasculhar a vida inteira do interlocutor. Ironicamente, nunca havia feito isso com a própria esposa.

— Está me dizendo que nem mesmo eles conseguiram encontrar Elizabeth?

— Ainda estão investigando — respondeu Bruce. — Assim que tivermos qualquer informação nova, o senhor será o primeiro a saber.

John bateu com força a pasta sobre a mesa.

— Ela teve ajuda. Elizabeth jamais faria isso sozinha.

— Também investigamos aeroportos, rodoviárias, hotéis, clínicas. Nada em nome dela ou com registros que batam com sua fisionomia. Nem mesmo com o nome de solteira.

— E Adam Saints? — A voz de John era gélida como aço.

— O senhor Saints, na noite em questão — Bruce evitou mencionar diretamente que fora a noite da fuga de Elizabeth — recebeu a noiva, a senhorita Miller, para um jantar em família na residência dos Saints.. O carro dela chegou às vinte horas. As câmeras mostram apenas ela entrando sozinha.

Bruce colocou novas fotos que mostravam um carro vermelho entrando na casa por volta das vinte horas. Os vidros laterais eram escurecidos, mas pela frente, era possível distinguir a silhueta de uma mulher loira, sozinha.

— Por volta das duas da manhã, ela saiu da residência, também sozinha. Dez minutos depois, entrou em casa. Nenhum outro veículo entrou ou saiu da propriedade dos Saints até às nove da manhã.

John analisava cada imagem como se pudesse extrair uma confissão silenciosa delas.

— E este carro preto? — apontou para a imagem de um automóvel de vidros totalmente escurecidos saindo da residência.

— Este é o veículo do senhor Saints. Na manhã seguinte, ele saiu com o motorista particular. Não foi possível confirmar se estava no carro. As câmeras de monitoramento da cidade registram o percurso normal entre a residência dos Saints e o hospital, o mesmo com a senhorita Miller, noiva do senhor Saints. Seguiram direto para o hospital e entraram no estacionamento privativo.

— Isso é tudo? — indagou John, levantando-se, visivelmente incomodado.

— Por enquanto, sim, senhor.

John passou a mão pelos cabelos, em um gesto impaciente.

— Tenho certeza que ela teve ajuda. Ela não conseguiria tramar tudo isso sozinha. Continue investigando. Verifique registros em aeroportos, rodoviárias e hoteis. Pesquise também usando o nome de solteira. Investigue tudo que puder sobre as atividades dela na igreja: com quem falava, com quem mais se relacionava, se havia encontros frequentes. E mantenha os olhos em Adam Saints e sua noiva, quero vigilância vinte quatro horas sobre eles. E quero saber quem é essa mulher.

John não respondeu de imediato. Ele tinha a impressão que o velho Walker, a raposa do negócios que foi um dia, ainda estava à espreita atento a tudo.

— Talvez o senhor tenha razão.

— John, você sempre foi guiado pela razão e pelo orgulho. Mas existem momentos em que é preciso ouvir os sentimentos. Nem tudo na vida se resolve com lógica ou estratégia. Use o coração.

John levou a mão à testa, tentando conter o nó na garganta.

— Estou começando a entender isso, vovô.

— Eu sei, meu neto. E isso me deixa feliz. Deus te abençoe.

— Obrigado... vovô.

A ligação se encerrou, e John ficou por alguns instantes em silêncio, encarando a paisagem sem realmente enxergá-la. Pela primeira vez, Oliver não perguntou por Elizabeth.

Do outro lado da mesa, Bruce estava estático. Jamais ouviu aquele tom na voz do chefe. Aquela doçura… ele não ouviu o que o avô de John disse, mas deve ter sido algo que mexeu com ele, o que levou Bruce a refletir.

John era conhecido por sua frieza. Poucos sabiam de sua ligação com o avô, Oliver Walker, o lendário fundador do império empresarial da família.

Bruce teve o privilégio de conhecê-lo quando começou a trabalhar no Grupo Walker. O velho Oliver Walker já estava deixando os negócios, mas ainda aparecia frequentemente. O que mais impressionava era a lucidez e a autoridade silenciosa que ainda mantinha. Bruce também lembrava do jovem John, cheio de ambição e genialidade, ascendendo como um meteoro no mundo dos negócios.

Mas aquele homem diante dele era outro.

Bruce permaneceu sentado em silêncio, observando o chefe diante da parede de vidro, imóvel, o olhar perdido no horizonte.

Lentamente, recostou-se na cadeira, permitindo que os próprios pensamentos emergissem. Lembrava-se com nitidez do primeiro dia em que foi apresentado a John Walker: era um jovem, brilhante, obstinado. Havia nos olhos dele uma centelha rara: paixão pelos negócios, sim, mas também um entusiasmo humano, uma força viva que não se limitava a números e estratégias. Havia sorrisos, ainda que contidos, e um certo brilho que, por vezes, deixava transparecer um lado mais leve, mais real.

Mas esse homem… esse que agora se escondia atrás da frieza das palavras, das ordens curtas, dos relatórios impecáveis… era outro. Com o tempo, Bruce testemunhou o sumiço gradual daquela centelha. Primeiro, foi a rigidez. Depois, a impaciência. Em seguida, a total falta de tolerância com qualquer erro, por menor que fosse. Colegas que antes o admiravam passaram a temê-lo. Muitos pediram transferência, outros simplesmente desistiram de trabalhar ao lado dele.

Bruce ficou. Pela esperança tola de que o velho John ainda estivesse ali, em algum lugar. No fundo, ele acreditava que a mudança tinha nome e rosto. Desde que Elizabeth entrou na vida dele, Bruce percebeu uma breve oscilação naquela couraça de aço. Foram raras vezes, mas ele viu: olhares silenciosos, gestos contidos, preocupação disfarçada em frases ríspidas. Um afeto mal disfarçado. E depois… o recuo.

John se armou ainda mais. Tornou-se mais duro, mais cético, mais isolado. Como se o casamento o tivesse bloqueado ainda mais para o mundo. E agora, com Elizabeth desaparecida, Bruce via o conflito corroer seu interior. O orgulho e a razão, a sensibilidade e os sentimentos travavam uma batalha silenciosa com algo que ele sequer ousava admitir: o medo de tê-la perdido de vez.

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