As malas estavam alinhadas na entrada da mansão como guardiãs silenciosas de uma despedida inevitável. Cada uma delas parecia conter não apenas roupas e objetos, mas também um pedaço da vida que Isabella deixava para trás e outro pedaço do futuro que ainda não conseguia enxergar com clareza.
Antonela, sempre atenta aos detalhes, fez questão de revisar cada mala como se estivesse cuidando de algo precioso. As roupas de Aurora estavam dobradas com precisão quase militar: os casacos quentes para as manhãs frias da fazenda, os vestidos que a menina tanto amava e até o conjunto de botas de borracha amarelas, as preferidas, porque, como Aurora dizia “quem sabe vai chover na fazenda e eu vou brincar na lama!”.
Marta, com aquele jeito prático e doce que só ela tinha, preparou uma cesta recheada de biscoitos amanteigados, pães de queijo ainda quentinhos e uma garrafinha térmica de chá de camomila “para acalmar o coração e aquecer a alma”, como repetia, fazendo Aurora rir.
Enquanto essas pequenas ações se acumulavam, Isabella sentia a despedida ganhar peso dentro do peito. Cada objeto colocado na mala parecia arrancar-lhe uma memória e deixá-la ali, em silêncio, dentro daquela casa que guardava tantas histórias.
Quando Isabella terminou de conferir tudo, ergueu os olhos para o alto da escada. A visão de Lorenzo surgiu como um raio, mas ele não estava lá. Recordou-se do olhar dele na última noite que passaram juntos, aquele olhar carregado de um turbilhão de sentimentos que ele jamais admitiria.
O nó em sua garganta apertou. A dor, ainda latejante, parecia se espalhar como uma sombra. Por Deus, como o amava. Isabella sabia que ele também sentia, talvez não fosse amor, fosse apenas desejo, carência e era isso que machucava Isabella. Porque ela resolveu abrir o coração para um homem como ele? Sorriu ao lembrar do que Cristina havia lhe dito uma vez:
— Não somos nós que escolhemos Isabella, é o nosso coração.
Ela respirou fundo, tentando conter as lágrimas. Não podia fraquejar agora. Precisava ser forte e entregar nas mãos do destino.
Aurora, com as bochechas rosadas pelo frio da manhã e o sorriso mais luminoso do mundo, segurava a mão de Isabella com força. A menina estava radiante, saltitando como se estivesse indo para a maior aventura de sua vida.
— Tia Isa, a gente vai mesmo ver galinhas? — perguntou, com os olhos azuis cheios de esperança.
Isabella desviou o olhar para a menina e sorriu.
— Vamos, meu amor. E cavalos também — respondeu Isabella, acariciando os cachos dourados da menina.
Aurora deu um gritinho de pura alegria e abraçou a babá pela cintura, escondendo o rosto no vestido dela.
— Vai ser demais!
Quando Isabella pegou a última mala, um sorriso involuntário surgiu em seus lábios. Não um sorriso leve, mas algo carregado de ironia e alívio. Ela se lembrou da cena com Vereda algumas minutos antes, das palavras afiadas e do olhar venenoso da mulher.
— Então, o Lorenzo te colocou no lugar?, disse Vereda, com aquela arrogância insuportável.
Isabella quase podia ouvir de novo a própria resposta:
— Talvez não da maneira que você gostaria, Vereda.
Só de lembrar, Isabella ergueu o queixo. Gostava de pensar que, pela primeira vez, tinha colocado Vereda no lugar dela.
Com um último olhar para a mansão, Isabella sentiu como se estivesse fechando um capítulo de um livro complexo, cheio de dores e emoções. Talvez, como Antonela dissera, a distância ajudasse a clarear o coração. Talvez, naquela fazenda, ela conseguisse reorganizar seus sentimentos e entender o que fazer com o amor que insistia em pulsar por Lorenzo.
— Vamos, meu amor — disse, ajudando Aurora a colocar o casaco. — A estrada nos espera.
O carro, já carregado com as malas, esperava parado na frente da mansão. Era uma tarde fria, o céu nublado como se acompanhasse o humor de Isabella. Quando ela abriu a porta para Aurora, a menina entrou animada, debruçando-se na janela ainda aberta para olhar a mansão uma última vez.
— Adeus, casa grande! — gritou Aurora, acenando com as mãozinhas.
Isabella sorriu, mesmo com o coração apertado, e se sentou ao lado dela no banco de trás. Antonela, antes de fechar a porta, inclinou-se para dar um último beijo na testa da neta.
— Cuide bem da tia Isa, minha menina.
— Pode deixar, vovó! — respondeu Aurora com um sorriso largo.
O carro deu partida devagar, e Isabella sentiu o peito apertar ao ver a mansão ficando para trás, cada vez menor através do vidro. Ela apoiou a cabeça no encosto e inspirou profundamente.
Ela ia, mas uma parte do seu coração iria ficar ali naquela mansão, mesmo que ele nçao estivesse nela.

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