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A Babá Virgem e o Viúvo que Não Sabia Amar romance Capítulo 8

O quarto estava envolto numa penumbra suave, quase mágica. A lâmpada do abajur no canto lançava um brilho morno e dourado, pintando sombras delicadas nas paredes em tons rosados. Os brinquedos repousavam imóveis nas prateleiras, como se respeitassem o silêncio reverente daquele final de tarde e inicio de noite, uma noite que parecia ter parado no tempo para abrigar o momento mais precioso de todos.

Isabella estava sentada na cama, encostada nos travesseiros com o braço bom apoiado no colo. O outro, ainda enfaixado e latejando, repousava cuidadosamente sobre o edredom. Mas a dor ali já não era o que importava. O que preenchia o peito dela agora era outra coisa, um calor doce, poderoso, que nascia da presença silenciosa e intensa da pequena Aurora sentada ao seu lado.

A menina estava concentrada. Seus dedinhos ágeis dobravam com cuidado o travesseiro atrás das costas de Isabella, tentando deixá-lo mais confortável. Depois ajeitou a ponta do edredom sobre as pernas da babá, com o zelo de quem aprendeu a amar em silêncio e, agora, enfim, podia expressar isso com gestos pequenos, mas repletos de significado.

— Tá fofinho? — ela perguntou, erguendo os olhos azuis com uma doçura que fez o coração de Isabella apertar.

Ela sorriu, tocada demais para conter a emoção.

— Tá perfeito, minha princesa. Nunca ninguém cuidou de mim tão bem assim.

Aurora sorriu orgulhosa, e aquele sorriso iluminou o quarto mais do que qualquer lâmpada poderia. Com um movimento tímido, ela se aproximou mais, subiu na cama da babá, e deitou-se, com a cabeça repousando no ombro bom de Isabella. Ficaram assim, apenas respirando juntas. O som da chuva fina batendo contra a janela criava uma melodia de ninar que embalava aquele instante.

Isabella passou os dedos pelos cabelos ondulados da menina, num gesto instintivo, maternal. Ela nem percebeu quando começou a embalar Aurora com delicadeza, como se o carinho precisasse encontrar alguma forma de escapar do peito transbordado de afeto. A conexão entre elas fluía em silêncio, sem necessidade de palavras.

Mas foi Aurora quem quebrou o silêncio.

— Isa… — chamou baixinho, a voz tremendo só um pouquinho. — Você acha que… que o papai vai ficar feliz por eu ter falado?

Isabella estremeceu.

A menção a Lorenzo foi como um sopro gelado no meio daquela noite morna. Ela não esperava. O nome dele… dito com tanta esperança, com tanta inocência. Uma simples pergunta que carregava mil outras por trás. Isabella ficou alguns segundos em silêncio, tentando conter a avalanche de sentimentos que aquilo provocava. Seu corpo enrijeceu, mas então olhou para o rostinho de Aurora, tão frágil, tão sincero.

E sorriu. Um sorriso sereno, mesmo que por dentro o coração tivesse perdido o compasso.

— Vai sim, meu amor… — sussurrou, com os olhos marejados. — Ele vai ficar muito feliz. Muito mesmo.

Aurora pareceu satisfeita com a resposta. E sua expressão se iluminou com um brilho novo, quase travesso.

— Então agora… agora a gente pode contar histórias juntas! — disse animada, erguendo o rosto com empolgação. — Você conta um pedaço e eu conto o outro! Igual nos livros! Eu falo as vozes dos personagens. A do coelhinho, da fadinha… e até do monstro!

Isabella riu, emocionada com aquela alegria espontânea.

— Vai ser a melhor contadora de histórias do mundo. — disse. — Mas já aviso que sou exigente com as vozes. O monstro tem que ser assustador.

Aurora arregalou os olhos, fez uma expressão feroz e rosnou baixinho:

— Grrr! Eu sou o monstro da floresta sombria e eu vou pegar você! — disse com a voz grossa e teatral, e depois caiu na gargalhada.

Isabella levou a mão à boca, rindo com ela.

— Perfeita! Está contratada! — disse, piscando.

Aurora voltou a se deitar, aconchegando-se outra vez ao lado da babá. Ficou ali, olhando para o teto por um tempo, até dizer em voz baixa:

— E agora… agora a gente pode brincar mais. Você vai me ensinar a desenhar aquelas meninas com vestidos rodados… e eu posso te mostrar como a vovó faz panquecas com carinha de urso.

— Eu tô aqui. Eu tô bem. — disse com a voz firme, embora o nó na garganta já estivesse se formando. — Você me deu força, sabia? Você ficou ali comigo. E sua voz… sua voz me trouxe de volta.

Aurora encostou o rosto no peito da babá e sussurrou:

— Não solta minha mão, tá?

Isabella a abraçou com o corpo inteiro, com a alma, com cada pedaço do coração.

— Nunca. Nunca vou soltar.

E assim as duas ficaram.

Aurora com o rosto enfiado no colo de Isabella. Isabella com lágrimas silenciosas escorrendo pelo rosto, sem saber se eram de dor, de amor, de alívio, ou de tudo junto. As luzes suaves do abajur ainda tremeluziam. O som da chuva continuava a tocar a janela como um segredo sussurrado.

Mas ali, naquele quarto, entre lençóis, sorrisos e palavras ditas pela primeira vez, algo eterno nascia.

Não era só o amor de uma babá por uma criança.

Era o encontro de duas almas que se reconheceram na dor e prometeram, em silêncio:

Não soltar as mãos.

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