Aurora Rossi
Já fazia quase um ano desde que Lorenzo embarcara para Nova Iorque.
Em Veneza, a vida corria com pinceladas cada vez mais firmes. Meus quadros começaram a ganhar atenção fora dos muros da escola. Um dos professores, entusiasmado com meu progresso, indicou meu trabalho para uma galeria que promovia jovens artistas italianos em mostras internacionais.
Quando recebi o convite oficial, senti o coração acelerar:
“Mostra Contemporânea Europa-América: Novos Olhares Sobre o Tempo.”
Local: Florença.
O nome dele não estava lá. Mas algo — um sexto sentido, talvez — fez minha respiração prender no peito. A mostra reuniria artistas e enólogos convidados de universidades estrangeiras, incluindo algumas dos Estados Unidos. E havia um espaço reservado para “arte & vinho: encontros entre sentidos”.
Na semana anterior ao evento, meu professor me entregou o catálogo impresso com os nomes e instituições dos convidados.
Lá estava.
Lorenzo Bianchi – Universidade de Enologia de Nova Iorque.
Com uma pequena apresentação sobre a relação sensorial entre vinho e memória emocional.
Por um segundo, a sala ficou em silêncio. Ou era só dentro de mim?
Fechei o catálogo devagar. Um turbilhão invadiu minha mente:
Será que ele sabe que eu estarei lá?
Será que lembrará de mim... ou da fita vermelha?
E Camille?
Na noite anterior à viagem, dormi pouco. Pintei até tarde, como se cada pincelada fosse um modo de me proteger. Minha obra para a exposição era intensa, quase abstrata — tons de vinho escuro, céu dourado, silhuetas que quase se tocavam. Dei o nome de “Promessa Incompleta.”
*********
Florença estava vibrante, como sempre.
A galeria era uma mistura elegante de concreto, vidro e paredes brancas. As obras penduradas como confidências. O cheiro de tinta fresca se misturava a notas sutis de vinho no ar. Um espaço de cruzamentos — entre artes, culturas e... pessoas.
No fim do segundo dia, enquanto organizava meu material ao lado da curadora, ouvi uma voz familiar ecoar pelo salão.
Baixa. Seria ilusão?
Virei devagar. E lá estava ele.
Lorenzo.
Mais adulto. Os traços do rosto marcados pelo tempo, mas os olhos — aqueles olhos — ainda guardavam aquele brilho melancólico de quem sente mais do que diz. Ele usava um blazer azul-escuro e carregava um caderno de anotações debaixo do braço. O mesmo gesto de antes.
Nossos olhares se encontraram.
Por um segundo, o salão desapareceu. Só havia nós dois. E o tempo.
Ele deu um passo. Depois outro. E então parou, a poucos metros de mim.
— Aurora? É você?
A voz saiu quase em sussurro, carregada de surpresa e algo que beirava arrependimento.
Assenti, tentando sorrir.
— Olá, Lorenzo.
Ele parecia querer dizer algo, mas se conteve. Olhou ao redor. Depois para mim de novo.
— O que você está fazendo aqui? Você... está expondo?
— Sim. — apontei para a tela atrás de mim. — Promessa Incompleta.
Ele olhou. E congelou por um instante.
Talvez tenha entendido.
Talvez tenha sentido.
— Está linda — disse, quase sem voz. E eu não sabia dizer se ele falava da tela ou de mim.
— Obrigada. — pausei, firme. — E você? Veio falar de vinho e memórias, não é?
Ele assentiu, os olhos ainda em mim.
— Parece que algumas memórias... não se dissolvem tão fácil.
Eu respirei fundo. Tantas palavras presas na garganta. Mas agora era diferente. Eu não era mais aquela garota que esperava por mensagens que não chegavam.
— Algumas se transformam, Lorenzo. Como o vinho. Às vezes, o tempo muda tudo.
Ele baixou os olhos.
— Você mudou.
— Não, apenas... Cresci.
Silêncio. Tenso, mas respeitoso. Como um quadro que ainda não se sabe se está completo... ou se precisa de um último traço.
— Posso... te ver depois da exposição? — ele arriscou. — Você vai para casa, depois daqui?
Olhei para ele por um tempo longo. E, por fim, sorri com leveza.
— Talvez. Não, terei que voltar para Veneza. Meus pais e tio Vitorio e a tia Heloísa sentem sua falta.
— E você? Sente minha falta?
— Não importa mais. Meus dias estão preenchidos com meus estudos, não tenho tempo para diversão Lorenzo.
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