Evelyn
A viagem para casa foi silenciosa. Em um momento ou outro, David falava alguma coisa, apenas para deixar o clima mais leve e menos estranho. Isso ajudava, pois me tirava dos meus pensamentos. Mas, por mais que tentasse, hora ou outra minha mente me pregava uma peça e me levava até Alexander. Seu carinho e cuidado no dia anterior... para hoje se tornarem fúria e desprezo.
"Vocês dois não são dignos."
Mas ser indigno? Isso é forte demais... Isso... Isso faz Brandon parecer uma pessoa má. E ele não era, certo? Ele só tinha seus momentos difíceis... só guardava coisas para si... só descontava em mim quando estava irritado. Mas ele nunca me machucou de verdade, nunca levantou a mão contra mim. Então por que essas palavras de Alexander não saem da minha cabeça? Por que uma parte de mim sente que ele pode estar certo?
Chegamos, e David me pediu desculpas, pois algo havia surgido e ele não poderia ficar. Assenti e nos despedimos. Combinamos que eu começaria a trabalhar em quinze dias. Isso seria o suficiente para ajeitar minhas coisas, e encontrar um lugar para ficar em Houston... Resumindo, me daria tempo.
Vi algumas ligações de Alexander e decidi retornar. Ele não merecia depois do que me disse, mas, em gratidão pelas últimas semanas, e principalmente por ontem. Resolvi ligar de volta.
Ele não atendeu, mas sei que não rejeitou a chamada, pois o telefone tocou até cair. Algo se remexeu dentro de mim, como um pressentimento. A mesma sensação que tive no dia do acidente dos meus pais. Mas ignorei.
Olhei para meu celular e vi que estava com apenas cinco por cento de bateria. Foi aí que me lembrei: esqueci meu carregador ao lado da cama de Alexander.
— Perfeito! — murmurei para mim mesma.
Comecei a andar pela casa. Nada parecia certo. E não era apenas pelo luto de Brandon... havia algo mais.
Quando subi as escadas para meu quarto, vi que a porta estava aberta. Não havia mais sangue; a equipe de Alexander já havia limpado tudo.
Mesmo assim, a imagem da mulher baleada no meu chão estocou minha mente. Nunca atirei em ninguém antes. Sempre pratiquei com garrafas, alvos, mas nunca em uma pessoa. Eu sabia que meu tiro não a matou... Mas, ainda assim, vê-la estirada ali...
Um desconforto cresceu dentro de mim. Mas então me lembrei de outra coisa.
Alexander invadindo meu quarto. Sua imponência.
Um sorriso brincou em meus lábios.
— Homem irritante. — Balancei a cabeça, rindo baixinho com a lembrança, e segui para o banheiro.
Tentei ter um dia o mais normal possível. Juntei todas as armas espalhadas pela casa e as guardei no meu guarda-roupa. Mexi nas roupas de Brandon também, mas ainda não estava pronta para me desfazer delas...
O dia passou como um borrão. Borne era uma cidade que parava cedo. Pulei o jantar e logo me preparei para dormir.
Peguei meu celular sem bateria e fiquei encarando o aparelho. Será que Alexander viu minha ligação? Será que tentou falar comigo? Um pensamento me atingiu como um golpe certeiro: ele não veio atrás de mim. No fundo, algo dentro de mim esperava... e queria que ele tivesse vindo. Mas ele não veio.
Rolei na cama. Parecia que ela tinha espinhos. O colchão estava duro, os lençóis ásperos, os travesseiros me incomodavam. Tudo ali parecia errado. Eu sentia falta de algo. Ou melhor, de alguém.
Alcancei a camiseta de Brandon. Talvez sentir o cheiro dele me acalmasse. Mesmo depois de semanas, a roupa ainda tinha seu cheiro.
Mas ainda não era isso.
Joguei a camisa de lado e decidi me levantar. Desenhar sempre me relaxava. Fui até minha bolsa e... droga. Meu caderno não estava ali.
Devo ter esquecido em Houston.
Voltei para a cama. Eu precisava dormir.
Em Houston, o sono vinha tão fácil... Por que agora simplesmente não consigo dormir?
Meus olhos pousaram sobre a camisa de Brandon jogada ali. Fiquei encarando-a por um momento, mas, mesmo olhando para ela, não foi Brandon que veio à minha mente. Foi ele... Alexander.
Seu rosto impassível, sempre oculto por uma máscara que eu nunca conseguia decifrar. A forma como seu perfil mudava quando encarava as luzes da cidade pelas grandes janelas, enquanto bebia seu whisky todas as noites. O jeito como seu cabelo, sempre tão arrumado, ficava bagunçado quando dormia, com os fios lisos caindo sobre a testa. A paz que ele transmitia quando me puxava para o seu peito. E a intensidade daqueles olhos escuros quando eu, quase sempre... Ou melhor, sempre, o contrariava.
Foi então que percebi.
Virei-me de lado, encarando o espaço vazio ao meu lado.
Naquele momento, não era de Brandon que eu sentia falta. Eu o amava, eu sabia disso. Brandon foi e sempre será o amor da minha vida. Mas, agora, a ausência que realmente doía... era a de Alexander.
Do homem irritante que me trouxe para casa no dia em que dormi no cemitério. Que me protegeu quando invadiram minha casa. Que me aceitou em sua cama porque eu me recusava a dormir sozinha...
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