Capítulo 344 – Dom da vida
Rosario
Vida…
Gerar uma vida é um dom que Dios nos deu. Deus, universo, seja em quem cada um acredita, mas indiferente de quem quer que seja, ainda assim… é um dom.
E ser mãe… é mais que gerar, é dar a vida por seu hijo se for preciso. E isso… também é um dom. Quando senti que algo estava errado, me lembrei da minha mãe, de quando ela morreu após dar à luz ao meu irmão. Que, por pura ironia do destino, mesmo depois de minha mãe dar a vida a ele… também perdeu a sua.
E assim como minha mãe… tudo que eu mais queria era que minha Aurora vivesse.
Não é fácil abrir mão de viver. Me diz no mundo qual pessoa que almeja a morte? Nem mesmo os corajosos que tiram a própria vida queriam morrer… eles só queriam acabar com o sofrimento.
Resumindo, ninguém abre mão da vida. A gente só muda o propósito, abandona o viver, pelo fazer… É confuso, né? Eu sei… mas é isso que acontece, deixamos de lado viver para… fazer alguém feliz, para deixar alguém viver, para fazer a dor… parar.
Sabia que meu pedido mexeria com Benjamin, mas não tinha tempo para muita coisa. Se acontecesse comigo o que aconteceu com mi madre, ele precisava entender.
“Aurora é a primeira opção.”
E será sempre assim…
As coisas pareciam acontecer rápido demais, ao mesmo tempo lento demais. Eu fui para a escuridão, voltei, depois ela me chamou novamente, me fiz de forte e disse: “Agora não”. E esperei minha Aurora nascer.
E ela era linda, assim como eu, porque eu sou um Scandal. Mas o que a tornava perfeita eram os olhos. Pois eram os olhos do homem da minha vida, e esses olhos vou levar na minha memória pra sempre.
E foi assim, com essa imagem gravada na minha alma, que eu parti...
Morrer… é tão fácil, e tão difícil ao mesmo tempo.
Ouvi histórias ao longo dos anos de pessoas dizendo como foi sua experiência de “quase morte”. Minha niña disse que quando o coração dela parou, o mundo parou na escuridão. E no instante que o meu parou, achei que ia acontecer o mesmo comigo, mas não aconteceu.
O mundo não parou pra mim, pelo contrário, ela me chamava. Era como se eu estivesse em uma sala escura buscando o interruptor para acender a luz. Eu tateei tanto para encontrar, e nada, até que…
— VUELVE, ROSA. ¡VUELVE AHORA MISMO! ¡POR MÍ, POR AURORA, POR TU OGROOO! — Uma voz me pedindo para voltar foi o caminho até o interruptor e, quando minha mão o alcançou…
— Você acordou… — uma voz surgiu ao meu lado. Virei a cabeça com cuidado, era um senhor. Ele estava deitado em uma maca ao meu lado, aparelhos ligados a ele assim como eu.
— Onde estou? — Minha voz saiu arranhada.
— No pós-cirúrgico, eles chamam de UTI. Mas não é bem uma, não como as que conhecemos. — ele me disse com um sorriso.
— Minha filha…
— Ah, ela está bem. Ouvi a enfermeira falando, em breve seremos levados a nossos quartos.
— O senhor parece conhecer bem aqui.
— Bem… — ele começou. — É minha quinta cirurgia, e sou médico. Não exerço há alguns anos, mas ainda sou um.
Nós dois rimos.
— Qual o problema? — perguntei com os olhos fixos nele.
— Câncer. — Me encolhi ao ouvir essa palavra, já vi pessoas queridas sofrerem por esse mal.
— Sinto muito.
— Ah, não sinta, querida. As coisas acontecem por um propósito. Seja nascer, viver, adoecer, sobreviver ou até mesmo morrer.
— Mas mesmo assim, sinto muito. Espero que seja sua última cirurgia, que a partir de hoje fique bem.
— Também espero. — ele respondeu.
E mais uma vez nós dois rimos. A conversa foi fluindo, em algumas horas compartilhamos nossas vidas em palavras suaves, divertidas. Ele me disse que eu havia dormido por horas. Me explicou com detalhes o meu caso, disse que eu podia me considerar uma sobrevivente. Ele era educado, atencioso e muito paciente em responder às minhas dúvidas.
A enfermeira me deu uma nova medicação e peguei no sono. Quando acordei, meu colega de quarto não estava mais ali. E, um tempo depois, eu também fui levada para meu quarto.
Assim que as enfermeiras me acomodaram e se retiraram, a porta se abriu e lá estava ele.
— Ogro… — murmurei entre as lágrimas.
Ele entrou devagar, mas assim que nossos olhos se encontraram, não havia mais distância possível. Benjamin atravessou o quarto em passos largos, urgentes, como se temesse que algo me acontecesse de novo se demorasse um segundo a mais.
Ajoelhou-se ao lado da cama, tomou meu rosto entre as mãos grandes e quentes e, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, sua boca colou na minha.
Não foi um beijo suave. Foi desesperado, intenso, molhado pelas lágrimas que escorriam do rosto dele e caíam sobre os meus lábios. Ele me beijava como um homem que tinha acabado de perder tudo e, de repente, recebera de volta. Como se cada segundo longe de mim tivesse sido uma tortura.
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