Cap. 104 Andrews acorda.
Aurora
Eu não queria saber.
Não queria saber se ele estava sonâmbulo ou não.
Não me importava, não agora. Porque… alguma coisa estava diferente. Não era só à noite.
Era o jeito como ele me olhava durante o dia. O jeito como ele falava comigo, mesmo tentando manter aquele tom firme, distante… havia algo novo. Algo que antes não existia.
E estava escapando pelo olhar dele, pelos gestos, até pelo silêncio. Estava ficando difícil separar o Andrews que dormia… do Andrews que estava acordado.
E isso estava me deixando… animada. Esperançosa. Com o coração batendo no mesmo ritmo de um segredo prestes a ser revelado. Pela primeira vez em muito tempo, me permiti… sonhar que poderia me aproximar dele sem que ele estivesse inconsciente.
Me arrumei devagar, como se cada gesto fosse um ritual sagrado.
Escovei os cabelos com calma, penteando cada fio como se estivesse indo para um encontro. Eu desejava que ele não tivesse trancado a porta.
Escolhi a camisola turquesa, de tecido leve, com aquele robe de seda que vinha junto, deslizando pelo meu corpo como uma carícia.
Queria me sentir bonita. Queria me sentir viva. E, mais do que tudo, queria que ele me visse assim.
Se ao menos pudesse me ver quando estivesse acordado. Mas desse jeito… ainda não era ruim. Mesmo que seus olhos ainda estivessem presos em um mundo onde a consciência dorme.
Sei que ele disse que trancaria a porta, mas só para me certificar, perto do horário averiguei — e ele não tinha feito. Significa que eu o veria essa noite.
Esperei no corredor, segurando o fôlego, até vê-lo surgir. Pontualmente. Andrews.
Ele caminhava com passos lentos, quase silenciosos, vestindo apenas uma calça de linho clara. Descalço. O peito nu. E os olhos… vazios. Ainda dormindo.
Mas eu sorri. Sorri com o coração.
— Vamos — murmurei, estendendo a mão.
Ele a pegou, como sempre fazia. E eu o conduzi até a sala de lazer, onde as noites ganhavam cor, música… e algo que eu ainda não sabia nomear.
Peguei o controle e coloquei nossa música de fundo, uma daquelas que ele parece sempre reagir, mesmo sem dizer nada.
Havia um reflexo nele, como se a melodia o puxasse para mais perto da superfície.
Depois, caminhei até a pequena adega ao lado.
— Eu não costumo beber — confessei, enquanto pegava uma taça. — Mas hoje... estou feliz.
Abri o vinho e o servi. Meu reflexo no vidro revelava um sorriso bobo, daqueles que só acontecem quando a esperança invade de novo.
— Feliz por ver você mudando… mesmo acordado. Por estar me apaixonando pela sua versão desperta também. Mesmo que você não sinta nada por mim. Não sei... a sensação de se apaixonar por alguém é algo novo e prazeroso para mim, mesmo que seja gostando de um homem tão rabugento como você, Andrews.
Me virei devagar, segurando a taça. Ele ainda estava parado, como uma estátua viva no meio da sala.
Meu sorriso fraquejou só um pouco.
— E agora? — perguntei, baixinho. — O que eu faço com isso tudo?
Dei um passo à frente, e minha voz saiu embargada.
Era como beijar uma memória. E, ao mesmo tempo… criar uma nova. Uma que ele talvez lembrasse. Uma que talvez ele quisesse lembrar. E naquele instante, entre o beijo, o calor e o som distante da música… tudo que importava era que ele estava ali. Comigo. Mas algo dentro de mim dizia desesperadamente para eu não fazer mais isso. Por estar tão envolvida sentimentalmente com ele, eu não queria testar os limites dele naquele estado. E parecia que ele não tinha. Parecia que ele seria capaz de tudo.
O beijo se prolongou e, por um instante, tudo ao redor desapareceu. O mundo se dissolveu no calor daquele toque. Mas então, perdi o equilíbrio.
Meu corpo cedeu e caí de costas sobre a cama, arfando, com o coração disparado no ritmo frenético da surpresa. Antes que pudesse entender o que estava acontecendo, Andrews veio junto, seu corpo pairando sobre o meu, os olhos escuros e intensos como um eclipse à meia-noite. Por um segundo, congelei.
Meu corpo estava em chamas. A respiração presa. O peito subindo e descendo de forma descompassada. Eu queria. Queria tanto que doía. Mas, ao mesmo tempo, havia um medo latente crescendo dentro de mim, pulsando, Minhas mãos tocaram o peito dele. A pele quente. Os músculos tensos sob meus dedos.
Mesmo assim… eu não o afastei. Deixei que ele me beijasse de novo.
Dessa vez, o beijo veio mais profundo. Mais intenso. Como se ele quisesse devorar tudo que havia entre nós, inclusive as barreiras que me protegiam de mim mesma. As mãos dele começaram a explorar meu corpo, deslizando pelo robe de seda como se buscassem memórias que não sabiam que existiam. Ele avançava como se o tempo fosse um inimigo a ser derrotado, como se houvesse urgência em cada toque.
Me agarrei aos ombros dele, presa entre o impulso e o pânico, lutando contra a confusão que se espalhava dentro de mim.
O tecido leve da camisola cedeu sob seus dedos. E então, eu senti. A palma da mão dele subiu, gentil e determinada, por baixo da seda… O gesto fez meu corpo estremecer, mas meu coração gritou primeiro.
— Não… — sussurrei contra a boca dele, empurrando-o com suavidade, tentando recuperar o controle que já escorregava por entre os dedos.
Ele hesitou, mas não parou.
— Andrews! — minha voz saiu firme, cortando o ar do quarto como uma lâmina afiada. — Não passe dos limites, por favor. Se você fizer isso… se tirar de mim a única coisa que ainda é só minha… eu juro que vou te odiar pelo resto da vida.
A respiração dele travou contra meu pescoço. O corpo inteiro dele ficou tenso como pedra. E então, devagar, ele se ergueu, apoiando as mãos no colchão. Seus olhos me encararam de cima — e neles não havia mais aquele vazio nebuloso do sonambulismo. Havia clareza. Havia consciência.
Ele… estava acordado?
— Eu não faria isso com você — disse, com a voz rouca, quase um sussurro, carregada de algo que me gelou por dentro. — Só queria saber… até onde eu iria quando estou sonâmbulo. Até onde você estava aceitando isso?

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