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A Babá Virgem e o Viúvo que Não Sabia Amar romance Capítulo 56

Os dias seguintes ao retorno de Lorenzo naquela madrugada de chuva foram como um castigo que se arrastava, silencioso e implacável, pelas paredes frias da mansão Velardi. O tempo parecia se mover mais devagar, como se o universo tivesse prendido a respiração, à espera de um desfecho que ninguém sabia nomear.

Lorenzo, antes apenas distante, agora era ausência em forma de homem. Trancava-se em seu escritório por horas, mergulhado em pilhas de papéis que fingia revisar. Saía para reuniões intermináveis e voltava tarde demais, sempre com o olhar enevoado, como se carregasse o peso do mundo nas costas. Quando a inevitabilidade o colocava diante de Isabella, por conta de Aurora, ou por descuido, ele mantinha o olhar frio, o semblante indecifrável, a voz sempre seca, precisa, impessoal. Como se cada palavra fosse medida, como se cada segundo na presença dela fosse uma batalha.

Mas a verdade é que ele não conseguia apagá-la.

A memória do toque ainda queimava em suas mãos. A curva da cintura dela ainda estava impressa em sua pele. O cheiro de sua pele, um perfume leve, quase imperceptível, mas doce como flor de laranjeira, o perseguia nos lençóis, nas roupas, no próprio corpo. Lorenzo acordava no meio da noite ofegante, os lençóis grudados à pele suada, os lábios entreabertos num gemido contido. Era como se o corpo soubesse de algo que ele insistia em negar.

Já Isabella… não escondia mais a tristeza.

Mantinha a rotina, o sorriso para Aurora, a educação com os empregados, mas os olhos estavam mais opacos, e o sorriso, menor. Suas palavras vinham mansas, sim, mas carregadas de uma dor muda, que só os muito atentos percebiam e Aurora era uma dessas. A menina passou a observá-la mais, como se instintivamente soubesse que algo em Isabella tinha se quebrado.

Naquela noite, o relógio marcava 2h47.

A casa inteira dormia. O silêncio era profundo, cortante, quase sagrado. Isabella permanecia sentada sozinha na sala, enrolada num robe fino de algodão branco, os cabelos soltos e úmidos das pontas, recém-saídos do banho. As pernas dobradas sobre a poltrona, o livro abandonado no colo. Estava imóvel, o olhar perdido nas sombras que dançavam nas paredes. Esperava nada. Esperava tudo.

E então, o som.

O giro da chave na porta.

Um arrepio percorreu sua espinha. O coração deu um salto descompassado.

A maçaneta girou devagar, e a porta da frente se abriu com um leve rangido. A chuva ainda caía lá fora, grossa, persistente e foi sob essa tempestade que ele entrou.

Lorenzo.

Com o sobretudo colado ao corpo, completamente encharcado, os cabelos pingando, o rosto sombrio. O cheiro forte do uísque e da noite molhada se espalhou pelo ambiente envolvente. Os olhos dele a encontraram. Fitaram-na com uma intensidade surda, desesperada, como se tivesse passado a noite lutando contra si mesmo… e perdido.

Ele não disse nada. Só a olhava.

Isabella se levantou com cautela. O robe escorregou um pouco pelo ombro, revelando parte da clavícula. Ela puxou o tecido, tentando esconder a pele exposta, mas Lorenzo não desviou os olhos. Havia algo feroz nele. Algo que doía.

Ela caminhou até ele, hesitante, e parou a poucos passos.

— Está tudo bem? — perguntou, a voz suave, hesitante, quase um sussurro. — Precisa de alguma coisa?

— Não preciso de nada! — ele disparou, com a voz alta, ríspida como uma bofetada. — Apenas que suma da minha frente!

A brutalidade na fala foi como um tapa seco. Isabella cambaleou um passo para trás, o rosto perdendo a cor. Seus olhos se encheram de lágrimas, mas ela permaneceu firme. Virou-se para sair. Mas então… Lorenzo a segurou pelo braço.

Não com violência, mas com urgência. Como se sua alma estivesse escorregando, e ela fosse a última coisa capaz de impedi-lo de afundar.

Isabella se virou devagar, com os olhos marejados, o coração disparado, e o corpo inteiro em alerta. Ele a puxou para perto. E os corpos colidiram com um calor contido, tenso, que vibrou entre os dois.

— Por que você está aqui? — ele perguntou, com a voz rouca, desesperada.

— Filho?

A voz de Antonella quebrou o feitiço como um raio.

Lorenzo se afastou como se tivesse sido queimado. O rosto dele se fechou, frio, duro. A máscara retornava ao lugar.

Isabella recuou um passo. As lágrimas, agora inevitáveis, escorriam em silêncio. Sem olhar para ele, virou-se e correu escada acima, com o coração em chamas, os ombros curvados pelo peso de um quase que não aconteceu.

Antonella desceu um degrau, encarando o filho com o olhar duro, o analisando. Os dois se encararam por um instante.

— Lorenzo… — ela começou, mas ele passou por ela sem responder, sem hesitar.

Subiu as escadas com passos pesados. A culpa fervendo nas veias, a pele ainda sentindo o gosto dela, o cheiro dela.

Ao entrar no quarto, trancou a porta. Encostou-se nela, respirando como um animal ferido e murmurou para a escuridão:

— O que você está fazendo comigo?

Porque já não sabia mais o que era desejo, o que era dor, o que era medo.

Sabia apenas que Isabella o havia atravessado. E não havia mais como voltar inteiro depois disso.

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