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Aliança Provisória - Casei com um Homem apaixonado por Outra romance Capítulo 168

Alice

Cheguei em casa com o coração ainda acelerado e o gosto daquele beijo teimando em não ir embora. A noite estava fresca, o portão rangeu como sempre quando empurrei e a luz da varanda tremeu, meio que querendo apagar de vez. Típico.

A casa estava em silêncio. Só o som do ventilador do quarto de Júlio girando como uma hélice velha.

Larguei a bolsa no sofá, tirei os tênis e fui direto até o quarto dele.

A porta estava semiaberta e, claro, lá estava o meu melhor amigo... esparramado na cama como um gato preguiçoso babando no travesseiro.

— Júlio...

Nada.

— Júlioooo...

Ele resmungou alguma coisa e aproximei, me jogando ao lado dele na cama e indo até o ouvido dele.

— Adivinha quem eu beijei hoje à noite?

Ele abriu um olho, grogue.

— O padeiro?

Revirei os olhos, rindo.

— Não, seu lerdo. Um certo bilionário.

Ele piscou.

— Hã?

A ficha caiu e ele se sentou como um zumbi acordando no susto.

— QUÊ? O Montenegro? O gostoso? Aquele homem que parece ter saído de um comercial de perfume caro?

Eu ri, me jogando de costas e encarando o teto.

— Esse mesmo.

— AI MEU DEUS. — Ele me puxou pelo braço, me fazendo sentar. — COMO? ONDE? QUANDO? POR QUÊ? ELE TAVA SÓBRIO?

— Ai, Júlio... você é uma desgraça. — Falei rindo.

— Conta. Tudo. Agora.

— Meu celular como sempre descarregou e eu não consegui chamar um Uber, ele apareceu, ofereceu uma carona e quando chegamos aqui em frente... rolou. Foi meio inesperado e quente. E antes que você pergunte, não, não trouxe ele pra cá.

— Mas por quê, mulher? Se fosse eu, já tava com o homem na minha cama de joelhos agradecendo ao universo!

Suspirei e deitei de novo, dessa vez no colo dele. A sua mão foi direto pro meu cabelo, como sempre fazia quando a gente conversava assim.

— Porque... eu comecei a sentir os sintomas. A glicemia estava caindo e precisei tomar a insulina.

— Putz... — Ele murmurou, preocupado.

— E pra ser bem sincera, Júlio, eu também não quero me aproximar demais, sabe?

— Hum... medo?

— Não sei se é bem medo. — Fiquei em silêncio por um segundo. — É mais... receio. Nós somos de mundos diferentes. Eu sou essa aqui, ó... calça jeans rasgada, turnos em cafeteria, vivendo com a glicose desequilibrada e contando moedas. Ele é aquele cara, de terno caro e sorriso que desmonta. A gente não combina.

Júlio acariciou meu cabelo e depois falou, com a voz mais doce do mundo.

— Você está tentando se proteger, eu entendo. Mas às vezes... as coisas mais improváveis é que são as mais bonitas.

— Ai, poético você, hein? — Brinquei, tentando disfarçar a pontada no peito.

Ele sorriu.

— E tem mais uma coisinha…

— Cláudio?

Assenti com a cabeça.

— Eu sei que ele era um idiota e que isso já passou, mas sei lá... não quero ninguém agora. Se for para ter algo, que seja só casual, sem sentimentos ou planos para o futuro, entende?

— Entendo, sim. E você tá certa em pensar no que é melhor pra você.

— Só não queria que isso... mexesse comigo. — Murmurei.

— Mas mexeu. Eu vi pela sua cara.

Revirei os olhos e me afundei mais no colo dele.

— Cala a boca, Júlio.

Ele riu e me deu um beijinho na minha testa.

— Cala a boca você. Eu só quero que seja feliz, com ou sem bilionário gostoso.

— Te amo, sabia?

— Eu sou incrível, sei disso.

