A casa estava quieta. Marta já tinha ido dormir. Isabella e Aurora, lá em cima, pareciam ter encontrado paz no quarto. Mas Antonela, no entanto, não conseguia se aquietar.
Sentada à beira da cama, com o telefone fixo na mão, ela hesitou por alguns segundos. Passou os dedos pelos cabelos, olhou para o teto, respirou fundo. Sabia que ele não gostava de ligações fora de hora. Sabia também que ele provavelmente atenderia com irritação.
Mas precisava ligar. Precisava que ele soubesse.
Com o coração apertado, discou o número de Lorenzo.
Chamou duas vezes. Três. Quatro.
A noite começava a cair, tingindo o céu de tons dourados quando o telefone de Lorenzo vibrou sobre a mesa de seu escritório, em meio a pilhas de papéis, contratos, e a solidão típica de quem vive entre paredes de mármore e silêncio.
Ele atendeu sem sequer olhar o visor, a voz firme e seca de sempre:
— Pronto. — respondeu ele do outro lado da linha, com a voz grave e impaciente.
— Sou eu, Antonela. — respondeu a mãe, com um tom que fez a espinha dele enrijecer. — Preciso te contar uma coisa, e você vai me ouvir até o fim. É sobre a Aurora.
Ele imediatamente largou a caneta e se endireitou na cadeira.
A coluna de Lorenzo se endireitou na mesma hora. A caneta caiu de sua mão.
— O que aconteceu com a minha filha?
— Hoje à tarde, Isabella foi buscar a Aurora na escola. Resolveu dispensar o motorista e levá-la a pé até o parque que fica ali perto…
— Ela fez O QUÊ?! — a voz de Lorenzo explodiu como um trovão.
Levantou-se da cadeira num rompante, derrubando os papéis da mesa. O peito arfava, o maxilar travado. O nome de Isabella nos lábios dele veio como uma lâmina.
Antonela cerrou os olhos do outro lado da linha, respirando com calma.
— Lorenzo, se acalma. Deixa eu terminar.
— O que houve? — ele perguntou, sério, como se de repente o mundo tivesse parado.
— Houve um incidente hoje no parque. Isabella foi buscá-la na escola, resolveu fazer um passeio só com ela… um cachorro avançou. Isabella ficou ferida protegendo a sua filha. — A voz de Antonela começou a vacilar. — Foi mordida, Lorenzo. No braço. Mas… graças a Deus… está bem.
— Quem deu a ela esse direito?! Eu deixei ordens CLARAS de que minha filha não deveria sair sem o motorista. E você está me dizendo que ela simplesmente decidiu brincar de mãe? De babá heroína?!
O tom de Antonela continuou calmo, mas firme.
— Você vai me deixar terminar.
— Não! Eu exijo saber agora mesmo onde ela está! Como se atreve a colocar minha filha em perigo desse jeito?! — ele andava de um lado para o outro, descontrolado. — Isso é irresponsável! Imprudente! Eu devia…
— Ela falou.
Silêncio.
O silêncio que se seguiu foi cortante.
Do outro lado da linha, ele não disse nada. Apenas ouvia. O telefone ainda estava colado à orelha quando Lorenzo ficou completamente imóvel atrás da mesa. Os olhos fixos em algum ponto no horizonte que não existia. Antonela falava com emoção contida, do outro lado da linha.
— Como um escudo humano. — confirmou Antonella, com voz baixa. — Ela se jogou entre o cão e a Aurora sem pensar duas vezes. E é por isso que Aurora… falou. Porque teve medo de perdê-la.
Do outro lado da linha, o silêncio de Lorenzo era absoluto. Mas dentro dele, o caos rugia.
Ele sentia raiva de si mesmo. Da ausência, da frieza. Sentia inveja. Porque a primeira palavra da filha não foi por ele.
Sentia dor, porque tudo o que ela precisava… estava na figura de uma babá.
E mesmo assim… sentia algo que não queria nomear.
— Estou indo agora. — disse com firmeza.
— Agora?
— Agora, mãe. — repetiu ele com a voz baixa e firme, já pegando as chaves do carro. — Não quero mais saber de reuniões, contratos ou jantares.
Antonela fechou os olhos ao ouvir aquilo, segurando as lágrimas.
— Venha. Mas venha disposto a sentir, Lorenzo. Porque sua filha quebrou o silêncio… e você precisa estar pronto para ouvi-la com o coração.
Ela desligou antes que ele respondesse.
Lorenzo ficou parado ali, o telefone ainda encostado à orelha. Depois abaixou lentamente, os olhos fixos no nada, e murmurou, como se para si:
— Ela falou… E não foi pra mim.

Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: A Babá Virgem e o Viúvo que Não Sabia Amar