O aroma do café era o mesmo de todas as manhãs. Forte, encorpado, com aquele amargor refinado que ele apreciava em silêncio. A mesa da varanda estava impecável, como sempre, os pratos alinhados, as frutas cortadas em perfeitas proporções, a toalha de linho clara dançando com a brisa leve que atravessava o jardim.
Mas Lorenzo mal notava. Nada daquilo importava, porque ela estava ali.
Isabella.
Sentada à mesa, do outro lado, com um ar inquieto que ela tentava disfarçar, sem sucesso. Seus ombros estavam rígidos, os dedos, trêmulos, se entrelaçavam sobre o colo e depois se desfaziam. Os olhos fingiam interesse no prato à frente, mas não viam nada. E o rubor em suas bochechas… não era de timidez. Era culpa, desejo, lembrança.
E Lorenzo sabia exatamente do que ela se lembrava.
Desde o instante em que Marta, distraída, comentou com um aceno de cabeça:
— Foi a Isabella quem levou o café esta manhã…
O mundo dele girou alguns graus para a esquerda. Ele apenas havia confirmado o que ja sabia.
O vapor ainda estava no banheiro. A água escorrendo pelas costas. O punho apertando com força. O nome dela escapando de seus lábios em um gemido.
— Isabella…
Ele tinha se masturbado pensando nela, e isso o envergonha ao mesmo tempo que o enlouquecia.
E agora, ela estava ali, à mesa, com o corpo denunciando cada segundo que havia passado diante da porta entreaberta.
Será que ela tinha visto? Escutado? Sentido?
A possibilidade o incendiava. Se ela estava ali, naquele exato momento, tão inquieta, tão vermelha, tão subitamente muda, é porque sabia.
Porque esteve lá. Porque viu o que não deveria ver. Porque… gostou. E Lorenzo, maldito que era, gostava ainda mais de saber disso.
Os olhos dela evitavam os dele com disciplina, mas o corpo a traía em cada gesto pequeno. As coxas apertadas uma contra a outra. Os lábios mordidos. O pescoço exposto, como se pedisse por toque, por castigo. Era como ver o desejo se contorcer na forma mais pura, crua, vulnerável, assustadora.
O silêncio que surgia era sepulcral, até que a porta se abriu com um rangido leve.
— Bom dia… — disse uma voz pequenina, doce e sonolenta.
Lorenzo ergueu os olhos e a visão da sua filha o desarmou imediatamente.
Os cabelos loiros ainda um pouco embaraçados, os olhos pesados de sono e suas duas bonecas, Cacau e Lila, estavam em seus braços. Usava um vestido branco de algodão, com bordados delicados, meias até os joelhos e passos desajeitados de quem ainda não despertou por inteiro.
Ela caminhou na direção da mesa. Isabella levantou-se parcialmente e estendeu os braços num gesto de acolhimento.
— Bom dia, meu amor — disse, e o sorriso que ela deu à menina era de puro alívio. Um sopro de realidade no meio do furacão.
Aurora correu até Isabella e se enroscou nela, aninhando-se contra o seu corpo. Lorenzo observou a forma como a mão da babá subia pelos cabelos da menina com ternura, os dedos afagando os fios como se fossem delicados demais para o mundo.
— Dormiu bem? — perguntou ela, com uma doçura que Lorenzo jamais ouvira naquela voz.
— Sonhei que eu e o Cacau estávamos voando — disse Aurora, esfregando os olhos. — Peguei uma estrela e guardei no bolso.
Isabella sorriu, encantada.
— E o que vai fazer com essa estrela?
— Vou dar pra você.
Aquelas palavras atingiram Lorenzo como um tiro no centro do peito.
Aurora falando e expressando sentimentos com a naturalidade que ele achava impossível.


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