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A Babá Virgem e o Viúvo que Não Sabia Amar romance Capítulo 6

A maçaneta girou com um estalo suave, e a porta se abriu lentamente, deixando entrar a luz suave do entardecer. Isabella cruzou o limiar da casa com passos lentos, o rosto pálido, os cabelos bagunçados pelo vento, e os olhos marejados, embora firmes. Em seus braços, bem aninhada contra seu pescoço, Aurora vinha quietinha, ainda trêmula, como se seu pequeno mundo tivesse sido sacudido e agora só encontrasse refúgio no calor daquele colo.

Mesmo com o braço ferido latejando sem parar e o sangue ainda escorrendo pelo braço, Isabella a carregava com ternura, como se a dor não tivesse importância alguma. Porque, para ela, Aurora era mais leve que o ar e, ao mesmo tempo, mais preciosa que qualquer tesouro.

O som de passos apressados ecoou pelo hall.

— Isa? — chamou uma voz vinda do alto da escada.

Antonela surgiu no topo dos degraus, as mãos ainda segurando a lã onde estava a tricotar, os cabelos presos em um coque frouxo e o olhar tenso de quem já havia começado a se preocupar. Ao ver as duas, tentou sorrir.

— Que bom que chegaram, eu estava começando a…

Mas a frase morreu em seus lábios. Porque, de repente, o que tomou conta da sala não foi o silêncio, nem o susto, nem o sangue no braço de Isabella.

Foi a voz de Aurora.

— Vovó… — ela chamou baixinho, erguendo a cabeça do ombro da babá. Os olhos ainda estavam marejados, as bochechas vermelhas, mas sua voz era clara, suave como brisa e tão real quanto o milagre que era. — A Isa foi mordida por um cachorro brabo… chama o doutor vovó… tá doendo.

Antonela ficou estática.

O novelo escorregou de seus dedos e caiu no chão, mas ela nem notou. Os olhos se arregalaram, tomados por lágrimas que surgiram como uma enxurrada. A garganta se apertou e ela não conseguia respirar, muito menos falar.

A voz da neta.

A voz que tanto esperavam ouvir. A voz que por meses permaneceu trancada dentro daquele coraçãozinho frágil.

E agora ela ecoava pela casa… para contar que Isabella havia se ferido.

— Aurora… meu anjo… você… você falou… — sussurrou Antonela, descendo um degrau, depois outro, como se tivesse medo de acordar de um sonho.

Isabella, com os olhos molhados e a alma em chamas, não hesitou. Com todo o cuidado do mundo, entregou a menina aos braços da avó.

— Ela está bem agora, só ficou assustada. — disse, tentando sorrir. — Mas ela foi uma guerreira.

Antonela abraçou a neta com tanta delicadeza que parecia estar segurando porcelana.

— Você me ouviu, meu amor? Você falou! — sua voz embargada vibrava no ar. — Você conseguiu…

Aurora encostou o rostinho no pescoço da avó, sussurrando:

— Eu fiquei com medo… mas a Isa me salvou, vovó. Ela ficou na frente do cachorro bravo.

Foi como se o mundo tivesse parado mais uma vez. A menina não só havia falado… como agora contava, com suas palavras tímidas, o que tinha acontecido.

Antonela piscou rapidamente, tentando conter o choro. Mas ao baixar os olhos, viu o sangue escorrendo pelo braço de Isabella, manchando o tecido do vestido e formando uma pequena poça no chão de mármore claro.

— Meu Deus, Isa! — exclamou, completamente tomada pelo instinto. — Marta! Marta, por favor, chame o doutor Stefanno! Agora!

A empregada surgiu do fundo do corredor, assustada com o tom de urgência.

— O que aconteceu, minha senhora?

— Um cachorro atacou a Isa. Ela está ferida. — respondeu Antonela, já se dirigindo com Aurora no colo para o sofá da sala. — Diga ao doutor que venha imediatamente!

A menina, mesmo ainda assustada, sorriu e aconchegou-se mais no colo da avó, sem soltar a mão de Isabella nem por um segundo.

O tempo parecia suspenso ali naquela sala.

Isabella fechou os olhos por um instante, absorvendo aquele instante de paz tão improvável depois do caos. Seu braço pulsava de dor, mas seu coração… esse, estava cheio. Cheio de algo maior do que tudo que já conhecera.

A menina havia falado.

A dor da mordida, o susto do ataque, o sangue… tudo sumia diante da força daquela voz pequena, mas cheia de amor.

Aurora agora mas calma, tinha adormecido nos braços da avó e ainda segurava a mão da babá com firmeza. Antonela olhou para Isabella com um misto de reverência e gratidão:

— Eu não sei o que você fez com ela, Isa… mas eu sei o que ela fez com você. Ela te escolheu. E isso… isso é raro e precioso.

Isabella assentiu, sem conseguir falar. Apenas apertou com carinho a mãozinha de Aurora, que a observava agora com olhos brilhantes de admiração.

E foi assim, entre um sofá manchado de sangue e palavras doces sussurradas no fim de uma tarde qualquer, que algo sagrado se formou entre elas.

Mas o relógio continuava a correr.

E Antonela sabia que, em breve, outra porta se abriria. Com passos firmes, frios… e uma voz autoritária.

Porque Lorenzo não sabia de nada ainda. E quando soubesse… quando visse o braço ferido, o rosto abatido de Isabella, e a neta dizendo com sua própria voz que a babá a havia salvo, desobedecendo suas ordens, arriscando tudo…

O que falará mais alto no coração dele: a raiva… ou a gratidão?

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