Lorenzo Velardi
O clique suave da porta se fechando atrás de Isabella e Aurora poderia ter passado despercebido por qualquer um.
Mas não por mim.
Para mim, soou como um estrondo abafado, como uma sentença final. Fiquei ali, imóvel, como se o simples som da madeira se encostando ao batente tivesse o poder de me paralisar por completo. O silêncio que se seguiu era ensurdecedor, carregado de tudo que eu queria ignorar.
Minhas mãos estavam sobre a mesa, rígidas. A palma ainda carregava o calor do abraço da minha filha. E o cheiro doce de infância pairava no ar, misturado ao perfume leve e indefinível de Isabella. Alguma fragrância floral, suave, que grudava nos cantos da sala como uma lembrança que se recusa a ir embora.
Ela esteve aqui e isso era um problema.
Suspirei pesadamente, recostando-me na poltrona de couro. O estofado rangeu sob o peso do meu corpo, mas era dentro de mim que o peso era maior. Uma pressão constante no peito. Como se algo estivesse prestes a romper.
“Você também precisa de alguém que cuide de você, papai.”
As palavras da minha filha ecoavam, doces, inocentes… cruéis. Porque, no fundo, talvez fossem verdadeiras. Mas isso não muda o fato de que não posso.
Não devo. Não tenho o direito.
Isabella é a babá da minha filha. É uma garota, por Deus! Muito mais nova do que eu. Cheia de sonhos que ainda pode conquistar. Não merece ser arrastada para dentro do meu mundo, esse abismo sombrio que aprendi a disfarçar com ternos caros e frases curtas.
Passei as mãos pelo rosto, tentando afastar o calor que subia pela nuca. Inútil. A imagem dela invadia meus pensamentos como uma praga silenciosa.
A forma como segurava a mão de Aurora. O jeito contido com que evitou meus olhos, como se soubesse que o mínimo contato visual pudesse nos entregar. As curvas escondidas por roupas simples, mas ainda assim capazes de despertar em mim um desejo sujo. Um desejo que me condenava.
Meu Deus… o que estou fazendo?
Ela entrou na minha vida com a delicadeza de quem não pretende ficar. Mas ficou. E agora… está em tudo.
No riso da minha filha.
Na rotina da casa.
Nos meus malditos pensamentos.
Levantei de repente. Dei a volta na mesa e fui até a janela. Boston se estendia lá embaixo, com seus prédios e carros minúsculos. A cidade seguia sua vida. E eu, aqui em cima, preso a um sentimento que jurei nunca mais permitir que crescesse dentro de mim.
Eu sou Lorenzo Velardi o homem de negócios, pai, viúvo. Não posso me dar ao luxo de me envolver. Principalmente com alguém como ela.
E ainda assim… O toque dela ficou impregnado na pele. O sorriso, tatuado na memória. E aquele maldito presente… o pinguim de pelúcia que ela ganhou de um homem qualquer no zoológico, agora repousava sobre minha mesa como um lembrete constante de que há outros olhos, outros braços, outras intenções a rondar aquela mulher que, por mais que eu negue, está se tornando mais do que eu posso suportar desejar.
Quase joguei o brinquedo pela janela. Mas não tive coragem.
Toquei a costura macia com os dedos, sentindo o ciúme queimar sob a pele como ácido. Não tenho esse direito. Não posso sentir isso. Mas sentir é inevitável.
E eu odeio isso.
Voltei a me sentar, passando os dedos pelos cabelos. Fechei os olhos. Isabella é gentil. Leal. Meiga com minha filha. Forte nas pequenas coisas. E linda… tão linda que isso chega a doer…
Eu a observei tantas vezes sem querer, ao caminhar com Aurora pelos jardins, ao rir baixinho enquanto lia histórias, ao morder o lábio inferior quando está concentrada. Eu conheço cada expressão. Cada movimento. E mesmo assim, me recuso a admitir.
Porque admitir é assinar uma sentença. A de que estou perdendo o controle. E eu, Lorenzo Velardi, nunca perco o controle.
Mas desde que Isabella entrou na minha casa… estou em guerra comigo mesmo.
— Claro que não. Aurora contou tudo. “O moço bonito deu um pinguim porque a Isa tem um sorriso lindo.” — Ele imitou a voz infantil da minha filha com perfeição. — Achei que você fosse quebrar o vidro da janela na hora.
— Está vendo novela demais, Marco.
— Você está vendo menos e sentindo demais.
Suspirei com raiva. Ou exausto. Nem sei mais.
— Ela é só uma garota, Marco…
— Que idade tinha a Letícia quando você se apaixonou por ela?
Calei.
— E outra coisa. Isabella pode ser jovem, mas não é ingênua. Ela tem mais maturidade emocional que muita mulher da nossa idade. E mais coragem do que você. Está aqui, todo dia, cuidando da sua filha, mesmo sabendo que o patrão dela a deseja e finge que não. Isso deve ser insuportável para ela. E ainda assim… ela fica.
Engoli em seco. O silêncio voltou a se instalar.
— Sabe qual a parte mais difícil disso tudo, Lorenzo? — Marco perguntou, se aproximando e tocando meu ombro. — É que você se apaixonou e sabe disso. Mas prefere fingir que ainda está inteiro, quando já está em pedaços. E ela… bem, ela está recolhendo os pedaços com cuidado. E, mesmo assim, você se esconde.
Ele se afastou. Deixou o escritório.
E eu fiquei ali, de novo, encarando a sala silenciosa. Com o pinguim de pelúcia me observando como um lembrete infantil de tudo que estou tentando não sentir.
Mas a verdade é que queima.
E, se não tomar cuidado, vai me consumir inteiro.

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