Amber
O som da porcelana se estilhaçando aos meus pés me faz prender a respiração. O chá escorre pelo carpete importado enquanto Martina me encara com aquele sorriso cruel.
"Frio. Novamente." Ela pronuncia cada sílaba como se falasse com uma criança. "Você não consegue fazer nem isso direito, não é?"
"Me desculpe, senhorita Ricci." Me abaixo rapidamente, recolhendo os cacos pontiagudos. "Posso preparar outro..."
"Não." Ela me interrompe. "Agora quero tomar banho."
Concordo aliviada, me dirigindo ao banheiro luxuoso. "Qual essência a senhorita prefere? Lavanda? Rosas ou..."
"Na verdade..." seu sorriso aumenta, "quero algo especial hoje. Sabe como faziam antigamente? Água aquecida em chaleiras... quero assim."
Sinto meu estômago afundar. "Senhorita... não sei se temos chaleiras tão grandes... e...e a casa é enorme. Como vou trazê-las até aqui sem que esfriem."
Sua risada ecoa pelo quarto. "Dê um jeito. Quero tudo pronto em 30 minutos. E Amber?" Ela se inclina para mim. "Não cometa mais um erro, minha paciência está extremamente curta hoje."
"Sim, senhorita Ricci."
Corro até a cozinha, o saco com os cacos de porcelana batendo contra minha perna. Valéria ergue os olhos do fogão assim que entro.
"Pelo amor de Deus, me ajude," imploro, explicando a situação.
"Aquela bruxa!" Valéria exclama, já puxando todas as chaleiras e panelas que encontra. "Está tentando te quebrar, querida. Mas não vamos deixar. Ela não vai conseguir. Ah não vai. Que mulherzinha...."
"Não sei mais o que fazer," confesso enquanto esperamos a água ferver. "É como se ela..."
"Como se ela quisesse te fazer desistir?" Valéria completa, seus olhos sábios me estudando. "Mas você não vai, não é? Pense nas crianças. Pense no que abandonou. Logo ela irá embora e você e as crianças ficarão bem."
Assinto, engolindo as lágrimas. A água começa a ferver e iniciamos nossa corrida contra o tempo, carregando chaleira após chaleira até o banheiro.
Quando estou prestes a despejar a última, Martina ergue a mão. "Espere."
Ela mergulha um dedo na água e seus olhos faíscam. Antes que eu possa reagir, ela agarra meu braço e força minha mão dentro da água fervente.
A dor explode em minha mão como milhares de agulhas em brasa. O choque é tão intenso que por um segundo não consigo nem respirar. Quando puxo minha mão da água fervente, o grito rasga minha garganta antes que eu possa contê-lo, ecoando pelo banheiro luxuoso.
A pele já começa a formar bolhas, um vermelho vivo que pulsa no ritmo do meu coração disparado. Lágrimas involuntárias embaçam minha visão enquanto tento, inutilmente, proteger minha mão contra meu peito.
"Era isso que queria?" Martina sibila, seu rosto contorcido numa máscara de falsa indignação. "Me queimar com água fervente? Me machucar?"
"N-não," consigo balbuciar entre ondas de dor que me fazem dobrar o corpo. "Eu jamais... por favor..."
O mundo parece girar ao meu redor, manchas escuras dançando na borda da minha visão, e preciso me apoiar na parede para não cair. Cada batida do meu coração envia uma nova onda de agonia pela minha mão.
"Não sei," admito, observando seu cuidado ao enfaixar minha mão. "Mas nunca vou esquecer sua bondade, Valéria." Ela me puxa novamente para um abraço, e choro, sentindo um vazio estranho se apossar do meu peito.
"Eu darei um jeito de te ajudar e vou pedir para Luciu ligar agora mesmo para o senhor Martinucci, não é possível que..."
"Não faça isso. Por favor, eu te imploro. Não quero mais problemas." limpo meu rosto com a mão sadia.
"Mas o que ela fez é imperdoável."
"Ela alegou que eu tentei matá-la com a água quente. Acha que as autoridades vão acreditar em quem? Ela sabia o que estava fazendo... não temos como ir contra." ela acena tristonha.
"Ah mas isso é tão injusto, minha querida." Me levanto, temendo que a noiva de Leonardo apareça novamente.
"Agora eu vou arrumar minhas coisas, e pegar as crianças. Depois de hoje, não tenho mais coragem de deixar meus filhos perto dessa mulher." ela concorda e me acompanha até o quarto.
Ali junto as poucas roupas emprestadas que temos. Minha mão lateja, mas não posso parar. Preciso encontrar as crianças.
"Me diga onde vai ficar que eu lhe farei uma visita." sorrio agradecendo.
"Pedirei a Luciu para me deixar em qualquer hotel barato, pergunte a ele quando ele voltar." Ela concorda, e me abraça de novo me deixando ir.
Vou até o jardim encontrando as crianças brincando com Lucius. Por um momento, observo seus sorrisos tão raros ultimamente. Como vou explicar que precisamos partir novamente?

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