A tarde caiu sobre a casa como um cobertor de luz pálida. O relógio da parede marcava um tempo que parecia não avançar, e cada estalo do ponteiro, costumeiramente imperceptível, virava um trovão no silêncio da sala. Maria andava de um lado para o outro, ajeitando almofadas que já estavam no lugar, endireitando a toalha da mesa que não tinha um vinco, limpando pela terceira vez o mesmo aparador. Era seu jeito de espantar o nervoso. No sofá, Aurora abraçava sua mochila cor-de-rosa, com as perninhas balançando no ar, os olhos grandes e atentos voltados para a janela. A qualquer ruído do portão, ela prendia a respiração. O coração batia como um passarinho apressado.
— Vovó Maria, que horas a vovó Antonella chega? — perguntou pela quinta vez, sem perceber que repetia a pergunta.
— Daqui a pouquinho, minha flor. — respondeu Maria, com um sorriso que não alcançava os olhos. — Trânsito essa hora é um medo de confundir qualquer cristão. Daqui a pouco elas batem aí no portão.
O “elas” vinha carregado de esperança. Aurora sabia que, quando as duas chegassem, alguma coisa ia se ajeitar por dentro. A casa parecia grande demais sem a risada de Isabella, sem os passos apressados de Lorenzo. O silêncio dava eco nos cantos, cheirava a tempestade segurando lágrima. Aurora encostou a cabeça no encosto do sofá e mordeu o lábio. Foi quando ouviu o som do portão. O barulho do trinco foi um alívio que se transformou em corrida: a menina saltou do sofá, a mochila voou para o lado, e ela disparou pelo corredor como um raio cor-de-rosa.
Antonella mal passou pela porta e já se viu com um torpedinho de cabelos dourados grudado na cintura. Aurora a envolveu num abraço tão apertado que a avó precisou ajoelhar para consertar a diferença de altura. Os olhos de Antonella estavam marejados, mas ela respirou fundo, tentando ser a rocha que a neta precisava.
— Vovó! — Aurora disse, com a voz que vinha do peito. — Cadê a mamãe? Cadê o papai? Por que não vieram?
Antonella ajeitou uma mecha do cabelo da menina e, ainda de joelhos, segurou as mãos miúdas entre as suas.
— Meu amor… — começou, e a voz tremeu antes de firmar. — A mamãe sofreu um acidente, e o papai está com ela no hospital.
Aurora arregalou os olhos. A palavra “acidente” ficou suspensa no ar, pesada, difícil.
— Acidente? — repetiu, o queixo tremendo. — Ela vai…?
Giulia, que acabava de entrar, deixou a bolsa sobre a consola e aproximou-se de imediato. Agachou na altura da sobrinha, pousou as mãos nos ombros finos e falou com uma convicção que ela mesma precisou pescar no fundo do peito:
— Não, Aurora. Ela vai ficar bem e vai voltar para você. — O olhar de Giulia era como um abraço firme. — A sua mamãe é forte. E tem muita gente cuidando dela.
A garotinha apertou os lábios num biquinho, como fazia quando queria segurar o choro e ser valente. Olhou para a tia, depois para Antonella, e então disse com a voz embargada:
— Ela vai, tia Giulia. Ela me prometeu que não ia me abandonar.

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