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A Babá Virgem e o Viúvo que Não Sabia Amar romance Capítulo 67

Vereda Cattani

Estacionei o carro a exatos vinte metros do portão principal. Nem um centímetro a mais, nem a menos. Do lado de fora, a mansão se erguia como um monumento à ordem e ao silêncio. A fachada branca, colunas perfeitas, janelas tão limpas que refletiam a manhã nublada como espelhos gélidos. A casa sempre teve esse efeito em mim: intimidador e íntimo ao mesmo tempo.

Suspirei, apoiando as mãos no volante por alguns segundos. As unhas vermelhas, recém-feitas, estavam impecáveis, sempre estavam. Ajeitei o espelho retrovisor e encarei meu próprio reflexo. Havia algo nos meus olhos naquela manhã... uma tensão contida. Eu reconhecia esse brilho. Era raiva, mas também era cálculo. Eu tinha planos. E Isabella, a pequena e dissimulada babá, estava no centro de todos eles.

Observei o portão por entre os vidros escurecidos do carro. Sabia exatamente qual seria a rotina dele. Lorenzo era previsível em muitas coisas, apesar da alma caótica. Às 9h em ponto, ele sairia para a empresa. Teria saído mais cedo se não fosse Aurora, a única que ainda conseguia atrasá-lo com abraços e manhas. Eu sabia disso porque o conhecia. Conhecia seus hábitos, seus gestos, seus silêncios. Conhecia cada rachadura naquela armadura fria que ele usava para o mundo.

Mas havia algo escapando pelas frestas. Algo que ele não me dizia.

E esse algo tinha nome… Isabella, a maldita babá.

Ela estava se infiltrando na vida dele, na casa dele, no coração da filha dele. Como uma erva daninha que ninguém percebe até ser tarde demais. A maneira como ela se movia… silenciosa, gentil, cuidadosa demais para ser natural. Era uma performance. E Lorenzo, o homem que dizia não se deixar enganar por ninguém, estava caindo feito um adolescente pela primeira paixão.

Ele não via o risco, mas eu via.

Passei a ponta dos dedos pelo decote do vestido preto justo que escolhi ainda antes do sol nascer. Um exagero, sim. E proposital. Nenhuma mulher aparece numa casa às dez da manhã com um vestido de coquetel a não ser que tenha algo a provar. E eu tinha.

Eu queria ser notada. Eu queria entrar naquela sala como uma sombra carregando um perfume caro e um sorriso perigoso. Eu queria que Isabella sentisse o peso da minha presença. E não só ela. Eu queria que Lorenzo soubesse que eu estava de volta ao jogo. Que eu nunca saí de verdade. Porque, no fundo, ele sempre soube que quando tudo desabava, era a mim que ele procurava. Eu era o chão firme quando o mundo desmoronava. Eu era a verdade crua. E Isabella? Isabella era só um devaneio.

Inclinei a cabeça para trás, fechando os olhos por um instante. Um leve tilintar ecoou do meu brinco. Eu podia ouvir o som de uma torneira sendo fechada, talvez na cozinha da ala esquerda da casa. Pequenos movimentos, pequenos sinais. Era como caçar em campo aberto. O silêncio me dava vantagem.

A lembrança do que vi naquele dia ainda ardia em mim como vinagre numa ferida descoberta.

Lorenzo sempre foi um homem discreto e a maneira que ele defendeu essa menina naquele dia me deixou cismada. Ele jamais teria feito tal coisa se essa garotinha do interior não tivesse chamado a sua atenção e isso me deixou furiosa.

Mas eu não era tola. Havia estratégia em cada gesto. O cabelo solto num desalinho estudado, o vestido branco de algodão leve, o riso baixo. Uma mulher que entende o poder do próprio silêncio. Era uma atriz. Uma muito boa, admito. Mas eu já vi muitas mulheres como ela. A diferença? Ela teve acesso. E usa essa imagem de menina pura e virgem que derrete homens frios como Lorenzo.

Ah, Lorenzo...você é muito inocente mesmo. Mas não se preocupe, meu querido, irei desmascarar essa menina para você. As vezes eu acho que ele percebeu, apenas esteja se permitindo ser enganado. Um homem que carrega tanta dor às vezes precisa de um disfarce bonito para a solidão.

Mas ela não vai durar. Eu vou arrancá-la dessa casa.

Peguei o celular e li, pela centésima vez, a última mensagem que enviei a ele.

"Precisamos conversar. Algo importante. Vou passar na sua casa amanhã. Beijos, V."

Ele não respondeu. Nem precisava. Lorenzo era assim: respondia com ausência. Quando queria evitar algo, apenas se calava. Mas o silêncio dele, nesse caso, era quase uma permissão.

E eu iria entrar.

Examinei as mãos novamente. Nenhum tremor, nenhuma hesitação. Era isso que me fazia diferente das outras. Eu sabia o que fazer quando o mundo apertava. Eu não chorava, não fugia. Eu entrava e enfrentava.

Capítulo 67 - A cobra a espreita 1

Capítulo 67 - A cobra a espreita 2

Capítulo 67 - A cobra a espreita 3

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