Alice
Saí do restaurante às dezoito em ponto, como de costume. Às vezes mudavam minha escala no meio da semana, mas hoje tudo tranquilo. Ao menos do lado de fora, porque por dentro, minha cabeça era um tambor de escola de samba.
Sentei no banco da parada de ônibus com a sensação de que carregava uma mochila invisível cheia de contas, preocupações e um boleto emocional chamado “família”. O ônibus chegou, me joguei nele e tentei não pensar demais. Coisa que, pra mim, era o equivalente a tentar não respirar.
Cheguei em casa às sete e quinze. Entrei descalçando o tênis já na porta, como quem queria se livrar do dia inteiro. Fui direto pro banho, e ali, debaixo da água quente, senti um breve alívio. Quase parecia que a vida era normal por alguns minutos.
Depois vesti meu baby doll de algodão com bolinhas que parecia mais velho que eu e fui pra cozinha, preparar algo rápido. Macarrão com carne moída, a salvação dos dias longos e dos estômagos vazios.
Me sentei à mesa e comecei a comer. A comida estava até boa, na medida do possível, já que eu não era muito boa em cozinhar. Mas aí, do nada, ele veio na minha cabeça. O beijo no beco, a sensação de que eu tinha feito uma loucura deliciosa.
Soltei o garfo e peguei o celular com certa pressa, sentindo aquela ansiedade boba crescendo dentro de mim, como se meu corpo já esperasse ver algo dele.
Esperava encontrar uma mensagem perguntando onde a gente se encontraria ou ele dizendo que não parou de pensar em mim durante o dia todo. Mas, para meu desgosto, não havia nada ali.
A tela me encarava em silêncio, e eu suspirei, mordendo o lábio. Ele não ligou nem mandou mensagem. Será que eu imaginei coisa demais?
Talvez ele não tenha sentido o mesmo e tenha sido só um momento impulsivo, e pronto. Eu mesma disse aquilo, que seria só uma vez. Talvez ele só acreditou.
Antes que a tristeza me engolisse, ouvi o barulho familiar do portão se abrindo, a moto entrando e, logo depois, o rangido do portão se fechando. Era Júlio chegando.
Demorou menos de um minuto pra ele entrar pela porta com a energia teatral de sempre, tirando o capacete e fazendo drama.
— Tô morto, Alice. Morto. Se a polícia bater aqui, já sabe: foi a vida que me matou — falou, jogando a mochila no sofá como se fosse um cadáver.
— Fiz macarrão com carne. — respondi, quase como quem oferece abrigo a um náufrago.
— Ai, meu Jesus amado, eu te amo.
Ele foi lavar as mãos e sentou-se comigo, ainda descabelado e com cheiro de rua.
— Preciso te contar uma coisa — falei, já meio rindo.
— Lá vem.
— Lembra do Diogo?
— Claro que sim. O que tem ele, vocês transaram de novo?
— Não… bem, ele foi lá no restaurante hoje no horário do almoço.
— Sério, e aí?
— Calma, calma. Eu saí do restaurante, esperei ele sair também… e o puxei pro beco do lado.
— Você... fez o quê?
— Beijei ele. — falei, como se dissesse “comprei pão”. — Foi um beijo... nossa. Aqueles de tirar o chão, mas aí você chegou buzinando na moto e eu precisei sair correndo. Dei meu número pra ele, disse pra me ligar... mas ele não ligou e nem mandou mensagem.
Julio nem comia mais, apenas me encarava como se eu tivesse acabado de dizer que roubei um banco.
— Alice... — ele piscou, confuso — você realmente puxou aquele homem-maravilha pro beco e tascou um beijo nele assim… na cara dura?
Comecei a rir e assenti.
— Ué, estava com vontade e ele parecia também.
— Eu tô em choque. — ele apoiou o garfo na borda do prato e apontou pra mim. — Você é oficialmente minha heroína. Mas... você tem certeza que ele entendeu que era pra entrar em contato?
— Acho que sim. Ou talvez ele só achou que era aquilo mesmo e pronto. A gente viveu o momento e agora… já era.
Julio inclinou a cabeça, ainda processando, e disse:
— Se ele não aparecer, Alice... eu caso com você. Mas antes disso, quero a localização desse beco. Preciso fazer uma sessão de fotos nesse lugar abençoado.