Fechei os olhos e fiquei ali, ouvindo a respiração dele e sentindo a minha estabilizar. Uma parte de mim queria esquecer aquele beijo e a outra, já estava desejando o próximo.

***

28-08 - Domingo

Acordei sentindo os primeiros raios de sol tocarem meu rosto e virei para o outro lado da cama, resmungando por ter esquecido de fechar as janelas ontem.

Decido levantar e pegar o celular, vendo que ainda não são nem sete horas. Ótimo... em pleno domingo, acordei antes das sete. Suspiro e resolvo sair logo da cama.

Depois de fazer minha higiene matinal, vou até a cozinha. A casa ainda está em completo silêncio, já que Julio sempre dorme mais do que eu. Preparo um café, coloco um pão na sanduicheira com queijo e presunto e abro a porta do quintal, ouvindo os passarinhos felizes com o amanhecer e com o café da manhã deles, que, no caso, são as minhas goiabas.

Volto para pegar meu sanduíche e me sento na cadeira, encarando o vazio, até que a minha mente maldosa me lembra da data de hoje e o sabor do sanduíche mudar.

Pego o celular e confirmo: é isso mesmo... 28 de agosto. Aniversário da minha mãe.

Fechei os olhos, deixando algumas lágrimas escaparem.

— Eu vou cuidar, Julio. Eu juro que vou.

Ele ainda estava nervoso e com razão. Mas me ajudou a levantar com todo o cuidado do mundo, segurando minha cintura como se eu fosse de vidro rachado.

— Devagar... aí... vamos pro quarto. — murmurou, me guiando com calma.

Sentei na cama, exausta, sentindo o corpo ainda tentando se reorganizar depois da crise. Ele me olhou com os olhos apertados de preocupação e deu um beijo leve na minha testa.

— Agora deita. Eu termino a faxina

— Julio...

— Sem discussão, Alice. Deita agora.

Bufei. Até tentei brigar, mas ele estava sério demais. Me joguei na cama como uma adolescente contrariada e ele saiu do quarto bufando, provavelmente já pegando o pano de chão como se fosse uma espada de guerra.

Fiquei ali em silêncio, olhando o teto por alguns segundos... até o aperto voltar. Não o físico, o outro, financeiro e sufoco.

Me levantei devagar, caminhei até minha bolsa e comecei a vasculhar as coisas pegando o estojo dos remédios e abrindo.

Merda.

As insulinas estavam no fim e os comprimidos também.

Fechei os olhos com força e respirei fundo.

Como eu ia comprar mais agora?

Julio não podia saber. Nem pensar. Ele tinha comprado aquele equipamento caríssimo pro estúdio dele e ainda tava pagando. Além disso, estava ajudando a irmã que tinha passado pra estudar em Londres. Era um baita orgulho pra ele, mas também uma despesa absurda. Eu não podia sobrecarregá-lo.

Isso era minha responsabilidade, sempre foi.

Quem sabe eu devesse conversar com o Senhor Barbosa. Ver se conseguia umas horas a mais, um turno extra, qualquer coisa.

Antes, eu ia tentar no posto de saúde. Vai que... sei lá, os remédios tinham chegado. Era pedir um milagre, mas eu já me contentava com metade de um.

Suspirei e me joguei de novo na cama, afundando a cara no travesseiro.

E como se o mundo decidisse me afundar mais um pouco, as palavras da minha família ecoaram como navalhas na minha mente:

"Você é um fardo!"

"Você só faz a gente gastar e no fim pode acabar morrendo a qualquer momento!"

"Você não presta, é doente, e ainda quer ter uma vida normal?"

Apertei os olhos com força. Quantas vezes eu já tinha me convencido de que não acreditava mais naquelas palavras?

Quantas vezes eu já tinha prometido que não deixaria aquilo me afetar? Mas, de tempos em tempos, elas voltavam.

Pisquei várias vezes, afastando as lágrimas antes que escorressem. Não, eu não ia chorar por eles.

Eu ia cuidar de mim e dar um jeito. Mesmo sozinha e quebrada.

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