Matheu e Isabella
Anos depois...
A vinha continuava a florescer a cada primavera, como se o tempo não tivesse pressa por aqui. As parreiras seguiam seu ciclo silencioso de brotar, crescer, frutificar e adormecer. E, entre cada estação, a vida se entranhava nas raízes da terra e nos laços que construímos por aqui.
Aurora cresceu como seu nome prometia: cheia de luz, força mansa e uma curiosidade que fazia perguntas demais para o mundo — e para mim. Tinha os olhos da mãe, mas o jeito impaciente era todo meu. Nunca gostou de bonecas, mas passava horas desenhando nas bordas dos cadernos, sonhando com jardins, pontes, casas nas árvores. Dizia que queria construir coisas que fizessem as pessoas sorrirem.
Já Lorenzo... bem, Lorenzo era um pouco de todos nós. Tinha o senso de justiça da Heloísa, o olhar calmo do Vittorio e a risada fácil que fazia qualquer um se desarmar. Um garoto feito de terra firme e céu aberto. Aurora o adorava desde sempre, mesmo que demorasse a admitir isso até para si mesma.
Era comum vê-los juntos — ora correndo pelo campo, como se fossem ainda crianças, ora deitados sob a oliveira antiga que ficava na curva do rio, conversando sobre tudo e sobre nada.
A amizade deles era o tipo de coisa que parecia ter nascido junto com eles. Natural. Inquebrável. Mas como toda raiz que cresce demais, começou a provocar fissuras na superfície.
Notei primeiro nos silêncios. Aurora, que sempre contava tudo, começou a guardar pedaços de si. Lorenzo, por sua vez, passou a aparecer com flores colhidas no caminho, mesmo quando não era dia nenhum especial.
Um dia, cheguei mais cedo do vinhedo e encontrei os dois no terraço, rindo baixinho. Estavam sujos de tinta — tentaram pintar a velha porta do galpão, segundo ela — e Lorenzo tinha um respingo azul no nariz. Aurora olhou para ele por um segundo a mais do que o necessário. E ele... ele desviou o olhar, como quem carrega um segredo.
Naquela noite, com Isabella ao meu lado, mencionei de leve:
— Eles estão mudando, não estão?
Ela sorriu, como se soubesse de tudo antes mesmo que acontecesse.
— Estão crescendo. E, talvez... se encontrando.
Foi numa tarde de fim de verão que tudo mudou.
Aurora apareceu na cozinha com os olhos vermelhos. Não chorava — ainda não — mas algo nela tinha quebrado. Vittorio e Heloísa tinham viajado por uns dias, e Lorenzo fora com eles. Uma despedida boba, coisa de três dias, mas para ela parecia o mundo.
— Você acha que ele sente o mesmo? — perguntou a sua mãe, sentando-se à mesa com o cuidado de quem carrega um peso invisível. — Mãe, não sei o que é isso, só sei que dói, não aguento isso...
Isabela lavou as mãos, enxugando-as devagar no pano de linho, antes de me sentar ao seu lado. Aurora encarava a xícara vazia à sua frente como se procurasse respostas no fundo, de um café que não havia.
— Eu acho... — ela começou, escolhendo cada palavra como se pisasse em chão de vidro — que o que Lorenzo sente, só ele pode dizer. Mas sei que ele te vê. De verdade. E isso nem sempre é comum.
Ela mordeu o canto do lábio, o olhar perdido na janela que dava para os parreirais. A luz dourada do entardecer escorria pelas folhas, pintando sombras na parede da cozinha.
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