Caí na risada outra vez, jogando um guardanapo nele.
— Aliás — Julio disse, limpando a boca com um guardanapo improvisado (uma folha de papel toalha, no caso) — Lembra que te falei que tinha um ensaio em uma empresa hoje?
— Aham — respondi meio distraída, enxaguando o prato e colocando na pia.
— E adivinha quem estava lá?
— Quem?— Perguntei ainda distraída.
Depois que Julio foi para o quarto dele, alegando estar “exausto como um trabalhador honesto que carrega o peso da beleza nas costas”, fui até a área de serviço desligar a luz e trancar o portão.
A noite estava abafada e o ar parado, quente, com aquele cheiro de asfalto e jasmim do quintal da vizinha misturado. Fiquei uns segundos parada ali, olhando pro céu escuro, tentando encontrar alguma estrela entre as nuvens.
Respirei fundo e voltei para dentro. Peguei meu celular, como quem não quer nada, mas o nada era tudo: nenhuma mensagem nova, nenhuma notificação. Diogo não tinha mandado nada.
Deitei na cama, mexendo distraidamente no lençol e me virei para o lado, olhando pro teto.
“Ele podia mandar alguma coisa…” pensei. Mas ao mesmo tempo… será que eu não fui clara demais naquela noite? Será que ele acreditou mesmo que foi só aquilo ou não quer mais repetir? Será que ele não gostou tanto como eu?
Suspirei.
Eu não queria nada sério. Deus me livre. A última vez que tentei algo sério acabei sozinha, grávida e expulsa de casa. Depois perdi o bebê… e a mim mesma por um tempo. E quando tentei novamente, levei um belo par de chifres, fui roubada e deixada com uma dívida enorme e ainda fiquei sem meu gato.
Não. Compromisso não estava nos meus planos.
Mas também… custava ter uns momentos bons? Rir, conversar com alguém que visse além do meu cansaço? Que me fizesse esquecer, nem que fosse por um fim de tarde, as parcelas atrasadas, a insulina acabando, o silêncio dos meus pais?
Fechei os olhos, tentando me imaginar com Diogo outra vez.
As mãos dele, firmes. A forma como me olhava, como se… não sei… me visse mesmo.
Sorri de leve, envergonhada só de pensar.
Se ele me procurar… pensei, esticando o braço para abrir a gaveta da cômoda.
Puxei uma camisola nova de alcinha, leve, transparente, que eu tinha comprado há tempos mas nunca ousado. Era meio ousada demais pra dormir sozinha, mas... vai que.
Tirei o baby doll velho e vesti a camisola, só pra testar. Me olhei no espelho sentindo a pele marcada pelo dia, a olheira cansada, mas… ainda havia algo ali. Um certo fogo e desejo de viver, mesmo que fosse só por umas horas entre os braços de alguém.
Toquei os lábios com os dedos, lembrando do beijo no beco. Do calor. Do jeito que ele me apertou, como se me quisesse ali e agora, sem promessas. Só vontade.
Talvez eu esteja carente ou ele realmente tenha mexido comigo.
Deitei na cama com a camisola nova, passei um hidratante no corpo e prendi o cabelo num coque frouxo.
Mesmo sem mensagem, mesmo sem notícia, meu coração acelerava como se ele pudesse aparecer a qualquer momento.

Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Aliança Provisória - Casei com um Homem apaixonado por Outra
Tá cada dia pior, os capítulos estão faltando e alguns estão se repetindo....
Gente que absurdo, faltando vários capítulos agora é 319.ainda querem que a gente pague por isso?...
Cadê o capítulo 309?...
Alguém sabe do cap 207?...
Capítulo 293 e de mais tá bloqueado parcialmente sendo que já está entre os gratuitos...
Capítulo 293 tá bloqueado sendo que já está entre os gratuitos...
Quantos capítulos são?...
Não consigo parar de ler é surpreendente, estou virando a noite lendo. É tão gostoso ler durante a madrugada no silêncio enquanto todos dormem. Diego e Alice são perfeitos juntos, assim como Alessandro e Larissa...
Maravilhoso,sem palavras recomendo vale muito apena ler👏🏼👏🏼...
Quem tem a história Completa do Diogo?...